ARTIGOS & ENTREVISTAS

Revista eletrônica Esporte & Terapia:

Wagner Büll Sensei – 6º Dan – Aikikai Shihan.

Esporte & Terapia: Professor, qual seria a tradução mais apropriada da palavra AIKIDO?

Sensei Wagner Büll: AIKIDO é um Caminho de Harmonia com as energias do Universo.

E&T: Como descobriu a paixão por AIKIDO? Teve influências de alguma pessoa?

Sensei: Eu praticava na época boxe e Karatê quando eu cursava engenharia civil no Paraná. Um amigo meu que também fazia Karatê, me indicou que havia aparecido em Curitiba uma arte marcial muito bonita e que o professor podia controlar facilmente o atacante com técnicas bem precisas. Eu fui visitar o Dojo e me matriculei no mesmo dia.

E&T: Qual a idade mais apropriada para uma pessoa começar a praticar o AIKIDO?

Sensei: Depende do professor que tiver. A rigor, creio que entre os 6 e os 80 anos  seria uma faixa razoável.

E&T: Notamos que o grupo dos praticantes de AIKIDO é muito unido, mesmo fora do Dojo. Isto é um dos princípios básicos do AIKIDO?

Sensei: O AIKIDO, que tem como meta o Takemussu Aiki, ensina que devemos procurar nos unir até com os que nos criam problemas, pois se usarmos as técnicas adequadas, ambos podem se beneficiar e somar forças. Isto é o que dá a aparência de grande união para o público. No entanto, as pessoas são diferentes e nem todos pensam da mesma forma, inclusive até quanto à própria forma de ensinar e divulgar o AIKIDO.

E&T: No mundo atual, onde a competição faz parte do nosso dia-a-dia, como o AIKIDO, uma arte marcial não competitiva é cada vez mais valorizada?

Sensei: As pessoas estão percebendo que a competição, embora leve à conquista pela vitória imposta pela força, acaba permitindo uma vitória apenas relativa e, assim, não duradoura. A idéia do AIKIDO é vencer junto, de forma harmônica, política, onde todas as partes acabam se beneficiando. Assim ela é duradoura e traz a paz. O mundo anseia por paz e esta é exatamente a proposta do AIKIDO. Portanto, a cada dia fica a arte mais valorizada.

E&T: Sensei está sempre organizando seminários internacionais. Poderia relatar algumas experiências no exterior? E com a família Ueshiba?

Sensei: Realmente fizemos muitos seminários com grandes mestres. No começo é difícil, mas depois a gente fica conhecido como pessoa séria, acaba ganhando reputação e confiabilidade como organizador e aí fica fácil convidar qualquer pessoa. Outra coisa muito importante é que nossa organização, o BRAZIL AIKIKAI (Confederação Brasileira de AIKIDO) é reconhecida oficialmente pelo Hombu Dojo, a Central Mundial do AIKIDO, no Japão. Assim temos total credibilidade na comunidade aikidoística mundial e, portanto, trânsito livre entre todos os mestres internacionais que respeitam o Aikikai e a família Ueshiba para convidá-los.

Quanto ao líder atual da família Ueshiba, o Doshu Moriteru, ele ficou muito feliz com o seminário que organizamos com ele no Brasil. Pois conseguimos fazer, em conjunto com a Fepai, o segundo maior Seminário de AIKIDO até hoje realizado no mundo, comprovando que somos potência mundial no AIKIDO e que somos confiáveis em todos os sentidos. As portas agora estão abertas.

E&T: Quais os idiomas em que o Sensei têm fluência? Poderia fazer algum comentário em Nihongô?

Sensei: Eu tenho fluência em inglês, leio e me comunico em francês, espanhol e conheço um pouco de alemão. Quanto ao japonês, sei o suficiente para o entendimento dos termos técnicos do AIKIDO e comunicação bem básica. Gosto muito da expressão: “Kannagara Tamachii Haemasse”, que significa: seguindo as leis do Universo a cada dia seremos mais e mais felizes. Repetimos em todos os inícios e términos de aulas no Instituto Takemussu onde ensino.

E&T: Qual o Shihan que mais influenciou a sua formação técnica? A base do AIKIDO que o Sensei pratica hoje?

Sensei: Foram vários, mas eu teria que citar pelo menos: Massanao Ueno, Gozo Shioda, Koichi Tohei, Doshu Kisshomaru, Seigo Yamaguchi, Morihiro Saito e mais recentemente Hiroshi Kato.

E&T: Poderia fazer um pequeno resumo dos 40 anos de vivência no AIKIDO (quando e onde iniciou, datas importantes, quantos Dojos são filiados, quais os estados de abrangência, etc)? Já atingiu os objetivos? Pensa em passar o bastão para os filhos?

Sensei: É impossível fazer um balanço a respeito. Creio que quem tiver interesse, o ideal é ler o terceiro volume de meu livro: “AIKIDO o Caminho da Sabedoria – DOBUM“, onde fiz um relato completo de toda a minha senda e do AIKIDO brasileiro em mais de 100 páginas. Creio que já atingi meus objetivos organizacionais, pois eu queria que no Brasil se praticasse um AIKIDO de nível internacional, dentro das propostas autênticas do Fundador do AIKIDO. Isto hoje existe no Brasil para quem procurar no lugar certo. Quanto a passar o bastão para meus filhos, isto acontecerá naturalmente, pois além de meus filhos naturais praticarem AIKIDO, tenho muitos filhos do AIKIDO e existe muita gente competente para continuar o trabalho que iniciei. Certamente haverá bons líderes e bons técnicos no futuro. No entanto, em termos de desenvolvimento individual do AIKIDO, eu ainda estou engatinhando. Agora que compreendo melhor a arte. Vejo como há níveis bem altos para se atingir e pretendo continuar aprendendo até quando a saúde me permitir e, se puder, passar os conhecimentos para quem está comigo na obra.

E&T: Como está hoje o Instituto após obter o reconhecimento internacional pelo Hombu Dojo? Mudou algo? Se mudou, foi tecnicamente ou filosoficamente?

Sensei: Nada mudou sob o ponto de vista técnico ou filosófico. A única coisa é que passamos a ter maior responsabilidade. Pois de certa forma representamos a família Ueshiba no Brasil, junto com outros mestres.

E&T: O que é o Instituto Takemussu? Qual a mensagem para dar aos jovens iniciantes e praticantes do AIKIDO?

Sensei: O Instituto Takemussu é uma organização que visa ensinar o AIKIDO da forma tradicional, objetivando o Takemussu Aiki, que é a arte marcial praticada de forma que leve o praticante à iluminação espiritual. Creio que a mensagem que poderíamos dar aos iniciantes, é que é necessário se trabalhar bastante por longo tempo com disciplina para se compreender o AIKIDO e as leis do Universo. O prêmio é grande, pois nos traz Sabedoria e com esta uma possibilidade muito maior de sermos realmente felizes. Agradeço a oportunidade da entrevista.

Fonte: Web Site Esporte & Terapia

NOTA: O Shihan Wagner Büll foi a primeira pessoa pessoa nascida na América Latina a ter reconhecimento como “Shihan” (mestre modelo) de AIKIDO pela Central Mundial do Japão. Até o momento é o único e é o professor do instrutor do DAISHIZEN DOJO.

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Artigo – O Significado de Misogi por Hiroshi Ikeda Sensei.

Hoje eu e minha esposa saímos cedo do trabalho e fomos para a escola de nosso filho antes do final da aula. Era nossa semana de fazer a limpeza da sala de aula da 4ª e 5ª série. Nesta escola, cada família participa pelo menos uma vez no ano da limpeza da sala de aula de seus filhos, fazendo a limpeza (o que é muito encorajado), ou pagando $40 para que a escola contrate alguém para fazer isso (o único zelador da escola). A maioria das famílias escolhe ir fazer a limpeza.

Nós temos feito isso desde o jardim de infância e se tornou um ritual do qual gostamos muito. Acho que estar no meio da ação nos faz sentir que fazemos parte da escola, isso nos dá um sentimento de conexão com o lugar em que nosso filho passa várias horas de seu dia. Nós fazemos isso por ele, pelo professor, por seus colegas, fazendo uma pequena contribuição para manter o mundo deles limpo, em ordem e agradável. De uma maneira simbólica, estamos recompensando seu professor, a quem ele adora (e nós também) por ter uma influência tão positiva em sua vida.

Então dizemos “olá” para os outros pais e vamos ao armário do zelador, pegamos um aspirador de pó e uns sacos de limpeza e vamos para a saula de aula de Jill. É claro que nosso filho preferiria passar o tempo no laboratório de computação enquanto nós limpamos as mesas e tiramos manchas dos teclados, mas ele se junta a nós por tempo suficiente para limpar o quadro negro e guardar o aspirador de pó. Além disso, ele nos lembra que “faz seu trabalho” todos os dias. Isto é, as tarefas que as crianças fazem em turnos antes de ir para casa. Pequenas coisas como alimentar o porquinho da índia, limpar embaixo das mesas, guardar as cadeiras e suprimentos.

Eu descobri que esta escola é uma exceção neste caso. Isto me surpreendeu, porque em todas as escolas que frequentei no Japão, as crianças não limpavam apenas suas salas de aula, mas também os corredores e áreas comunitárias. Nós limpávamos e lavávamos as janelas. Isso não era uma punição, de forma alguma; era o que tínhamos que fazer e tínhamos orgulho de trabalharmos juntos para cuidar de nosso espaço. Acho que não pensávamos nisso, mas estávamos aprendendo sobre responsabilidade, respeito, realizações e cooperação.

Como a saula de aula, o Dojo é um lugar importante – muitos diriam que talvez seja ainda mais importante que uma sala de aula, porque no Dojo nosso trabalho é refinar habilidades que podem nos colocar no limite entre a vida e a morte. Acredito que muitas pessoas hoje em dia confundem o Dojo com algum tipo de centro de recreação. Mas diferentemente de um centro esportivo para levantamento de peso ou um ginásio para a prática de esportes, um Dojo de artes marciais abriga o Kami (Deus) do BUDO. Isso quer dizer que em um Dojo, o Espírito do BUSHIDO, ou uma lei de conduta, permeia o treinamento. Quando um Dojo perde isso, sofre as consequências. Acredito que isso é o Espírito do BUDO – este refinado sentimento de respeito – o que distingue um Dojo e é o que levamos em nós para nosso comportamento perante a sociedade.

O próprio ato de cuidar do Dojo nos permite manifestar fisicamente o processo de purificação de nossos espíritos. Da mesma forma, as pessoas entram no Dojo e deixam suas preocupações lá fora. O próprio Dojo deve refletir a postura mental pura de seus ocupantes, para que os alunos possam se mover com segurança e liberdade no futuro pelo Caminho do BUDO.

Infelizmente, às vezes vejo que alguns alunos consideram que o treinamento não têm nada a ver com este simples ato de cuidado. O Espírito do Dojo reflete a forma com que cada indivíduo encara o seu treinamento e isto inclui a forma como ele ou ela trata o próprio Dojo. Acredito que uma pessoa que treina em um Dojo deveria considerar que este espaço é, de alguma maneira, uma manifestação deles próprios e deveriam encarar sua purificação da mesma forma que fariam a purificação e a renovação de seus próprios espíritos.

Através da história e das culturas, o ato de limpeza e purificação têm sido um gesto tanto prático, quanto simbólico de grande significado. No Japão, este tipo de purificação ritual ou “misogi” é uma parte integral e muito importante da vida diária. Por exemplo, no final de dezembro, quase todas as pessoas em toda a nação cooperam dentro de suas famílias , escolas, companhias e Dojos para limpar os lugares em que se reúnem. Ao fazerem isso, são capazes de receber o novo ano com seus ambientes purificados, bem como com suas almas purificadas. Outros rituais de misogi podem incluir a purificação do local da construção de um edifício antes que a obra comece. Antes de cada luta de Sumô, o esporte nacional japonês, os lutadores purificam o ringue aonde irã competir jogando sal sobre ele.

Parece um paradoxo que atos simples e mundanos possam ter o poder de transformar, mas este fato têm ressurgido repetidamente através dos tempos. Se polirmos o espírito, talvez um dia o espelho esteja imaculado e então veremos nosso verdadeiro reflexo.

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Artigo – AIKIDO é um BUDO, Caminho Marcial por Wagner Büll Shihan.

Nos 37 anos que praticamos AIKIDO, tivemos a oportunidade de conhecer muitos professores, “estilos”, filosofias e métodos de ensino da Arte. Dentre todos esses conceitos, existe um que absolutamente não podemos aceitar, ou seja, aquele que conclama que o AIKIDO deve ser praticado sem marcialidade.

Esses “professores” e “praticantes” acham que o AIKIDO por significar AI (amor), KI (energia), DO (caminho) deve ser praticado sem golpes fortes e os “ataques” devem ser bem suaves para não provocar a discórdia, nem preocupação de defesa sob ameaça de dano físico.

Ao se entrar numa dessas academias têm-se a impressão de que nos encontramos em uma reunião de amigos apenas para se praticar técnicas de relaxamento e sensibilização. Os movimentos são sempre feitos com lentidão e com muito cuidado para que o companheiro não se sinta nem um pouco ameaçado. As torções são sempre praticadas sem energia para que o companheiro não sinta dor. Tudo muito bem combinado. O atacante nunca resiste e o defensor, ao aplicar uma técnica lenta, vê seu agressor projetar-se metros à frente voluntariamente, simplesmente para não “estragar” a técnica que o praticante aplicou. A prática lembra uma dança lenta, suave, cheia de amor afetivo, compreensão e boa vontade. Isto tudo é ótimo e deve existir em um Dojo de AIKIDO tradicional, mas a necessidade do praticante aprender a lidar com a violência e pará-la, o Bu onde é preciso desenvolver a habilidade do corpo, dos reflexos, isto não se consegue sem ataques sérios durante parte da prática.

Se o objetivo fosse somente desenvolver relações sociais amistosas, seria melhor convidar os praticantes para um festinha, três vezes por semana, onde fossem ministradas palestras sobre atitudes de não reagir contra a injustiça e a violência. Esse “professores” do “AIKIDO suave” criticam os aikidoístas tradicionais, que treinam marcialmente, considerando cada ataque como uma situação de “vida ou morte”, por praticarem com força e velocidade. Acham que a prática firme, com energia, com realismo é pancadaria e isto iria contra o espírito do AIKIDO, pois no AIKIDO se diz que deve haver essencialmente aiki, ou seja, um tipo de Amor! Mas eles se esquecem de que o Fundador disse que o Amor do AIKIDO não era o sentimental, fraco, mas aquele que une todos os seres formando a harmonia do Universo, pois no mundo existe violência e é preciso transformá-la em algo construtivo e bom.

Uma coisa é treinar firme, com toda a energia, o que é correto; outra coisa é treinar com violência, com sentimentos agressivos. Isto sim é ruim e deve ser evitado, é preciso não confundir as coisas. Infelizmente algumas pessoas não entendem isto, deturpam o AIKIDO tradicional e transforma esta prática, que é uma das artes marciais mais completas em termos de defesa pessoal já desenvolvidas, em um sistema ineficaz, iludindo o praticante, alegando que esteja praticando uma arte marcial. AIKIDO é Shugyo (treinamento austero), onde o corpo deve se esforçar em cada técnica ao máximo. O atacante deve forçar ao limite o defensor para provocar o seu desenvolvimento e livrá-lo da estagnação e lentidão comodista em que vive a população sedentária moderna. As quedas devem ser enérgicas, as mais duras possíveis. O defensor deve se habituar a jamais deixar falhas em sua guarda e suas técnicas quando aplicadas devem ser sempre as mais eficientes possíveis. AIKIDO é uma arte marcial, um BUDO. Se não houver violência, se não houver ataques sérios e fortes, não pode existir treinamento de aiki autêntico.

É muito importante se buscar os limites individuais para que o praticante possa se melhorar e crescer, adaptando-se às suas condições de idade e saúde. O objetivo do AIKIDO é buscar a harmonia e a paz, onde há violência e guerra, e não aprender apenas a manter a paz onde ela já existe. Esta é a filosofia do Instituto Takemussu. Não haveria necessidade de se treinar AIKIDO se todos fossem pacifistas e bonzinhos. Precisamos treinar AIKIDO justamente porque o mundo tem seus aspectos agressivos, violentos, um tentando “comer” o outro. O treinamento do AIKIDO deve nos ensinar a conviver com esses sentimentos de ações destrutivas e fazer com que se desenvolvam sentimentos de fraternidade e tolerância, com atitudes construtivas que criem harmonia.

Um mundo sem concorrentes, sem competição é um mundo acabado. Nós precisamos da oposição para que possamos evoluir. Isto faz parte do plano divino para que ocorra uma seleção natural e os melhores sobrevivam, purificando o Universo. Se os fracos e comodistas tiverem o mesmo lugar dos fortes e dos trabalhadores, o progresso cessará! É por isso que o comunismo não funciona na prática. As pessoas são diferentes. Devem ocupar diferentes posições na sociedade e receber diferentes atribuições e benefícios, e tudo deve funcionar em harmonia.

O objetivo final do AIKIDO é fazer o praticante entender esta realidade e aprender a viver sempre em harmonia, mesmo se estiver dentro de um ambiente que lhe seja hostil. É claro que não se pode treinar um kata de forma harmônica, se ambos os praticantes, o que ataca e o que defende, não o quiserem. É importante que o espírito de ataque real exista. Ao qual o defensor responderá com a técnica amorosa do AIKIDO, fazendo aiki. Também é evidente que uma pessoa mais velha, uma mulher ou uma criança devem treinar mais lentamente e suavemente que um jovem vigoroso, mas isso não significa tirar o lado marcial, o Bu, da prática e sim simplesmente adaptar o treino às condições individuais de cada um para que posse treinar sem violentar seu corpo e o do parceiro, trazendo a ambos saúde e progresso físico e não contusões.

A prática deve ser marcial, mas jamais deverá provocar danos físicos aos praticantes. Machucar-se no AIKIDO é uma vergonha para quem aplica e para quem recebe a técnica. É preciso não confundir a palavra AI (amor) do AIKIDO com amor sentimental. O amor do AIKIDO verdadeiro significa unir, criando harmonia. Não é necessário ser simpático ou afetivo com o parceiro; é importante e fundamental criar harmonia. Se seu vizinho gosta ou não de você, isto não cabe a você julgá-lo. Esta é uma questão a ser respondida pelo Criador, que fez você diferente do seu vizinho. Mas é seu dever como aikidoísta fazer com que você e seu vizinho trabalhem juntos em harmonia para realizarem na Terra os propósitos da criação.

O homem e a mulher são dois exemplos clássicos, pois são tão diferentes em do outro, mas encontram uma forma de se unirem e criarem um novo ser que é a máxima realização do ser humano nesta Terra. Se alguém for diferente de você e se você não tiver afinidade com ele, descubra uma forma de trabalhar em conjunto produzindo algo útil, mesmo ele sendo seu concorrente, seu rival, seu inimigo. Este é o grande ensinamento do AIKIDO tradicional, o Takemussu Aiki. Assim, o ladrão que tenta roubar sua casa é tão útil a você como o guarda que cuida e preserva sua casa. Sem o ladrão, sua casa ficaria indefesa e você se tornaria um fraco. Por estas razões é fundamental que no Dojo exista um ambiente similar à vida, com contradições e agressões, mas claro que com o espírito de treinamento para fortalecimento do espírito. Somente assim, o aikidoísta aprende a criar harmonia fazendo aiki! Esta é a proposta do Takemussu Aiki ensinado no Instituto Takemussu. Fazer do mundo uma grande família. Para quem quiser treinar este espírito, fica aqui o convite para se associar conosco nessa tarefa, procurando um de nossos centros de treinamento.

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ARTIGO – Origem do DAITORYU AIKIJUJUTSU – a fonte do AIKIDO (comentários por Wagner Büll Shihan)

Takeda Sokaku

Depois de pesquisar muito sobre AIKIDO, por volta de 10 anos atrás, percebi claramente que estudar apenas técnicas como fazem alguns praticantes de AIKIDO é inútil. Se o praticante não aprender a desenvolver o “aiki”, que é algo independente de técnicas, que o Kaiso Morihei Ueshiba chamou de Takemussu Aiki, incorporando conceitos místicos e portanto mais elevados, as técnicas não vão funcionar na prática. É preciso focar no desenvolvimento do Kokyu Ryoku (que contém o aiki), para que o AIKIDO seja realmente eficiente. As técnicas na verdade são apenas “exercícios” para se desenvolver o aiki. Muitas pessoas praticam durante dezenas de anos e acabam percebendo que não conseguem usar seu treinamento em uma luta real, em termos de defesa pessoal. Isto se deve ao fato de não terem desenvolvido o domínio do aiki, que no AIKIDO se chama de Kokyu Ryoku.

É preciso lembrar que a grandeza de O-Sensei, o Fundador do AIKIDO, foi que ele conseguiu transcender ao aiki criando o Takemussu Aiki, ou seja, a capacidade de dominar o aiki no plano físico seria usada como iluminação espiritual, devido a clareza mental e percepção extraordinária que o AIKIDO praticado corretamente acaba por desenvolver nos adeptos. Neste sentido, a arte do AIKIDO, se torna um DO, um Caminho…algo bem perto de uma “religião”.

O texto abaixo escrito por um buscador dedicado, contém exatamente o que até hoje eu estudei sobre o AIKIDO e suas origens. A única novidade é a teoria de que o Daito Ryu realmente tivesse sido criado por Takeda Sokaku. Não posso concordar com isto. A arte é muito complexa para ter sido criada por uma só pessoa. Na minha opinião (e isto é uma suposição), o aiki surgiu nas escolas de esgrima como um método de anular a espada do agressor e assim possibilitar um ataque em suas aberturas na guarda, fruto desta imobilização. Da espada para o Tai Jutsu, foi algo bem natural, bastou substituir o katana (espada) pelo tegatana (região que vai do cotovelo à extremidade do dedo mínimo).

Wagner Büll Shihan – 6º dan de AIKIDO e fundador da Escola Instituto Takemussu e presidente da Confederação Brasileira de AIKIDO – BRAZIL AIKIKAI.

DAITORYU AIKIJUJUTSU

As técnicas são muito diferentes das outras artes marciais. Ao praticar, nos concentramos em desenvolver um tipo especial de força interior (aiki) que pode ser aplicada em situações reais. Como o Daitoryu têm diversas ramificações, a forma de treinamento também difere de acordo com as preferências do professor, do Dojo, da organização. Assim, em alguns Dojos, os alunos fazem ukemi (quedas) com a técnica que o outro faz para completar esta técnica, ou melhor, a sua forma. Mas em outros Dojos, ukemi só é feito quando a técnica é aplicada de forma eficiente. Ainda assim há outro ponto de vista (em apenas uma das linhas) em que os alunos resistem às quedas, e , para ser eficiente , o outro tem que ter um alto nível de habilidade.

Em minha opinião, não importa qual seja a técnica. Um verdadeiro treinamento deve ser concentrado na pesquisa de como se aplicar qualquer técnica de forma eficiente. Como o objetivo da prática do Daitoryu é atingir o aiki (tipo especial de força interior), esta arte marcial exige completa dedicação. O Daitoryu ensina defesa sem armar (Taijutsu), contra atacante armado ou desarmado, bem como o uso de armas (Bukijutsu), como espada, bastão, faca, lança, etc. O número de técnica é de mais de 2000, todas em diversos grupos e variações. Costumava ser praticado em seminários no tempo de Takeda Sokaku Sensei. Desde que haja 2 pessoas, elas podem praticar Daitoryu. É claro que eles precisarão ter contato com o professor para aumentar seus conhecimentos. O Daitoryu não é uma arte simples. Ela exige perseverança, lealdade, estudos e…muito suor. Nada pode ser obtido facilmente.

O nome: DAITORYU AIKIJUJUTSU

A escola também é conhecida pelos nomes: Daitoryu Jujutsu, Daitoryu Aikibujutsu, Daitoryu Aikigoshinjujutsu, Daitoryu Aikibudo, Daitoryu Goshinjutsu, Daitoryu Aikinojutsu, Daitoryu Aikijutsu, e mesmo Daitoryu AIKIDO.

As variações do nome desta arte se devem ao fato de que muita organizações, grupos, subgrupos, ou ramos do Daitoryu, se desenvolveram por diversos mestres. Alguns deles eram alunos diretos de Takeda Sokaku Sensei, outros eram discípulos de 2ª e 3ª geração. A separação começou logo depois da morte de Takeda Sokaku Sensei.

A princípio parece que havia uma intenção de se unificar o Daitoryu sob um único mestre: Sagawa Yukiyoshi Sensei. O sr. Takeda Tokimune (o filho de Takeda Sokaku Sensei) pediu a Sagawa Sensei para assumir a liderança desta arte, pois Sagawa Sensei tinha o nível mais alto de habilidade. Entretanto, parece que poucos anos depois, Sagawa Sensei se recusou a manter o papel de Soke. Parece ter havido um acordo, o que permitiu a cada discípulo de Takeda Sokaku Sensei que seguisse seu próprio caminho. Assim, Sagawa Yukiyoshi Sensei assumiu o posto de Sohan e usou o nome de Seiden Daitoryu Aikibujutsu para seu Dojo (mais conhecido como Sagawa Dojo). Takeda Tokimune Sensei assumiu o posto de Soke, formando sua própria arte: Daitoryu Aikibudo (reformulanfo as técnicas e o currículo, seu grupo foi conhecido como Daitokan Dojo). Outros usaram vários nomes: Daitoryu AIKIDO/Kansai AIKIDO (por Hisa Takuma Shihan, depois seu grupo mudou o nome para Daitoryu Aikijujutsu Takumakai), Daitoryu Aikijujutsu Kodokai (de Horikawa Kodo Shihan), Daitoryu AIKIDO Renshinkan (de Maeda Shihan), Daitoryu Aikijudo (de Yamamoto Shihan, depois o grupo ficou conhecido como Yamamoto-den Daitoryu Aikijujutsu), AIKIDO (de Ueshiba Shihan), etc. Atualmente, o nome mais comum é o Daitoryu Aikijujutsu. Daitoryu é traduzido como a “Grande Escola do Oriente”.

Técnicas básicas

As técnicas mais importantes são as técnicas feitas de joelhos. Elas ajudam a desenvolver o equilíbrio ideal, os movimentos de mãos e nos ensinam o uso correto da força. Depois o aluno deveria aprender as técnicas feitas de pé. Todas são baseadas em chaves de juntas. O ataque às juntas é um método muito eficiente de combate, mesmo não aparentando ser. Mas, para ser eficiente, as técnicas precisam ter aiki: uma habilidade desenvolvida e guardada por Takeda Sokaku Sensei. Infelizmente, apenas Sagawa Sensei foi capaz de adquirir aiki, pois Takeda Sensei não tinha a intenção de ensinar aiki a ninguém.

A história do DAITORYU

Existem várias teorias sobre as origens do Daitoryu. A mais comum diz que de acordo com a tradição oral, Daitoryu foi fundado no século XI por Shinra Saburo Yoshimoto no Yoshimitsu. Ele descobriu as técnicas secretas de como travar pelo reverso as juntas ao analisar corpos de soldados que morreram em batalhas. Yoshimitsu também observou uma aranha tecendo sua teia e descobriu que o que é menor e aparentemente mais fraco, pode facilmente dominar um oponente mais forte e maior. Após estudar esse princípio, por muitos anos, ele encontrou o princípio central que permite que todas as técnicas funcionem contra um oponente mais forte, maior e resistente. Ele chamou isso de aiki. Mais tarde , Daitoryu foi passado adiante através das gerações da família Takeda e foi misturado às artes marciais do clã Aizu. Daitoryu era uma arte secreta, conhecida como Goshikinai/Oshikiuchi, praticada apenas por membros de alta patente dos Aizu. Ele era completamente desconhecido do público em geral até o século XIX. Durante o período Meiji (1868-1912) Takeda Sokaku (o sucessor de 35ª geração do Daitoryu) abriu o Daitoryu para o público em geral, mas apenas pessoas de alta classe social podiam estudar com ele.

Entretanto não há provas de que qualquer arte marcial como o Daitoryu tenha existido antes de Takeda Sensei. É provável que, para dar aulas, Takeda Sensei teve que fazer com que as pessoas acreditassem que o Daitoryu não era invenção dele (o que é comum na cultura japonesa: diversos Fundadores de várias artes marciais atribuíam a origem de suas criações a fontes divinas, monges ancestrais, antigas tradições familiares, etc.). Uma opinião sugere que o Daitoryu Aikijujutsu foi criado unicamente por Takeda Sokaku Sensei, seja o nome da arte, as técnicas, a aproximação tática, ou, por fim, o aiki. Uma única dúvida permanece: como Takeda Sensei descobriu tantas técnicas tão sofisticadas e, mais importante, como ele criou/descobriu o aiki? Mas acredito que estas questões nunca serão respondidas.

Sobre o Buyokan

O Buyokan Dojo é um grupo que pesquisa o Daitoryu Aikijujutsu japonês. Eu tenho estudado artes marciais japonesas (Daitoryu, AIKIDO, Kyokushin Karate) desde 1981. Então, em 1997 eu parei de praticar Karate e comecei a fazer experiências com artes marciais chinesas. Da minha maneira, treinei com alguns professores de Daitoryu e depois me tornei um “discípulo interno” com a permissão de aprender a Escola da Graça Branca – Feeding Crane Boxing (Shihequan) com o mestre Liu, Chin-Long Shifu em Liujia, Taiwan. Também estudei bastante Chen, Pan-Ling Baguazhang e Xingyiquan, com Chen, Yun-Chi Shifu. Eu tive várias idéias e teorias até 2001, quando encontrei Kimura Tatsuo Shihan de Sagawa-ha Daitoryu Aikibujutsu. Desde então eu parei de ensinar Daitoryu e outras artes marciais e passei a em concentrar unicamente na pesquisa do aiki do Daitoryu. Eu me tornei um principiante novamente e, dessa vez, estava muito feliz com isso. Eu não tenho nenhuma graduação no Sagawa-ha Daitoryu Aikibujutsu, assim não posso, nem quero ensinar nada agora. Estou conduzindo minhas pesquisas em Dojos muito pequenos e particulares. Assim eu tenho este Dojo para fazer pesquisas e experiências e não para ensinar.

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ARTIGO – Treino Viril e o AIKIJUJUTSU por Ted Howell Sensei (comentários por Wagner Büll Shihan).

Vou compartilhar alguns pensamentos com vocês. Aqueles dentre vocês que tiveram a sorte de assistir ao Aiki Expo em Las Vegas, realizado em maio passado (graças ao esforço de Stanley Pranin, um trabalho bem feito!) e viram as aulas de Sensei Katsuyuki Kondo, da principal linha de Daito-ryu Aikijujutsu, já sabem o quanto essa arte é incrível e dinâmica.

Esta foi uma oportunidade de treinar diretamente com o único detentor vivo do Menkyo Kaiden, diretamente outorgado por Tokimune Takeda (o Soke anterior de Daito-ryu Aikijujutsu).

Eu, continuamente, sou surpreendido pelo conhecimento e sinceridade de Sensei Kondo. Ele é ao mesmo tempo severo e compassivo e represente o que cada americado sonha em encontrar num mestre. Fortemente aconselho a qualquer estudante sério de artes marciais japonesas a observar como um representante direto de Daito-ryu Aikijujutsu incorpora a essência do clássico e verdadeiro BUDO japonês.

Acredito que para, verdadeiramente, estudar AIKIDO como uma arte é importante pesquisar os aspectos histórico e técnico de seus ensinos. Compreendo que O-Sensei criou seu próprio BUDO. Mas a pergunta é: a partir de quê?

Não é mais um mistério que os aspectos técnicos do AIKIDO de O-Sensei foram inegavelmente o resultado de seu relacionamento e longa aprendizagem sob um dos mestres de artes marciais bem proeminentes de seu tempo, Sokaku Takeda. Compreendo ser difícil de imaginar O-Sensei, o fundados do AIKIDO, como um estudante. Mas como todos grande mestres marciais, ele criou o AIKIDO da própria visão do que lhe fora previamente ensinado.

Morihei Ueshiba era um artista marcial severo. Seu relacionamento e aprendizagem com Sokaku Takeda foi de cerca de vinte anos, estando bem documentado. Qualquer de vocês que assistiu ao Aiki Expo deve ter visto as fotografias fornecidas por Sensei Kondo que claramente mostram um certificado de Daito-ryu Kyoju Dairi (permissão para ensinar) pendurado na parede do Kobukan, Dojo do Fundador. Sabe-se, também, que um número de estudantes de O-Sensei antes da II Guerra Mundial, receberam graduações em Daito-ryu e não em AIKIDO como o conhecemos hoje. Em sua juventude, Morihei Ueshiba foi considerado um professor severo, assim como era Takeda. Só pela vida inteira de treinamento diligente e severo, pode a arte hoje conhecida como AIKIDO evoluir.

O Daito-ryu não é um “estilo duro” de AIKIDO. Ele é a antiga tradição secular que deu à luz ao AIKIDO e a numerosas outras artes.

Já ouvi shihans de AIKIDO dizerem que estudar Daito-ryu Aikijujutsu é uma regressão! Ouso divergir e intrepidamente declaro que experimentei de primeira mão a surpreendente  abordagem do aiki encontrada no Daito-ryu que poucos aikidocas têm demonstrado possuir.

Deve ser observado que O-Sensei simplificou muito dos modos antigos devido ao tempo que era necessário para dominá-los. Mas sinto que algo foi perdido e acredito que essa simplificação excessiva criou seus próprios demônios. Acredito que é uma tentativa verdadeiramente vergonhosa de muitos aikidocas pensarem que podem desenvolver um nível de proficiência em AIKIDO que o Fundador só atingiu depois de uma vida inteira de treinamento contínuo.

O modo pelo qual o AIKIDO moderno é apresentado ao mundo é algo decepcionante.

Em maio deste ano, eu assisti ao Aiki Expo em Las Vegas e assisti demonstrações realizadas pelos maiores aikidokas do mundo. A natureza destas demonstrações variou das mais suaves às extremamente poderosas. E embora impressionante, a maioria do que observei envolvia uma falta de atitude marcial real. Os princípios básicos do AIKIDO (tais como movimento, timing e kokyu) estavam lá, mas sinto que em algum lugar do Caminho a natureza marcial do AIKIDO havia sido perdida.

Passei vinte anos treinando em artes marciais japonesas, chinesas e filipinas. Como um agente da polícia e instrutor de táticas defensivas, tive a oportunidade de experimentar muitos contatos físicos diretamente no dia a dia policial.

E sinto que muitos aikidokas enganam a si mesmos ao achar que um agressor descuidadamente atacará e se permitirá ser manipulado como uma boneca de trapo.

O AIKIDO foi fundado nos conceitos que promovem compaixão, paz, amor e harmonia.

Mas escutem cuidadosamente às palavras de Sensei Mitsugi Saotome: “Quando os fortes falam de paz as pessoas escutam, mas quando os fracos falam de paz, ninguém dá ouvidos” (livro AIKIDO e a Harmonia da Natureza). Esta declaração, acredito, diz tudo.

Como podemos, como aikidocas, promover o AIKIDO como uma arte de paz e harmonia se ele é praticado de modo a apenas nos proporcionar um sentimento falso de segurança?

Durante anos, ouvi outros artistas marciais criticarem o AIKIDO por sua falta de severidade e natureza prática. Novamente, argumentarei que a arte não é a culpada, mas a forma branda em que normalmente é praticada e ensinada trouxe tais críticas. Compreendo que as pessoas treinem AIKIDO por uma miríade de razões particulares. Mas por favor, não diga que você treina uma arte marcial a menos que a treine como tal. A arte foi projetada pelo Fundador na tradição do guerreiro japonês e qualquer abordagem que lhe exclua a natureza marcial não é AIKIDO. Isto não significa que um aikidoka deve vestir uma armadura antes do treinamento, mas digo que a mente, corpo e espírito são forjados por desafio e treinamento numa mentalidade marcial.

Em BUDO, as palavras de Morihei Ueshiba estão cheias de imagens do guerreiro japonês e da cultura de guerreiro. O Fundador escreveu: “Perceba que sua mente e corpo devem ser ocupados com a alme de um guerreiro, com uma sabedoria iluminada e uma cultura profunda”.

O Fundador escreveu: “O surgimento de um ‘inimigo’ deve ser pensado como uma oportunidade para testar seu treinamento físico e mental e ver se seu corpo realmente responde de acordo com os própositos divinos”. Mais do que isso, o pensamento do Fundador é extremamente claro quando afirma: “Sempre se imagine no campo de batalha sob o ataque feroz; nunca se esqueça deste elemento crucial de treinamento”.

Penso que o Fundador estava certo de que teve uma visão de paz. Mas esta visão veio da mente de um guerreiro. Um guerreiro que claramente indicou que a iluminação e o forjar do espírito são resultado direto de treinamento severo e diligente.

Retirar a natureza marcial do treinamento também retira a agudeza requerida para forjar a espada do espírito! Tenho treinado Daito-ryu Aikijujutsu desde 1997 e recentemente fui solicitado (ou melhor comunicado) por Katsuyuki Kondo a prestas exame para shodan em outubro deste ano.

Para mim, passar ou não, é secundário ao encarar os desafios que esta prova trará. Como um estudante sério de AIKIDO (atingi o posto de yondan da Aikikai, em maio deste ano), eu sinceramente acredito que meu estudo em Daito-ryu foi inestimável a meu entendimento de aiki.

Acredito que Daito-ryu e AIKIDO são duas partes feitas do mesmo tecido e que um complementa o outro. Se vocês pensam que o AIKIDO e Daito-ryu são mundo à parte, peço que reavaliem suas posições.

Finalizo com alguma palavras do antigo Soke de Daito-ryu Aikijujutsu, Sensei Tokimune Takeda, quando indagado sobre a diferença entre Aikijujutsu e AIKIDO. Ele declarou, “…tenho acompanhado técnicas de AIKIDO no Budokan do Japão mas vejo apenas demonstrações de técnicas macias. Elas não funcionam numa situação de luta real. Os ukes auxiliam se jogando e fazendo lindas quedas.É como se praticassem apenas técnicas para se jogarem. Se seu uke cai numa queda linda, isso faz sua técnica parecer boa. Em nossa prática, nós não precisamos que nossos ukes auxiliem executando lindas quedas. Nós treinamos a projeção dos ukes. Se projetados adequadamente, eles não precisam ajudar na queda. Eles simplesmente caem.” (Conversas com mestres de Daito-ryu).

Espero que essas considerações provoquem alguma reflexão. Se algum dentre vocês está interessado em recuperar a natureza marcial do treinamento, por favor venho ao seminário e experimente de primeira mão o que estou tão desesperadamente tentando explicar.

Para qualquer esclarecimento adicional, por favor não hesite em contatar o Instituto Aiki de Artes Marciais, que oferece instrução em AIKIDO, korindo, Hanbojutsu e Daito-ryu Aikijujutsu. Lembre-se de que nossos esforços não podem continuar sem o apoio forte desses sérios estudos de artes marciais japonesas tradicionais. Para aqueles dentre  vocês que amam as tradições japonesas, mas não podem participar, a colaboração sob a forma de doações é sempre bem vinda. O Instituto Aiki de Artes Marciais é uma organização sem fins lucrativos que conta com estas doações.

Sempre de vocês, no BUDO.

Ted Howell – Dojo Cho, Pinelands AIKIDO, New Jersey.

 

COMENTÁRIO:

Este artigo escrito por Ted Howell acima, representa a experiência de quem têm visitado Dojos de AIKIDO onde a parte marcial é deixada de lado. Isto é um grande erro. AIKIDO é um BUDO e se não funciona como defesa pessoal, algo está equivocado. Eis porque no Instituto Takemussu sempre procuramos estudar esta arte, como um Caminho de Iluminação Espiritual sim, mas que usa uma arte marcial eficiente de defesa pessoal como ferramenta. É imperativo que o praticante consiga fazer a técnica marcialmente e efetiva como defesa pessoal.

O AIKIDO quando é praticado corretamente como fazia o Fundador, usa os princípios de Aikijujutsu e realmente sem estes princípios as técnicas não funcionam. Mas não é verdade que para se aprender AIKIDO é necessário treinar Aikijujutsu, ao contrário. Em primeiro lugar basta o interessado procurar um Dojo tradicional, reconhecido.  Em segundo lugar existem muitos Dojos de Aikijujutsu que também não estão utilizando as técnicas de aiki e a arte está distorcida. Não se trata de se treinar Aikijujutsu, ou AIKIDO, ou qualquer outra arte marcial. Todas são boas para o corpo e para a mente, quando praticadas corretamente e orientadas por uma escola ou professor experiente. Muito mais importante do que a arte marcial é o professor de arte marcial que escolhemos.

Wagner Büll Shihan – 6º dan de AIKIDO e fundador da Escola Instituto Takemussu e presidente da Confederação Brasileira de AIKIDO – BRAZIL AIKIKAI.

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Entrevista – Hiroshi Isoyama Shihan – AIKIDO JOURNAL.

(Tradução: Willian Soares – Nippon Kan Brasil).

Hiroshi Isoyama Sensei – 8° Dan – Aikikai Shihan

Hiroshi Isoyama começou a treinar do Dojo de Iwama com o Fundador do AIKIDO Morihei Ueshiba ainda menino, com 12 anos de idade. Ele é um dos raros indivíduos – outro é Morihiro Saito – a ter sido exposto ao Fundador durante o período de maturação do AIKIDO moderno. Isoyama é apaixonado pelo seu estudo do AIKIDO e o seu dinamismo se reflete em sua técnica explosiva. Agora aposentado, depois de uma longa carreira na Força de Auto-Defesa Aérea, Isoyama devota tempo integral em sua busca, treinamento e ensino. Ele têm se tornado imensamente conhecido internacionalmente devido as viagens para o exterior que tem realizado nos anos recentes.

AIKIDO JOURNAL: Por favor, nos diga como o senhor começou no AIKIDO?

ISOYAMA SENSEI: Foi em 1949, que, como você sabe foi uma época muito difícil para o Japão. Minha família dirigia uma estalagem. Vários tipos de pessoa a frequentavam, incluindo membros da Yakuza, e dado esse fato, eu pensei que seria burrice não aprender algum tipo de arte marcial. Aconteceu que o Dojo local de aiki (ainda não se chamava “AIKIDO”, e o Dojo se tornaria conhecido como “Aiki Shuren Dojo“) havia acabado de iniciar classes para crianças, então eu e outras crianças do bairro nos inscrevemos. Eu tinha doze anos na época.

A.J.: O-Sensei ainda estava morando em Iwama nessa época?

Sensei: Sim, apenas depois de 1955 que ele, gradualmente, começou a fazer viagens para fora de Iwama. O-Sensei ensinava na classe de crianças da noite.

A.J.: A instrução era a mesma do Hombu Dojo em Tóquio?

Sensei: Eu não sei como eram as aulas em Tóquio naquele tempo, mas ele costumava circular pelo Dojo e segurar o pulso de cada estudante individualmente e os ensinava daquela maneira. Ele mesmo não fazia ukemi, mas ele fazia qualquer que fosse a técnica – shomenuchi ikkyo, por exemplo – para cada pessoa no tatame individualmente enquanto todos olhavam. Ele nunca dava nenhum tipo detalhado de explicação.

Não havia tatame no Dojo, então o treino poderia ser bastante doloroso. Essa era uma das razões pelas quais era difícil fazer com que as pessoas treinassem ali. Depois de alguns anos eles, finalmente, colocaram tatame no Dojo, mas nós havíamos treinado no chão por tanto tempo que, no início, tivemos dificuldade em nos ajustar. Se acontecesse de você bater a cabeça no chão, fazia um grande barulho, mas a dor nunca parecia penetrar em toda a sua cabeça. Depois que colocamos o tatame, no entanto, a dor atingia você bem no centro. Naturalmente, a maneira que realizávamos o ukemi mudou quando fomos do chão de madeira para os tatames.

A.J.: Além de Saito Sensei, quem já estava naquela época?

Sensei: Havia pessoas como o falecido Takeo Murata, Sakae Shimada (atual representante da Federação da Prefeitura de Ibaraki) e Sachio Yamane. Em todo caso, como eu disse antes, não havia muitas pessoas treinando naquele tempo. Também, Kunio Oyama, que mais tarde se tornou estudante e profissional de wrestler Rikidozan e pessoas que estavam lá como uchideshi.

A.J.: Eu sei que o senhor acabou se juntando às Forças de Auto-Defesa Japonesa.

Sensei: Sim, eu me alistei nas Forças de Auto-Defesa e fui enviado à Chitose em 1958.

A.J.: O senhor fundou um clube de AIKIDO lá em Chitose?

Sensei: Sim. No início meus únicos estudantes eram membros da polícia militar americana, mas, por fim, eu fui solicitado pelo comandante da guarnição para ensinar os membros das Forças de Auto-Defesa Japonesas também. Eu aprendi inglês lá também, devido a necessidade.

A.J.: Durante a sua recente visita em Los Angeles o senhor ensinou em inglês?

Sensei: Sim, totalmente em inglês! Que outra língua?! (risos)

A.J.:Uma vez que muitos de seus estudantes entre os membros da polícia militar americana deveriam ser fisicamente maiores que o senhor, o senhor teve que improvisar novas maneiras de fazer suas técnicas funcionarem com eles?

Sensei: Eu certamente tive. Praticar com pessoas como aquelas é totalmente diferente do que trabalhar com pessoas menores que você. Fazer mesmo alguma coisa como ikkyo contra um oponente muito maior é muito difícil, especialmente em termos do modo que você deve entrar e do “timing” que você têm que utilizar. Treinar com pessoas como aquelas foi uma grande experiência da qual eu aprendi muito.

Minhas técnicas de kataguruma e gansekiotoshi, por exemplo, começaram quando eu comecei a ensinar koshinague. Quando eu tentava realizar o koshinague em alguns daqueles homens altos eles podiam simplesmente pisar em cima de mim; não importasse o quanto eu tentasse a técnica, eu não conseguia arremessá-los porque a diferença de altura significava que eu não conseguiria encaixar os meus quadris em uma boa posição em frente aos quadris deles. Então eu tive a idéia de tentar colocá-los atravessados em meu ombro ao invés de atravessados nos meus quadris, e foi como eu comecei a utilizar essas técnicas. Eu não estava tentando ser bruto ou espalhafatoso, eu estava apenas tentando fazer com que a técnica funcionasse. A necessidade é a mãe da invenção!

Lá em Chitose havia muitos lutadores de wrestler e de box e outros que igualmente vinham caçoar do trabalho que estávamos realizando. Devido ao alistamento do período de guerra, havia todo tipo de pessoa dentre os militares americanos. Normalmente durante a prática de AIKIDO você entra e aplica a técnica enquanto o oponente está se movendo com o seu ataque, mas quando eu fazia isto muitos deles reclamavam que ainda não estavam prontos; eles queriam que eu deixasse que eles me segurassem bem ou me estrangulassem e, então, vissem se eu ainda era capaz de realizar as minhas técnicas. Normalmente em minha prática o oponente ataca de frente e se move ao redor do nague, então o uke não têm chance de aplicar o seu ataque de forma completa. Mas isso não os convencia e eles queriam, primeiro me agarrar firmemente e depois me desafiar a tentar sair.

A.J.: Em outras palavras, o senhor teve que atuar sob as circunstâncias mais difíceis.

Sensei: Havia um camarada, lutador de wrestler que havia ficado em sexto lugar nas Olimpíadas de Helsinki, que rolou no chão e me agarrou por trás de modo que eu não podia utilizar minhas mãos e pés, e, daquela posição me desafiou a tentar me mover. A única parte de meu corpo que ainda estava livre era a cabeça, então eu bati com a minha cabeça para trás em seu rosto e bati na cartilagem de seu nariz com a minha cabeça. Isto é proibido no wrestling, obviamente, mas essas regras não se aplicam no BUDO. Enquanto eu atingia o seu rosto eu soltei um kiai (grito) e utilizei a abertura momentânea para me livrar. Eu lhe disse então: “Isto é BUDO“! E ele se convenceu. Esse tipo de coisa acontecia quase que diariamente.

A.J.: Alguma vez o senhor falou com seus estudantes americanos a respeito do Fundador, Morihei Ueshiba?

Sensei: Sim, eu cheguei mesmo a levar alguns dele à Iwama para encontrá-lo. Eles não acreditaram quando me viram ser jogado para todos os lados do tatame por O-Sensei. Eles disseram: “Como pode alguém como você, que pode nos jogar a todos facilmente, ser jogado por aquele homem velho?!” Eu repliquei: “Isso é o que eu gostaria de saber” (risos). Eu expliquei que AIKIDO não tinha nada a ver com a idade da pessoa. Eles me perguntaram se poderiam tentar agarrar o O-Sensei eles mesmos, e um dos mais entusiasmados tentou e foi derrubado e aprisionado no mesmo instante em que tentou. Eles não entendiam como eles haviam sido controlados daquela forma; eles apenas sabiam que haviam sido controlados.

Na última vez que estive nos Estados Unidos eu encontrei um daqueles ex-militares que haviam sido meus estudantes. Eu não o via por quarenta anos. Depois de ter conseguido o seu shodan ele retornou para os Estados Unidos, se graduou  por uma universidade em Boston e, depois, serviu como oficial no Vietnam. Depois ele entrou para o FBI onde, por muitos anos, esteve envolvido no ensino de técnicas de aprisionamento, ou o que nós poderíamos chamar de “taihojutsu” em japonês. Ele utilizou a internet para me ajudar a encontrar alguns daqueles que haviam sido meus estudantes naqueles tempos. É maravilhoso a forma que o AIKIDO constrói relações como aquelas. Mesmo se você as perde por um tempo, sempre há um caminho através da qual elas retornam para você novamente.

A.J. : BUDO como uma tendência do AIKIDO. Como você diria que a sua ênfase na importância do BUDO no AIKIDO se desenvolveu?

Sensei: Uma vez que eu esteja na posição de ensinar AIKIDO, eu sinto que eu tenho que me manter orientando em uma direção consistente. Pessoas praticam AIKIDO por uma variedade de razões – para se manter em forma ou para manter a saúde, entre outras coisas – , mas é claramente o BUDO que é o fio condutor por trás do AIKIDO. Não há problema com pessoas que praticam AIKIDO simplesmente para se manter a forma, mas eu acho que elas também devem cultivar o tipo de vigilância que nos leva constantemente a evitar mostrar aberturas a potenciais oponentes. Isto é um aspecto importante do BUDO, e eu acho que negligenciar isso ou permitir que se torne uma parte menor de nosso treino resultará em uma divergência do real espírito do AIKIDO.

O pensamento do Fundador mudou no decorrer dos anos entre o tempo que ele começou a ensinar AIKIDO e no final de sua vida, então naturalmente os tipos de movimento que ele utilizava também mudou. Houve poucas pessoas que tiveram contato direto com ele durante a passagem de várias décadas, então de diversas maneiras, é como a velha estória dos três homens cegos tocando diferente partes de um elefante e dando diferentes descrições de como um elefante é. Nesse sentido, eu me pergunto se existe alguém que compreenda a grandiosidade de O-Sensei de forma completa.

Algumas pessoas estavam em contato com O-Sensei quando ele estava disseminando AIKIDO puramente como BUDO; outros apenas começaram a aprender com ele depois que o seu pensamento se desenvolveu de forma a enfatizar o AIKIDO como “o Caminho da Harmonia”; ainda há outras pessoas que estudaram com ele, mais tarde, em diferentes períodos de sua vida. Todos terão diferentes pontos de vista e interpretações, e eu não acho que seja possível se dizer que qualquer um desses pontos de vista seja melhor do que o outro.

Eu também acho que há diferenças dependendo da idade do estudante. Pessoas mais jovens naturalmente procuraram um tipo mais forte de AIKIDO, enquanto pessoas que eram mais velhas podem ter mergulhado em aspectos tais como a harmonia e o espírito, e então isso foi o que cada um absorveu do O-Sensei. Aspectos como esse mostram como é difícil se falar no AIKIDO em termos claros e precisos.

Como você sabe, O-Sensei nunca escreveu muito a respeito de AIKIDO em livros, embora algumas técnicas tenham sido registradas no [livro] BUDO. Algumas vezes eu me pergunto porque ele não escreveu mais a respeito do AIKIDO, mas, por outro lado, eu acho que posso entender. Seu pensamento se desenvolveu gradualmente, e ele deve ter pensado que qualquer coisa que tenha escrito em sua juventude poderia entrar em contradição com seu pensamento posterior. A mesma verdade se aplica a suas técnicas. Se ele tivesse dito algo definitivo sobre elas em um determinado ponto, ele poderia acabar se contradizendo depois conforme ele evoluísse.

Outra dificuldade é que pessoas diferentes tendem a interpretar as palavras de O-Sensei de modos diferentes, embora ele possa ter dito a mesma coisa para todas elas. As pessoas então terminam por expressar sua própria interpretação como se elas tivessem absorvido tudo o que ele quis dizer, elas acabam provocando pequenas variações e, eventualmente, alguns enganos.

Quando O-Sensei ensinava ele nunca dava nenhum tipo particular de explicação. Uma das razões era que muitas pessoas que vinham treinar com ele faziam parte de uma certa camada alta da sociedade; por exemplo, oficiais militares, políticos, praticantes de alto nível de outras artes marciais, pessoas do setor financeiro, chefes de empreendimentos privados, e outras pessoas bem estabelecidas e respeitadas em seus campos de atuação. Dar muito detalhe para pessoas como essas, por exemplo, ensiná-las coisas como: ” Este é o modo adequado de se fazer uma inclinação [saudação]” entre outras coisas poderia ser considerado desconcertantemente ofensivo.

Durante a prática O-Sensei geralmente falava em linguagem honorífica com indivíduos da alta camada social bem como com seus estudantes regulares. Eu me sentia muito tocado por aquela atitude e pela forma com a qual ele interagia com as pessoas.

A.J.: Um exemplo pode ser o debate a respeito do atemi, que raramente é aplicado como parte das técnicas de AIKIDO. Quais são os seus pensamentos a respeito do uso do atemi, a partis de uma perspectiva combativa?

Sensei: Realizar um atemi por realizar um atemi resulta em nada mais do que uma forma vazia. Não existe razão de se usar atemi a não ser que o seu golpe seja do tipo que tenha um efeito real. Um atemi não tem, necessariamente, que ser um sopro mortal, mas deve ser capaz de provocar uma certa porção de dano real. E mais, se você quer pensar seriamente a respeito de atemi, você também tem que pensar a respeito de chutes.

Karate, por exemplo, possui excelentes técnicas de socos e chutes. Eu devo dizer que a maioria dos movimentos de Karate é predominantemente retos, enquanto que o AIKIDO tende a enfatizar os movimentos esféricos. Ambos possuem pontos fortes e aberturas e eu não acredito que você possa dizer incondicionalmente que um seja melhor do que o outro. Em todo caso, se você vai utilizar socos e chutes como atemi no AIKIDO, você tem que pensar constantemente a respeito de como incorporá-los de forma a adaptá-los ao “timing” e levar em conta outras características do movimento do AIKIDO.

A.J.: A controvérsia das armas. O uso de armas no AIKIDO é outro assunto que possui um número de diferentes pontos de vista. O senhor acredita que as armas possuam um papel no treino de AIKIDO?

Sensei: Eu definitivamente acredito que elas possuam. Técnicas como tachidori (técnicas de desarme de espadas) e jodori (tecnicas de desarme de bastão) são incluídas nos exames de nível de dan, e pessoas que só estiveram treinando técnicas à mãos livres não serão capazes de executá-las, não é mesmo?

E mais, se você não tem um bom domínio de técnicas de armas, não há como você ser capaz de responder adequadamente quando o seu oponente tem uma arma. Você acha que você vai ter algum sucesso se um conhecedor de Kendo desafiar você a tentar o tachidori do AIKIDO contra a sua espada? Ou se um praticante do Muso-Ryu Jo der a você uma chance de tirar o seu Jo, você seria capaz de fazer isso facilmente? Eu duvido.

Eu acredito que técnicas de armas são extremamente importantes, mas eu também acho perigoso treiná-las de forma superficial; se você vai treinar técnicas de armas, então as pratique de forma apropriada e profunda. Esta é uma razão pela qual eu acredito que existe muita necessidade de se estudar práticas como o tachidori e jodori em muitas variações. Tantodori (técnicas de desarmamento de facas), também, é uma coisa que eu pratiquei contra uma lâmina real, mas apenas algumas variações. Tudo o que você precisa é de uma ou duas técnicas, e se você realmente as dominar, então eu acho que você está bem equipado para se defender contra tais coisas. Obviamente, toda vez que armas estão envolvidas sempre haverá um elemento de perigo.

Uma vez que nós não podemos praticar com lâminas de verdade no Dojo, nós utilizamos espadas de madeira (bokuto), mas se você quer tornar o seu treino tão efetivo quanto possível é essencial que você pense no bokuto como uma lâmina de verdade, não apenas um pedaço de madeira. Isso inclui realizar seus ataques de modo rápido e decisivo e cheio de intenção. Você não será capaz de cultivar o grau apropriado de seriedade se você está cortando de forma que o único próposito seja realizar um ukemi. É uma boa idéia ter esse tipo de coisa no fundo de sua mente quando você estiver treinando com armas.

Geralmente é dito que não há competições no AIKIDO. Eu penso que há diferentes dimensões de significado para isso, mas O-Sensei uma vez disse: “Vitória e derrota são meramente relativos, de forma que o AIKIDO não busca a força relativa, mas a força absoluta. Portanto o AIKIDO é o treino diário para se ‘vencer antes de lutar’.”

A.J.: Como o senhor acha que era a visão do Fundador sobre as técnicas de armas? Por exemplo, de acordo com Morihiro Saito Sensei, o Fundador treinava muito com armas e, consequentemente o AIKIDO de Saito Sensei contém muitas técnicas de armas. Por outro lado, outros apontam que o Fundador não ensinava armas no Hombu Dojo, e, de fato, se zangava quando as pessoas treinavam armas lá.

Sensei: Eu acho que é provavelmente verdade que O-Sensei não ensinasse técnicas de armas no Hombu Dojo. Isso talvez se desse porque ele não tinha muito tempo para treinar lá. Quando ele estava de volta à Iwama ele tinha bastante tempo para esse tipo de coisa, e aqueles dentre nós que estávamos lá aprendíamos armas como a Ken [espada] e o Jo. Então o que Saito Sensei diz é correto, e também está certo o comentário de que O-Sensei se zangava se as pessoas praticassem armas no Hombu Dojo. De fato, eu mesmo vi o O-Sensei zangado, embora fosse porque as pessoas estivessem fazendo técnicas de espada em duplas (kumitachi) embora elas ainda não fossem capazes de realizar os movimentos solo (suburi) muito bem. Eu acredito que o O-Sensei considerava que se seus estudantes fossem estudar espada eles tinham que fazer isso de modo apropriado e ele se zangava se visse que seus alunos estavam apenas balançando suas espadas como se tivessem em alguma encenação de um drama samurai.

Uma vez, para uma demonstração com Saito Sensei – eu acho que quando eu era sandan – eu pergunteu ao O-Sensei se eu poderia utilizar uma lâmina de verdade em nossa apresentação de tantodori, mas ele rejeitou a idéia. Eu acho que ele tinha um entendimento mais claro de minhas reais habilidades do que eu tinha na época e sabia que isso não seria uma boa idéia. Pouco tempo depois eu utilizei uma lâmina de verdade em uma demonstração na qual o O-Sensei não pôde estar presente e, claro, eu me acidentei. Eu me senti tão estúpido, e foi necessário que eu me ferisse para descobrir porque ele tinha negado o meu pedido na primeira vez.

A.J.: Há pessoas que praticam outras artes marciais junto com seu AIKIDO, por exemplo misturando o AIKIDO com Iaido ou Karate. Alguns estudam Karate para descobrir maneiras de lidar com socos e chutes, enquanto outros estudam Kendo para aprender mais sobre o modo de cortar e atacar.

Sensei: Eu acho que é bom fazer esse tipo de coisa até um certo ponto, mas eu também acho que se você leva isso muito além, colocando isso à frente de seu treino, é provável que você transforme o seu AIKIDO em mera luta. No final corre-se o risco de se assumir uma atitude de desafio a outras formas de BUDO pensando em como fazer melhor do que elas ou como vencê-las.

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ARTIGO – Steven Seagal, o fim do mito.

(por Art Marciaux Traditionnels d’Asie)

A revista Art Marciaux Traditionnels d’Asie, francesa, publicou uma reportagem sobre o seminário que Steven Seagal fez em Paris neste ano de 1999. Nela fica claro a decepção dos aikidoístas franceses com esta pessoa, que se divulgou bastante o AIKIDO no mundo todo com seus filmes, por outro lado, o fez de uma maneira diversa daquela pregada pelo Fundador da arte, como um Caminho de paz e não de violência. Parece que Steven Seagal se distancia cada vez mais da arte do AIKIDO, chegando mesmo a abraçar uma seita budista e atualmente ter inclusive um novo mestre, chamado Norbu Rinpoche (ver foto). Esta mudança de filosofia vai levando cada vez mais este aikidoísta, que o cinema fez famoso, para longe de ser um exemplo a ser seguido. Comentários dos dois principais mestres do AIKIDO franceses na atualidade, Christian Tissier e Gerard Blaize – ambos 7º dan do Aikikai – criticaram severamente o mesmo, chegando a dizer que ele não pode mais ser uma referência para o AIKIDO. Que sirva esta reportagem como um alerta para os aikidoístas brasileiros, para que saibam distinguir realidade da fantasia hollywoodiana que o cinema cria.

Abaixo a carta aberta que André Louka escreve para Seagal, descrevendo a opinião geral dos franceses.

CARTA ABERTA À STEVEN SEAGAL.
Meu caro Steven,
Cyril Dahan, um dos organizadores com Richard Laubly de sua vinda a Paris, me tinha proposto, com sua acordância, uma entrevista contigo. Eu confesso que a idéia de entrevistá-lo e de reencontrar um dos três 7º dan – não japonês – do Aikikai e uma estrela de cinema, me agradava bastante.
Nesta perspectiva, eu tinha reunido todos os elementos que dispunha: artigos de imprensa concernentes a você e seus propósitos, recolhidos por seus alunos para a realização, me parece de um livro. Eis o que pude saber sobre você.
Nada o destinava a se tornar um mestre de Aikido, uma estrela e porfim, um TULKU. Mas os acasos da vida que fazem e desfazem os destinos, lhe mimaram.
Vindo ao mundo em 10 de abril de 1952 no Michigan, venceste a vossa pequena infância em um subúrbio de Detroit, a cidade dos carros. Eu pensei nisso depois, quando vi que uma limousine blindada com motorista lhe esperava permanentemente durante os dias que passaste em Halle Carpentier.
Seu pai, Steven, era professor de matemática em um liceu; enquanto sua mãe, Pat era técnica médica. Era uma família de classe média. Seu pai era rigoroso, mas liberal. Mais tarde tu disseste que tinha sofrido e que cujo sofrimento, custou a afeição por seu pai. Tu sofreste, o que fez Pat o conduzir com suas três irmãs à Igreja.
Tu mudaste para a Califórnia. Aos quinze anos com sua primeira acne, decidiste que era tempo de viver só. E deixaste o teto familiar. Nada de tão extraordinário, pois dezenas de milhares de adolescentes exprimem cada ano sua vontade de independência desta maneira.
O acaso – o primeiro – te faz reencontrar Kyoshi Ishasiki, um professor de Aikido de Conté d’ Orange. Ele o pega sob suas asas e lhe ensina a sua arte e o sentido da vida. Tu és um bom aluno e ele o utiliza como uke para as demonstrações no vilarejo Japonês de Deer Park. Você parecia ter pego gosto pela cultura asiática.
Com dezenove anos, em 1971, partiste ao Japão para confidenciar mais tarde a uma revista americana “Wallpaper” que foi uma espécie de viagem pioneira para se conhecer, para ir em direção a Deus e para estudar com os mestres.
Koichi Tohei, 10º dan que conviveu com o fundador do Aikido, lhe confere o primeiro dan em 1974.
Como você se arrumou para viver, a história não diz.
Um segundo acaso sobrevêm na sua vida, conheceste o rosto de uma jovem japonesa, Miyako Fujitane. Ela é bonita e sobretudo vêm de uma família rica. Seu pai é afortunado e possui em Osaka uns terrenos e um Dojo, construído em 1974, com uma superfície de cem tatamis.
Sobre esses terrenos, cada imóvel valia algumas dezenas de milhões de dólares certamente.
Acontece que o professor do Dojo em destaque, após vossas confidências, estava na cumplicidade com a Yakusa (A máfia japonesa). Nesse interim, Miyako se torna sua esposa e vocês passam a ser  alvo da Yakusa. Pegando sua coragem com as duas mãos, tu foste vê-los para afrontá-los. Sem dúvida impressionado com seu Ki, eles decidiram deixá-lo em paz. Seu tio, cheio de reconhecimento o coloca no lugar daquele professor indelicado. Eis você lá em 1975, ou seja, um ano depois de seu primeiro dan, chefe-instrutor e o único branco a dirigir um dojo em solo japonês: o Tenshin Dojo em Osaka. Tu adotaste até um nome Japonês: Shigemichi – que quer dizer: “ guerrear sobre a estrada da prosperidade” – Take, o nome do seu tio – em sinal de agradecimento, eu suponho.
Você teve duas crianças com Miyako. Kentaro que deve ter vinte e um anos hoje e Ayako, com dezessete anos. Para ti a vida começava sob bons auguros, se não pelo o amontoado de problemas que você teve com os praticantes japoneses.
Você lamentou da hostilidade dos mestres japoneses, que não tiveram nenhuma consideração com você, uma vez que era um gaijin (um estrangeiro). Tu sofreste como admitiste mais tarde: “eles jamais quiseram me levar a sério. Me aceitar como ushi dechi (aluno interno) e pensavam que meu trabalho era não fazer nada à porta de seus Dojos, assim não teriam que me ensinar seja o que fosse.”
Você atribuiu seu ostracismo aos maus exemplos dado pelos americanos e outros estrangeiros que passaram nos Dojos antes de ti.
Com efeito,  eles vêm, dizem efetuar o seu serviço militar e estudam entre seis meses e dois anos. Ao fim de seu tempo, eles conseguem o 1º dan e pensam em ser professores.
Esta é a observação exata. Com efeito, bastante soldados americanos voltaram aos Estados Unidos depois de uma formação incompleta e foram promovidos a mestres. Mas, notamos que eles tiveram menos audácia que você, pois colocaram entre eles e seus mestres, alguns milhares de quilômetros.
Mas você, Steven, não era pouco mais que um simples faixa preta recém graduado, quando começaste a ensinar o Aikido e ainda por cima com o mercado repleto de japoneses. É sabido que os outros professores, seus concorrentes, eram no mínimo cinco vezes mais graduados do que você.
Isto era talvez um erro da juventude, mas a seus olhos era uma provocação. Você teve a sábia idéia de pedir o apoio de Hikitsuche Sensei, 8º Dan e mestre de Gérard Blaize, o mesmo professor de dois organizadores de vossa vinda a França. Ele se lembra bem de você e das dificuldades que você teve, quando teve que se comparar com os especialistas como Kobayashi que ensinava em Osaka.
Eles lhe ajudaram. O doshu, Kisshomaru Ueshiha, veio na inauguração do Tenshin Dojo em 1976 e o distinguiu, conforme Stanley Pranin um 5º ou 6º dan que o colocava em uma posição de instrutor em conformidade com a tradição. Esta foi uma promoção rápida sem merecimento real e o fato é indiscutível, pois se sabe do tempo obrigatório de prática que deve passar entre cada graduação que você pulou. Melhor ainda, eles lhe aconselharam a ensinar além do que você tinha aprendido com eles.
Você teve a sabedoria de seguir o conselho, pois sabia muito bem das dificuldades. Foi assim, que depois de estadia de dez anos, em 1982, você voltou ao seu país.
Você abriu um Dojo em Tao no Novo México, depois em Los Angeles. Por que na cidade de Los Angeles? Porquê neste momento você estava repartindo a sua vida com uma atriz, Kelly Lebrok, que tinha conhecido no Japão. Ela esperava um bebê seu em 1986. Você a desposou em 1987 em Beverly Hills, após ter se divorciado de Miyako, a mãe de seus primeiros filhos. Quanto a Kelly, ela será mãe de Analiza, Dominic e Arrissa. O encontro com Kelly seria um novo acaso decisivo em sua vida.
Em Beverly Hills seu Dojo é freqüentado pelas vedetes de Hollywood. Encontraste Michael Orvitg – ainda um acaso – um homem que faz chuva e bom tempo na meca do cinema. Ele o apresentou a Terry Semel, o presidente da Warner. A seqüência conhecemos: seu primeiro filme “Nico” é um sucesso, três outros se seguem com o fenomenal ” Under Siége” que faz em 1992 seu cartão de visitas. Eis você estrela, rico de milhões e de uma popularidade quase indestrutível, firme.
Só há um problema, a imprensa americana não gosta de seus filmes que julga serem inutilmente violentos – o que eu não creio. Entre eles e você, as relações são catastróficas o que não contribui para a sua popularidade.
É nesse momento que escolheste assumir a causa tibetana, como o fez Richard Gere dezenas de anos antes, quando isto não estava ainda na moda. Você aparece como um oportunista e a imprensa lá não lhe perde de vista.
Nancy Griffith em um artigo “o buda de outro planeta” lhe critica violentamente, propriamente e como devo lhe dizer, com certo humor. Ela afirma que você não mantém sua popularidade, por causa de sua “arrogância” e sua falta de humor nas entrevistas.
Ela o critica de misturar em seus filmes – em particular ”Glimmer man “ – o budismo tibetano, as rudezas de linguagem e a violência, retomando uma confidência de seu cálculo: “esta é a única pessoa capaz de empregar uma grosseria e de citar o Dalai Lama em uma mesma frase”. Isso quer dizer que sua imagem está desgastada. Ela zomba de você e de sua súbita e tardia conversão ao budismo e a causa tibetana pois, de acordo com ela, “ Sua carreira estagnou depois de 1992”.
A história é um perpétuo recomeço. Com dezenove anos você partiu para o Japão à procura dos mestres das artes marciais e eis que em 1995 com 43 anos você divide as opiniões, os mestres, mas desta vez tibetanos.
Você tinha ido ao Japão para se encontrar interiormente em uma busca pessoal, e , aparentemente não estava ali pôr oportunismo. Mas desta vez, isso foi feito obviamente já que você “descobriu” que numa vida anterior eras Chokden Dorje, morto no século XVII.
Minha co-irmã conta como você fretou um avião para sobrevoar o subcontinente indiano, visitando os mosteiros e cortejando os lamas.
Você se ligou a Penor Rinpoche, o chefe supremo de uma tradição budista tibetana – o Nyingma. Este, como um feliz acaso – ainda um outro em tua vida – começava, conta ela, a estabelecer centros de ensino nos Estados Unidos. Seagal fizera doações generosas a sua organização convidando-o as suas custas a ensinar em Los Angeles.

Norbu Rinpoche – o novo guru de Seagal.

O ano passado, Seagal disse em seu círculo de amizades que pensava ter sido um homem santo em sua vida anterior. Seus amigos afirmam que ele se confessava a seu Guru e lhe pedia para ser reconhecido, o título de Tulku é conferido àqueles que provam que são dotados de excepcionais qualidades espirituais. Eles são destacados desde sua infância, uma dúzia ou mais, ao todo a serem reconhecidos no mundo ocidental. Seagal ia ser um deles.
Ele descreve a cerimônia: “Fevereiro último, Penor Rinpoche reuniu cento e cinqüenta religiosos na sala principal, ricamente decorada do mosteiro Namdroling em Bylakuppe, na Índia. A estátua gigante do Buda estava iluminada de lâmpadas a óleo. Depois dos cantos de oferenda e as preces, o Lama anuncia aos fiéis que ele tinha tido vários sonhos e sinais de premonição que Steven Seagal era a reencarnação de um lama-Chokden Dorjee, falecido há muito tempo e que era um ‘Terton’  – quer dizer um revelador de tesouros. Penor Rinpoche informa a Seagal que ele tinha grande obrigação de ensinar aos outros.” As longas trombetas se refletem a soar e a estrela de filmes de ação coloca seus dois metros sobre um largo trono combinado com almofadas de seda. Com solenidade, o mestre das artes marciais era reinstalado no assento que ele ocupava na sua vida anterior.
Ninguém pode ser mais duro! Minha cruel co-irmã prosseguia:
“ Via Internet o site budista se põe a sussurrar que o “Tulku de Tinsel Town” tinha comprado seu título como um barão da idade média.”
Alegação que o porta-voz de Seagal desmentia, insistindo que a estrela tinha recebido o título por seus próprios méritos.
A suspeita de um caso de venda de título de lama se apossa dos praticantes mais tradicionais.
Além disso, o Dalai Lama se diz de modo geral “concernido pela proliferação dos Tulku e de outros abusos cometidos pelos lamas do ocidente”.
Ele emite “reservas quanto aos Tulku que se autodescobriram”, colocando fortemente em guarda os budistas. “Vós deveis seriamente examinar, antes de aceitar alguém como guru e mesmo depois, seguir este mestre dentro dos limites da razão”.
Nancy Griffith conta em seguida como você fazia os pés e as mãos para aproximar-se do Dalai Lama, indo até recolher U$ 25.000,00 do lucro de uma fundação para a qual ele devia levar a palavra. Você pediu e obteve uma mesa central na primeira fila.
E quando você era assíduo, na primeira fila, às conferências cotidianas que o Dalai Lama dava em Los Angeles.
E como, enfim, os organizadores da conferência sobre a paz, a qual o Dalai Lama devia se expressar, recusaram de te colocar sob o mesmo local que ele.
Nancy Griffith conclui seu artigo citando um budista de longa data: “ o maior perigo é que ele erga um templo no seu último pátio, ali construa um trono e se torne um guru”.
Ele não estava só aparentemente a pegar por sua conta um título de Tulku obtido em contrapartida pelas doações.
As acusações lhe machucaram certamente, mesmo se no curso da entrevista com Larry King da CNN, tu afirmaste não estar “nem em cólera nem ultrajado”.
Você contra atacou depois de ter lembrado que Walter Isaacson é Judeu e redator-chefe da Time Magazine: “Com efeito eu dei enormes somas de dinheiro à comunidade judaica, aos hindus, aos católicos e aos protestantes”.
Eu me pergunto o que aconteceria se a Time Magazine escrevesse em um artigo que todos os rabinos judeus estão implicados no tráfico de pote de vinhos, porquê eles receberam dinheiro de mim.
Eis aí o que sei sobre ti. Mas o que me deixou um momento, perplexo é a antipatia que você suscita junto aos meus irmãos. Eu não posso pensar que sois vitima de uma teimosia, ainda que sua arrogância e sua falta de humor não resolva seu nível de popularidade, dizem mas a te criticar da sorte!
Eu refleti e me perguntei: E se você faz intencionalmente de ser antipático, isso explicaria seu comportamento ao mesmo tempo que tens desejo de se juntar nas abas do vestido acefrão do Dalai Lama?
O reconhecimento da sua reincarnação não é suficiente?
Está fora então o Satori – a iluminação. Na realidade você não quer ser mais mestre de Aikido, estrela e muito menos “Tulku”. É vosso desejo o mais secreto e tudo o que fazes visando alcaçar o que almejas.
Este pressentimento me fora confirmado pela continuação ao curso de sua permanência em Paris. Você procura se mostrar forte. Mas é necessário isto quando alguem quer conseguir um objetivo, eu convenho.
Depois da sua partida, aqui na França, os praticantes, alunos de Steven Seagal, fizeram uma reunião para trocar suas opiniões e demonstraram estarem decepcionados tanto por seus ensinamentos quanto por suas demonstrações.
Não aquele de sábado a noite, mas aquele de domingo, no dia seguinte. Se os organizadores, participantes e observadores curiosos não compreenderam isso que você queria fazer compreender, é porquê eles são prisioneiros de sua própria ilusão, que como se sabe, é uma das doenças do espírito para um budista.
Com efeito, se imaginando – como se eles podessem estar em seu lugar, completando sua tríplice missão, e considerando todo o sofrimento que tu passastes para chegar nesta altura, eles tem precocemente, eu o admito – pensando que tu farias tudo para se manter ali. Em particular e no que lhe concerne, tudo elaborado para se assegurar de sua simpatia.
Por te conhecer melhor, eu sei que isto não é verdade, e que seu objetivo não é tornar-se um mestre de Aikido, estrela ou Tulku. Vosso objetivo profundo é ao contrário se desfazer de tudo isso.
Eles não podem imaginar as contrariedades que você teve quando era chefe – instrutor do Teshim Dojo em Osaka. É preciso dar exemplo e é preciso treinar, se aperfeiçoar permanentemente. Estar sempre sobre o que vive, ou então onde se possa detectar suas insuficiências sobretudo se és vaidoso de alguns conhecimentos.
Ser sensei e ainda mais 7º dan depois que o Doshu Kisshomaru o distinguiu antes de morrer – é muito pouco, pelo que já deste ao Japão.
E a vida de estrela, é o amor, a glória e a beleza? O dinheiro, as belas mulheres? Não, é a obsessão de não mais estar em primeiro lugar no box-office. Ser maltratado pelas críticas que a maior parte do tempo, escrevem seus jornais sensacionalistas sem mesmo ter visto o filme. Tudo isso aí eles não sabem. Eles acreditam que você é bastante estúpido para não colocar tudo no trabalho e perder. Estes imbecis destes jornalistas que não compreenderam nada, te imobilizam no pelourinho como se você não fizesse bastante esforço para perder tudo.
Mas então porque ser erguido tão alto para querer cair em seguida? Por que, me diz, para bem cair é preciso subir o mais alto possível . Elementar meu caro! Mas, uma vez subido alto, não é fácil, infelizmente, de abandonar malgrado toda sua vontade.
É verdade que quando lhe vi na manhã de 13 de junho, eu medi os esforços elevados que você tinha certamente querido manifestar até o presente. Você que era antigamente tão magro, tão belo, engordaste e sua face está gorda, tal qual de um pró cônsul romano que teria abusado da boa comida.
Então, durante sua permanência em Paris, fostes formidável na operação de auto-demonstração. Sente-se uma estratégia bem pensada e isolada que Sun Tzu não teria renunciado, o estrategista chinês, autor da “Arte da Guerra”. Porque é bem isto que ele se refere.
Você, “o guerreiro sobre a estrada da prosperidade” – que idéia de ter escolhido um nome cheio de dever – tens aplicado com mão de mestre sua estratégia.
De antemão, que maestria na escolha e na arte de suscitar as vocações para conduzir sua política.
Eis aí duas pessoas jovens, presas de um interesse tão brutal que querem ajudar a uma infância maltratada. Eles querem juntar dinheiro para dar a uma causa. Isso lhe motivou quando lhe propuseram se associar a sua operação como se tivesses o desejo deles. Umas doações a causas você bem fizeste, outras antes e outras ainda o fareis certamente no futuro. Eles são honestos – parece – e remeteram um cheque de 100.000 Francos, para os gastarem, você  aceitou 140.000 Francos para pagar duas noites no hotel – Bristol de acordo e seu bilhete para o Concorde – estimando que os 500.000 Francos , seriam suficientes para cobrir suas despesas de organização. Você aceitou sua proposição ( e eles estavam todos estupefatos e pobres) para melhor servir sua causa colocando-o frente a frente do público e dos outros 7º dan.
Os organizadores anunciam um seminário com o mestre Seagal 7º dan? Você os transformou em um golpe mediador com “figurantes” que pagam, e caro! É um “estágio de Aikido do futuro”. Você fez um sermão sobre o amor ao próximo com um gordo truque do budismo tibetano.
cenas durante o seminário – Paris 1999.
Assim tudo começou na manhã. Estes estagiários reunidos por dez horas, como prevê o programa, estavam sabiamente alinhados em seiza a lhe esperar. Para enganar o tempo, uma espécie de teatro de marionetes bigodudos, entre dois ensaios de microfone e de verificação da sonorização, os fazia realizar alguma coisa que se aproximava mais da ginástica para pessoas da 4ª idade que de uma arte marcial!
E você, com um maligno prazer, nos falam os agentes de segurança, retirado do seu vestiário transformado em templo, rodeado de sua corte de jovens mulheres, você meditou em frente a um pequeno altar, abrigando piedosamente sua foto.
E às 11:30 bem passadas, que os agentes de segurança, colocados em fileira em torno do imenso tatami, que J.P.Nestoux, o encarregado de esporte do 13º distrito decorou com amor e gentileza para receber o estágio do féculo ( felizmente ele termina) começam a se agitar.
Os Walkies Talkies crepitam, vai acontecer alguma coisa. Nesse silêncio, ( Ecce Homo), você, o mestre seguido por jovens mulheres, cercadas por uns seguranças, avança. Isto é muito belo e muito digno.
Chegado ao Tatamí, você pára. Todos o imitam. O que vai acontecer? Eu o vejo elevar sua grossa corrente de ouro, depois seu imponente relógio-de-ouro, eu me pergunto: Não ele não vai fazer isso? Depois tu entregastes suas preciosas jóias a uma de suas acompanhantes.
Verdadeiramente, eu tive medo, que, num gesto como você sabe ter sempre, não encarregasse alguém de dar esses ornamentos inúteis as jovens crianças maltratadas. Ufa! Você tem razão, eles podem ainda servir.
À noite de demonstração, aquela que devia reunir os três únicos 7º dan não japonês, os gentis organizadores, praticando Aikido, animados num sentido político evidente, iam criar o evento.
Vocês três, com Gerard Blaise e Christiam Tissier posaram para uma bela foto de família!
É verdade que na partida, você devia contentar-se em presidir a demonstração, pois Cyril e Richard, muito confiantes de ter conseguido fazê-lo mudar de opinião o anunciam. Eles não aprenderam ainda a desconfiar dos efeitos do anúncio! Os caminhos do Sensei são impenetráveis. Vocês acreditaram na sua participação tanto quanto no demonstrador. Dois Ukes despachados de urgência tinham chegado na véspera. Eles estavam presentes com um terceiro e esperavam sua vez.
Depois da demonstração muito pura de Gerard Blaize e Cristian Tissier, os outros 7 dan, numa perfomance rara que eleva o entusiasmo do público, troveja de aplausos! Difícil se fazer melhor.
Era sua vez. Num grande silêncio – a felicidade é enfim chegada – você levante e caminha em direção ao estado.
Seus ukes se prepararam e você pegou o microfone e não fez nada. Mas que quadro, uma questão de estratégia, você anunciou que as demonstrações, era da figuração (Show-off) e que era hora de dormir para estar descansado no dia seguinte. Genial sua estratégia para não ser comparado com os outros, um duplo golpe não fazer o que anunciaram e sobretudo anular os outros 7º dan. Você precisava, verdadeiramente pensar nisso.
Domingo, sem dúvida prezo de remorso, a menos que aquilo seja um elemento de sua estratégia de auto destruição pensada, você foi demonstrar uma defesa contra três atacantes – precisava que os ukes justificassem as despesas ocasionadas por seus deslocamentos?
Em uma situação dessa, você disse a Larry King da CNN: “Mais forte eles me atacam, e mais forte vem o contra-ataque”.
Demonstração: eles avançam forte sobre você e recuas para enfraquecer a distância. Ai você cai, sem dúvida para tornar a demonstração mais difícil? Eles o atacam. Os pobres, eles são xingados. É preciso retê-los pois eles não compreenderam que a queda não estava previsto na demonstração!
Aquele era um golpe “grande “ contra a sua imagem. De todas as maneiras, Steven, como você sempre disse a Larry King – os Koan, os enigmas são sempre baseados sobre o feitio de saber se o mestre é um mestre ou um idiota.
Você é a prova viva do enigma. Em todos os casos uma coisa é certa, você chateou tanto os gentis organizadores do seminário, que para darem o troco, se esforçaram para se convencerem de terem conseguido “reunir um estágio com oitocentos alunos, então deveria ser um show e eles deveriam reunir cinco ou dez vezes mais” – o que eles não arriscam recomeçar.
Você não fez nada. Eles fizeram o mais pesado. A próxima vez que vier a França, no país onde os queijos fedem, como diz “Sly” a marionete de Sylvester das mentiras, não será mais preciso alugar Bercy nem a Halle Carpentier. Uma cabine telefônica será suficiente para sua felicidade.
Meu caro Steven, eu espero não ter sido muito longo. O que eu tenho a lhe dizer, é o quanto eu gosto por você me fazer tanto rir.
PS: Cyril, o pobre, quarenta e oito horas depois da sua infeliz demonstração não tinha conseguido concordar com você. Ele me telefonou às 23 horas para me dizer que nosso encontro não aconteceria e que me sugeriu fincar o pé no hall do hotel Bristol para reencontrá-lo.
Gentil – mas incorrigível este pequeno – ele impulsionou seu camarada a chamar sua secretária Ben. No hotel, responderam que você tinha partido para cuidar de sua enxaqueca no Crazy.Horse Saloon. Decididamente você tem razão, porque explicou quando as pessoas compreenderam e com qual utilidade quando eles não compreenderam?
Comentários dos dois outros 7 dan que participaram do seminário como instrutores:

“Os organizadores tem cabeça dura se eles pensam que a vinda de Steven Seagal foi um sucesso, porquê houve 800 pessoas. Na verdade foi um Show do qual o Aikido não cresceu, porque o nível e a bagagem técnica demonstrados por Seagal, são muito baixos para um 7º dan.

Se ele não fez demonstração é porque falta treinamento, ele não está em forma. O que restará de sua passagem? É que Steven Seagal não é uma referência para o Aikido!” (Gerard Blaize – 7º dan)


“Eu vi a demonstração que ele efetuou no ano passado no Japão em vídeo cassete. Eu compreendo que ele tenha mudado de opinião . Eu penso que ele teve medo de decepcionar o público.” (Christian Tissier – 7º dan)

 

X – X – X – X

ARTIGO – KOICHI TOHEI E O AIKIDO

Koichi Tohei, nasceu em 1920 em Shitaya – atualmente Taito – em Tóquio. Por ser um menino que, volta e meia, encontrava-se doente e frágil, foi levado por seu pai a iniciar os estudos de JUDO.

Ele treinou muito e seu corpo prosperou; mas, logo depois de iniciar seus estudos pré-universitários na Universidade de Keio, Tohei desenvolveu pleurisia, uma inflamação do revestimento do tórax que lhe provocava grandes dores no peito quando respirava. Por isso, Tohei foi forçado a ficar um ano fora dos treinos.

Tohei estava angustiado com a idéia de perder sua força corporal recém-descoberta, bem como os meios de formação que a ela levaram. Assim, ele decidiu substituir os seus estudos de JUDO por exercícios de meditação zen e misogi. Tal como aconteceu com o JUDO, Tohei entrou na formação da mente com muito fervor e logo começou a superar os seus graves problemas de saúde.

Depois de se recuperou da pleurisia, dos quais os médicos não encontraram qualquer vestígio, Tohei se convenceu de que fora o seu esforço na formação da sua mente em cultivar o seu Ki que o ajudara a se curar e se recuperar. Isso o estimulou posteriormente a desenvolver a Kiatsu, um sistema de tratamento de doenças físicas que consiste em pressionar o corpo das pessoas doentes com os dedos, além de estender o Ki para elas.

Depois da sua luta contra a pleurisia, Tohei voltou para os seus estudos de JUDO. Porém, ele não estava mais satisfeito com essa arte marcial. Tohei queria mais do que apenas um treinamento físico e não achava mais que o JUDO fosse a arte certa para ele praticar, embora continuasse praticando até quando iniciou seus estudos de AIKIDO.

Em 1940, aos 19 anos de idade, seu instrutor de JUDO, Shohei Mori, recomendou que Tohei fosse se encontrar com o Fundador do AIKIDO, Morihei Ueshiba. Nesse momento, Tohei andava insatisfeito com o JUDO; por isso, partiu para ver o mestre da nova arte marcial que tinha ouvido falar.

De acordo com o próprio Tohei, ao se dirigir pela primeira vez a um instrutor de AIKIDO e após assistir a algumas técnicas no Dojo de Ueshiba, teve dúvidas sobre o AIKIDO e seu valor para ele. Essa impressão, no entanto, mudou quando Tohei entrou no Dojo. Ele ainda não se encontrava totalmente convencido até que Ueshiba o pediu para tentar agarrá-lo. Todas as suas tentativas foram infrutíferas e, após essa demonstração pessoal de Ueshiba, Tohei pediu permissão para se inscrever no Dojo.

Tohei continuava a treinar sua mente, bem como o seu corpo, por meio da meditação, do misogi e do AIKIDO. Tohei treinou com Ueshiba durante seis meses antes de ser enviado como representante de Ô-Sensei para ensinar AIKIDO na escola Okawa Shumei e na Academia de Polícia Militar.

Anos de Guerra

Como tantos outros jovens japoneses, Tohei fora convocado para o exército imperial em outubro de 1942. Ele participou de ações na China, onde ficou preso até o fim da guerra, quando foi repatriado, em 1946.

Pós-guerra

Em 1953, Tohei foi enviado ao Havaí para introduzir o AIKIDO lá. A partir de então, o Havaí se tornava um centro para a difusão do AIKIDO nos Estados Unidos e, posteriormente, do estilo particular de Tohei

Em 1969, Tohei foi convencido por Ueshiba a aceitar o posto de 10º dan. Tohei aceitou, depois de ter recusado anteriormente à mesma oferta. O topo do ranking no AIKIDO alcançava até o 8º dan, mas, devido a razões práticas e políticas, alguns alunos de Ô-Sensei foram reconhecidos como 10º dan.

Criação do Ki no Kenkyukai

Os acontecimentos que levaram a separação entre a principal organização de AIKIDO (Akikai) e Koichi Tohei foram intensificados com a morte de Morihei Ueshiba, em 1969. Seu filho Kisshomaru Ueshiba herdaria o título de Doshu. No momento da morte de Ueshiba, Koichi Tohei era o instrutor chefe do Hombu Dojo, sede da Aikikai, cargo que manteria até a sua separação oficial do Aikikai em 1974.

Uma das principais causas do conflito surgiu da ênfase que Koichi Tohei dava ao seu princípio do uso do Ki no AIKIDO. Tohei queria que o AIKIDO se concentrasse nesse princípio, utilizando os exercícios práticos tanto para cultivar e testar, na prática diária, o Ki no AIKIDO.

Tohei já havia começado a ensinar suas novas idéias durante suas aulas no Hombu Dojo, mas não era apoiado pela maioria dos instrutores. Havia alguns que concordavam com a abordagem de Tohei, mas ela não foi acolhida por Kisshomaru e a maioria dos instrutores seniores, que tentaram, veementemente, encorajá-lo a parar de ensinar os seus princípios e técnicas no Hombu Dojo. Tohei respondeu que tinha o direito de ensinar, nem que para isso ele tivesse que sair do Hombu Dojo, e foi o que acabou fazendo.

Entretanto, a tensão ainda permaneceu entre o quadro dos instrutores superiores do Hombu Dojo, que não aprovavam o foco de Tohei sobre o Ki. Essas tensões, além da insatisfação geral de Tohei com a situação, culminaram, em 1971, com a criação do Ki no Kenkyukai, uma linha de AIKIDO cujo objetivo era promover o desenvolvimento e cultivo do Ki.

Os anos de conflito finalmente cimentaram a decisão de Tohei em romper com o Aikikai e ensinar o seu próprio estilo de AIKIDO. Assim, no dia 1º de maio de 1974, Koichi Tohei oficialmente deixou a organização Aikikai para se concentrar em seu recém-criado Ki-AIKIDO e a Ki-Society.

No dia 15 de maio, Tohei enviou uma carta em inglês e japonês para a maioria dos Dojos no Japão e no exterior explicando suas razões em se separar e seus planos envolvendo o Ki-AIKIDO e a Ki-Society. Essa separação foi um choque para todos os aikidocas de muitos Dojos do mundo. Tohei era bem visto por muitos instrutores e estudantes.

Na verdade, Tohei era visto como o maior sensei do AIKIDO após a morte de Ueshiba. Tohei levou vários Dojos a romperem com o Aikikai e a se juntarem a ele e seu novo estilo. O novo objetivo de Tohei era o de coordenar todos os Dojos que se juntaram a ele e incorporá-los à organização Shin Shin Toitsu AIKIDO: AIKIDO com a Mente e Corpo coordenados.

O Shin Shin Toitsu AIKIDO continua ativo hoje, mesmo após Tohei ter se aposentado dos negócios do Ki-AIKIDO e se concentrado exclusivamente no Ki-Society e no desenvolvimento do Ki.

Na manhã de 19 de maio de 2011, Koichi Tohei falece no Japão, aos 91 anos de idade, devido a complicações nos pulmões.

Alunos notáveis de Koichi Tohei

Tanto antes como durante a sua posição como instrutor chefe do Hombu Dojo, Tohei havia instruído muitos aikidocas notáveis. Vários deles têm realizado grandes trabalhos sobre o AIKIDO em geral.

Entre eles estão:

Koretoshi Maruyama, ex-instrutor chefe e presidente do Ki-Society, que, desde então, fundou o AIKIDO independente Yuishinkai, um estilo internacional de AIKIDO.

Shizuo Imaizumi, 7º dan Shin Shin Toitsu AIKIDO, que fundou o estilo independente Shin Budo Kai AIKIDO.

Calvin Tabata, 8º dan Shin Shin Toitsu AIKIDO e fundador do Ki NW Federation. Ele possui um Okuden rank Ki, é professor pleno no Ki-Society e é instrutor chefe da Escola Kiatsu. Começou seu treinamento no Havaí e é um dos alunos diretos de Koichi Tohei.

Koichi Kashiwaya, 8º dan Shin Shin Toitsu AIKIDO, instrutor líder de Ki-AIKIDO nos Estados Unidos.

Ken Willians, fundador da Federação de Ki-AIKIDO na Grã-Bretanha.

Kenjiro Yoshigasaki, 8º dan Shin Shin Toitsu AIKIDO, um dos pioneiros na divulgação do Ki-AIKIDO na Europa. Fundou a Ki Independence no Kenkyukai Association Internacionale.

Fumio Toyoda, 6º dan, fundador da Associação de AIKIDO da América e da Associação Internacional de AIKIDO.

Shuji Maruyama, fundador do Kokikai AIKIDO.

Steven Seagal, 7º dan, ator de filmes de ação, produtor, escritor, diretor e músico de blues.

David E. Shaner, PhD, 7º dan, instrutor chefe da Ki Oriental Federation e presidente do departamento de filosofia da Universidade de Furmam, onde se especializou em filosofia japonesa.

Kenji Ota, dançarino de salão, pai do 5º dan Steve Ota e participante de uma séria de vídeos instrutivos de Ki-AIKIDO produzidos pela Panther Productions.

X – X – X – X

Entrevista com Hitohiro Saito Sensei – Diário do AIKIDO 113 – 1998.

(Tradução: Makoto Flores Yamamoto – DAISHIZEN DOJO).

“Não devemos romper com a tradição do Fundador só porque estrangeiros vêm para cá.”

Hitohiro Saito (40) nasceu em Iwama, onde iniciou, aos sete anos, seus estudos com Morihei Ueshiba, e continuou sua aprendizagem com seu pai, Morihiro Saito Shihan. Dedicado a preservar a tradição espiritual e técnica do Aikidô de O-Sensei, Hitohiro estabeleceu uma reputação de técnica e métodos pedagógicos excelentes no Japão, nos EUA, na Europa e na Austrália. Foi possível sentir seu profundo amor e respeito pelos dois mestres (seu pai e o Fundador) durante esta entrevista exclusiva.

(Diário do AIKIDO) Hitohiro Sensei, quais são suas recordações mais antigas do dojo?

(Hitohiro Saito) Eu compartilhava refeições com O-Sensei, comia o que sobrava no prato dele. Eu também me lembro de chorar pelas manhãs em minha infância porque minha mãe não estava ao meu lado quando eu acordava. Ela estava sempre fora ajudando O-Sensei no dojo.

(D.A.) Dizem que O-Sensei era muito severo…

(H.S.) O-Sensei geralmente demonstrava suas técnicas apenas em outros lugares, mas é verdade que ele deu aulas em Iwama e era muito rígido. Ele gritava, “Que tipo de kiai é esse! Vá lá fora e veja se você consegue derrubar um pardal com seu kiai.” Ou, se alguém aplicasse um yonkyo malfeito, “Saia e tente em uma árvore! Persista até que você descasque ela!”

Até mesmo quando criança, eu percebia a aura ao redor dele, a de um grande homem. Todos nós baixávamos as cabeças do momento que Saito Sensei, meu pai, ia buscar O-Sensei; permanecíamos prostrados até O-Sensei chegar com Saito Sensei logo atrás. Nós então levantávamos a cabeça para finalmente se curvar a O-Sensei em frente ao santuário do dojo. Depois, começávamos o treinamento com tai no henko.

Se eu estivesse sentado próximo ao Saito Sensei enquanto O-Sensei explicava uma técnica de shomenuchi, eu era chamado para executar um ataque de shomenuchi contra O-Sensei. Um dia, mandaram minha irmã mais velha atacar O-Sensei, mas ela começou a chorar e deixou o dojo, pois não era fácil para uma criança interromper O-Sensei desse modo. Falaram para eu ir, e eu o golpeei com um grito de kiai; foi quando O-Sensei disse, “Então você veio, não foi?” Ele me jogou, mas usou sua mão para evitar que eu batesse minha cabeça no tatame e disse, “Cuidado agora.” O-Sensei era uma pessoa muito amável.

Eu me lembro de ir para o jardim vê-lo escovar os dentes; de repente, ele os arrancou, pois eram falsos, e disse, “Isso foi engraçado, não foi?” (risos)

(D.A.) Quantos anos você tinha na época?

(H.S.) Estava no meu segundo ano primário. O-Sensei ainda era vigoroso naquela época. Nos seus últimos anos, ele fazia longos aquecimentos; porém, quando eu iniciei meus treinos de Aikidô, ele costumava ensinar mais técnicas.

(D.A.) Quando você decidiu se dedicar completamente a Aikidô?

(H.S.) Eu não tive muita escolha, pois sou o único filho, embora eu fosse preguiçoso quando comecei a treinar (risos). Eu planejava abrir um restaurante para poder me sustentar enquanto fazia Aikidô. Depois de me formar, fui para Sendai por um ano para aprender a cozinhar; depois, fui para Osaka para mais dois anos de estudo. Sempre que tinha folga, eu visitava o dojo de Seiseki Abe e aprendia caligrafia com ele. Eu também visitava o aiki dojo de Bansen Tanaka.

Abe Sensei pratica misogi jogando água fria nele todas as manhãs para purificar a alma. Ele expressa sua mente ascética pela caligrafia. Ele conheceu O-Sensei no dojo de Bansen Tanaka em Takahama. O-Sensei reconheceu uma alma gêmea no caminho do misogi e começou a aprender caligrafia com ele.

(D.A.) Nós visitamos Abe Sensei alguns anos atrás e vimos alguns rolos de papel maravilhosos feitos pelo O-Sensei. Dá para sentir um ar espiritual assim que você entra no dojo.

(H.S.) Esses rolos de papel são iluminados, não são? Para aprender mais sobre O-Sensei, devemos ler seus doka (poemas) e estudar sua caligrafia. Fotografias e vídeos nos dão um certo sentimento de conexão direta com O-Sensei, mas seus poemas e sua caligrafia se comunicam mais sutilmente conosco. Eles são realmente maravilhosos e profundos.

(D.A.) Abe Sensei conhece muito bem os poemas de O-Sensei, não?

(H.S.) É verdade, espero ele tenha sucesso nos planos de publicar uma coleção de caligrafias de O-Sensei e construir um museu dedicado ao O-Sensei. Quando eu era uma criança, Abe Sensei frequentemente visitava Iwama com sua filha. Ele é um aprendiz com profundo entendimento do Kojiki (Registro de Assuntos Antigos), o livro mais antigo da História japonesa. O-Sensei o citava para explicar o Aikidô. Abe me contou muita coisa sobre o Kojiki, mas como é algo tão difícil, temo que tenha entrado por um ouvido e saído pelo outro (risos).

(D.A.) Você praticou Aikidô durante seu aprendizado em Sendai e Osaka?

(H.S.) Em Sendai, eu treinei com Hanzawa Sensei e, em Osaka, pratiquei no dojo de Abe Sensei

(D.A.) Você abriu um restaurante em Iwama, como planejado?

(H.S.) Sim, em 1978, mas eu era jovem e tolo, costumava beber muito à noite com os clientes e não treinava muito seriamente. Eu dirigi o restaurante durante sete anos, mas comecei a temer que isso arruinaria minha saúde. Assim, falei com meu pai e ele concordou que eu deveria sair daquele negócio. Ele viajava para outros países frequentemente e precisava de alguém para se encarregar do dojo enquanto estava fora. Isso foi há 11 anos e, desde então, eu dou aulas de Aikidô em tempo integral.

Onze anos atrás, eu fui à Dinamarca com Saito Sensei para participar de um seminário. Ano passado foi o 10º aniversário da viagem; por isso, voltei lá com Saito Sensei e várias pessoas de Iwama. Foi um grande seminário, com aproximadamente 300 participantes.

(D.A.) Que conselho você daria para os praticantes de Aikidô sobre os fundamentos do treinamento?

(H.S.) Saito Sensei diz que todo taijutsu, técnicas de jo e ken são baseados em hanmi. Primeiro, você deve dominar o hanmi. Depois, você tem que aprender a fazer um kiai apropriado. Eu acho que o treinamento sem kiai é lastimável. O Fundador tinha um kiai maravilhoso. Se você quer aprender o verdadeiro budo, não pode cometer o erro de tentar imitar O-Sensei. Infelizmente, as pessoas não sabem muito sobre O-Sensei; por isso, dou o meu melhor para falar mais sobre ele.

Os fundamentos do treinamento de Aikidô estão sendo deturpados. Isso é evitado se você praticar ki no nagare (técnicas do fluxo do ki) desde o começo. O treino básico consiste em deixar seu parceiro te segurar firmemente. Assim, ele está fazendo um favor a você. Seu parceiro o segura e só então você começa uma técnica. Esse é o primeiro passo do caminho. Uma das instruções do Fundador era iniciar com tai no henko. Você não deve negligenciar a prática de tai no henko. Isso é o que ensinamos em Iwama.

É muito importante treinar forte o tai no henko e o morotedori kokyuho. Caso contrário, não dá nem para começar a explicar o ikkyo. Quando você gira em seu pé dianteiro e abre pela parte traseira, como em urawaza, você deve conseguir executar o movimento adequado de tai no henko, que é trazer os dedos do seu pé ao encontro dos dedos do pé do seu parceiro. Seu corpo gira ao redor do dedão do seu pé dianteiro. Gire corretamente, não de qualquer jeito. Você precisa harmonizar com seu oponente, não fazer de qualquer forma. Você tem que começar de maneira sólida.

(D.A.) A precisão necessária para se unir é um aspecto valioso.

(H.S.) Qualquer um pode se unir de maneira geral, mas a pessoa deve começar com formas mais específicas, que no fim se expandirão à harmonia universal sobre a qual o Fundador falou. Primeiro, você aprende como unir com seu parceiro “dedão do pé com dedão do pé”; daí, como girar em seu pé dianteiro. Quando você souber girar corretamente, você poderá executar uma técnica de urawaza. Não é possível verbalizar essas coisas; elas só podem ser dominadas treinando. O Fundador disse: “A prática vem primeiro.” Não é seu parceiro que se une com você, mas você que deve se unir a ele em tudo: “Mova-se, abra, então guie-o.” Isso é o que O-Sensei ensinou a Saito Sensei. Um erro de um centímetro pode impossibilitar o sucesso de uma técnica. Você não pode mudar as técnicas ao seu bel prazer. Há um modo definido para fazer cada técnica. Qualquer um, não só o forte fisicamente, deve poder aplicar as técnicas. Infelizmente, pessoas negligenciam o tai no henko. Eu posso dizer, apenas vendo as pessoas praticando o tai no henko e o morotedori kokyuho, que tipo de prática que elas fazem no dojo. Eu não preciso ver mais que isso. Eu acho que todos os fundamentos do taijutsu do Fundador estão contidos nessas duas técnicas e no ikkyo. É difícil achar alguém que possa executar uma técnica de ikkyo perfeita. Eu sei que isso pode soar insolente, mas eu acredito que você não pode entender o Aikidô sem começar corretamente essas técnicas. Se você não dominou o tai no henko, você sempre acabará colidindo com seu oponente nos outros movimentos. O treino básico é para o habilitar a resolver os problemas causados pelo movimento errado do corpo. É impossível explicar em palavras, pois tem um significado mais profundo; mas eu sinto que o único modo de aprender é permitir que seu parceiro o segure firmemente.

(D.A.) Em algum dojos, os sensei colocam seus alunos para praticar as técnicas após demostrá-las apenas duas ou três vezes, sem explicação adicional; mas em Iwama, você sempre tem explicações muito detalhadas.

(H.S.) A razão pela qual Saito Sensei explica as técnicas em detalhes é que ele quer que todo mundo domine cada técnica o mais depressa possível. O método pedagógico dele é resultado do aprendizado de muitos erros que ele cometeu durante anos. Em seus últimos anos, O-Sensei demonstrava uma técnica de forma extremamente rápida, para então julgar a habilidade de seus alunos baseada no quão bem eles a entenderam. Como Saito Sensei quer que todo mundo se aprimore mais rápido do que ele, ele interrompe seus alunos imediatamente quando cometem um erro para ensinar os detalhes. Ele não poderia fazer assim em um treinamento fácil. Se seu parceiro se render a você o tempo todo, não dará para saber se você executa as técnicas corretamente. Segurar seu parceiro fortemente o ajuda a saber se você faz as técnicas corretamente ou não. Isso não significa que ele deve te segurar com malícia, embora a técnica pode ser adaptada de acordo com a situação. Seu parceiro deve segurá-lo firme, mas corretamente, para então você aprender a se unir com o poder dele. Esse é o treino básico. Se ele te segura de forma cruzada por cima ou por baixo, você deve adaptar sua reação. Quando seu oponente o segurar, conduza-o habilmente. Vocês emprestam seus corpos um para o outro para treinarem seriamente.

(D.A.) As pessoas dizem frequentemente que, no Aikidô, não dá para medir sua habilidade porque o oponente colabora com você.

(H.S.) Isso não é verdade. Você sempre pode ver se sua técnica é boa ou ruim em todo momento da prática. Se você tiver que fazer qualquer esforço desnecessário, ou sentir que seu oponente é pesado, ou colide com ele, é porque você não está se unindo completamente a ele. Você deve identificar claramente o que está errado em seu movimento, ou saber se sua distância não é boa o bastante. Não há nenhuma necessidade em competir para saber se as técnicas funcionam ou não.

(D.A.) Você quer dizer seu parceiro deve atacá-lo seriamente no treinamento?

(H.S.) Sim, se eu digo, “Me golpeie”, ele deve golpear com todo seu poder; se eu disser, “Me ataque”, ele deve atacar duro; ou ele deve me agarrar fortemente. Ele deve atacar com toda sua força e energia. Claro que, se a força do uke difere consideravelmente da do parceiro, ele deve atacar com metade da força para que o nage poder aprender. O Fundador dizia que fazer essa prática com uma criança era um bom modo para aprender. Unir totalmente sua energia com a de uma criança é um grande desafio. Obviamente, algumas pessoas são mais fortes que outras; mas, se eles prejudicam o parceiro, cometem um ato de violência, o que não é mais Aikidô. Algumas pessoas pensam que tal prática violenta é valiosa, mas eu acho isso infame. O Fundador disse que nós deveríamos desfrutar do nosso treinamento, mas depende de quão agradável ele é para você. Quando você pode dizer sinceramente a seu parceiro depois da classe, “Muito obrigado. Por favor, treine novamente comigo”, esse é o melhor tipo de prática. Se um conflito surgir entre você e seu parceiro e o sentimento desagradável persistir após o treino, o treinamento não poderá conduzi-lo à paz mundial, como quis o Fundador. Eu quero que as pessoas gostem de todas minhas aulas. Até mesmo se alguém se machucar mas ainda quiser treinar, ele deve ser aceito. Eu aconselho os alunos que falem com o parceiro se tiverem um cotovelo ou pulso dolorido. Eles ainda podem treinar seriamente com o braço bom. Eu falo às pessoas cujos joelhos são ruins para fazerem técnicas em pé no lugar das técnicas de joelho. Nós não devemos praticar com receio. O melhor treino é quando você se preocupa um com o outro. O Fundador defendia uma abordagem ampla e, em Iwama, você ainda pode ser tocado por esse sentimento. Ele também disse que você pode aprender qualquer coisa que você vê se você quiser. Isso é bem verdade.

(D.A.) Mesmo que alguém não possa treinar diariamente, é mais importante que sua postura seja séria, não é?

(H.S.) Sim. O Fundador disse que até mesmo se você praticar centenas de vezes o suburi, você desperdiçará seu tempo se você não puser seu ki nele. Dez vezes são bastante se você dedicar toda sua energia. A questão não é quantas repetições ou quanto tempo você gasta treinando. Você não fica apto automaticamente após praticar por muitos anos e você não necessariamente é um mau aluno se praticar durante apenas dois anos. A questão é quão seriamente você se dedica.

Seu treinamento deve ser profundo, e é insensato treinar casualmente. Você deve aproveitar ao máximo seu treinamento. Não importa quantas técnicas você pratica; lembre-se sempre de que elas devem ser eficazes numa situação real. Seja mortalmente sério em seu treinamento e não desperdice um único minuto. Às vezes, eu vejo demonstrações de pessoas com técnicas que faltam definição, embora elas tentem duramente. Isso é lamentável; seria melhor se entregar por inteiro nos treinos, pois elas investem muito tempo nisso. Deve-se relaxar e colocar toda sua energia.

(D.A.) Tohei Sensei diz que, embora O-Sensei falasse para seus alunos usarem todo seu poder, ele mesmo parecia estar muito relaxado e não usava força.

(H.S.) Quando O-Sensei dizia, “Use toda sua força “, ele queria dizer, “Seja mortalmente sério” ou “Coloque toda sua energia.” Eu não acho que ele queria dizer para as pessoas exagerarem, mas usar todo o ki desde o fundo da barriga. Originalmente, ele gostava de dizer para as pessoas relaxarem. Quando Abe Sensei treinava Aikidô com O-Sensei, também lhe foi falado, “O Aikidô começa quando você deixa toda sua força ir embora.” Você deve relaxar e, mesmo assim, colocar toda sua energia.

(D.A.) Esse é um conceito difícil de se expressar em inglês.

(H.S.) Eu vejo a mesma dificuldade em japonês. O-Sensei disse em um de seus poemas, “A verdadeira arte marcial não pode ser expressa por palavras ou letras. Se você ousa tentar, Deus não lhe permitirá continuar.” Eu acho que isso significa que não dá para explicar artes marciais com palavras. Você deve aprender treinando mas, ao mesmo tempo, não deve assumir um ar de sabedoria. Ele deixou dois ou três poemas semelhantes. Tohei Sensei é um homem realmente respeitável, muito diligente nos estudos. Quando eu era criança, Saito Sensei dizia para eu me tornar seu uchideshi.

Em Iwama, preservamos não só a tradição em nosso treinamento mas também na vida diária.

(D.A.) Milhares das pessoas vêm de fora do Japão a Iwama, e deve haver muitos outros que sonham fazer o mesmo. Por favor, fale-nos sobre a vida de uchideshi e suas responsabilidades.

(H.S.) Há dois tipos de pessoas que vêm treinar em Iwama: os uchideshi (alunos residentes) e os sotodeshi (alunos de fora). Para um uchideshi, o dojo é sua casa. Em casa, você  a limpa, lava suas roupas diariamente e mantém seu jardim limpo; o serviço doméstico é compartilhado por todo o mundo. Como as áreas do dojo são muito grandes, há bastantes ervas daninhas e folhas mortas; sem cuidar disso por uma ou duas horas por dia, não dá para manter o dojo. Algumas pessoas têm um problema com esse costume japonês e voltam para casa dizendo, “Não foi o que pensei que seria.” Mas os uchideshi devem estar dispostos a fazer o trabalho voluntário e receber instruções com gratidão.

Todo dia, os uchideshi têm duas práticas, de manhã e à noite. Eles também podem praticar livremente durante o dia. Os sotodeshi só praticam à noite, embora nos ajudem com a limpeza algumas vezes aos domingos. Aprender os costumes japoneses é muito importante. Não devemos romper com a tradição do Fundador só porque as pessoas de fora vêm para cá.

Vir a Iwama significa conhecer O-Sensei. Este dojo não mudou nada desde os dias em que O-Sensei ainda vivia. Provavelmente a única coisa que nós mudamos é o tatami. Nem sequer os banheiros foram mudados; eles estão igual a 50 anos atrás e a banheira é a mesma que O-Sensei usava. Vir para cá é voltar no tempo, para aquele dias quando O-Sensei ainda estava vivo. Embora O-Sensei não esteja mais entre nós, aqui você pode se tornar um com ele em espírito. Se chover pela manhã, nós treinamos dentro do dojo; mas, com tempo bom, praticamos ken ou jo lá fora. Esse treinamento é bastante tradicional. Este tipo de dojo não é mais encontrado no Japão; imagine então em países estrangeiros. Este é um dojo onde a tradição não só é mantida em nosso treinamento mas também na vida diária. Então, eu gostaria que os uchideshi aprendessem sobre a tradição japonesa e, ao mesmo tempo, treinem duro para se tornarem instrutores. Você pode aprender técnicas e disciplinar sua mente ao mesmo tempo. Iwama oferece essa grande oportunidade.

(D.A.) Algumas pessoas acham que não há nenhuma necessidade em praticar ken ou jo no Aikidô.

(H.S.) Se fosse possível retirar o ken e o jo deste mundo, você não precisaria estudá-los. Porém, artistas marciais sérios devem aprender o arco, a espada, o jo e assim por diante, pois eles existem. Aprender sobre eles significa primeiro dominar seu uso. O Fundador dizia que ken, jo e taijutsu são um só. Então, você deve praticá-los. Aparentemente, quando O-Sensei via pessoas brandindo armas no Hombu Dojo, ele ficava bravo; lá, ele só demonstrava as técnicas de armas, sem ensinar de fato. Pode ter sido porque vários os tipos de pessoas iam ao Hombu para assistir a prática, e O-Sensei não queria que as visitas vissem o ken e o jo usados de modo errado.

Teria sido diferente se alguém houvesse estudado armas diligentemente desde o início, se aperfeiçoando sob a tutela do Fundador. Se O-Sensei visse alguém executar suburi exatamente que como ele queria, imagino que ele sorriria. Mas, se as pessoas brincassem com as armas ou experimentando técnicas de iai, O-Sensei provavelmente ficava bravo e os interromperia.

Eu conheci um dos que deixaram O-Sensei bravo mas, segundo ele, O-Sensei não disse “Não use armas”, e sim “Quem lhe deu permissão para praticar armas?” Saito Sensei trabalhou em turnos de 24 horas numa estrada de ferro, e assim pôde praticar técnicas de armas a cada dois dias com O-Sensei o dia inteiro. Quando Saito Sensei ensinava técnicas de armas em suas aulas de domingo no Hombu Dojo, O-Sensei assistia com um largo sorriso.

Houve uma vez, em minha infância, enquanto Saito Sensei  ensinava jo, eu apanhei uma vara e imitei o kata 31 para jo. Eu ouvi depois que O-Sensei assistiu a mim do quarto dele com um sorriso. Acho que o que importa é se as pessoas faziam as técnicas de armas do modo que O-Sensei lhes ensinou. Felizmente, temos Saito Sensei como um modelo maravilhoso. Devemos seguir seu exemplo para, então, dar um salto individual maior. Esse é o aiki do takemusu, a própria criação do indivíduo. Se você nunca usou armas, não poderá lidar com uma situação na qual você é atacado por uma arma. Porém, eu não insistiria a quem procura dominar o Aikidô para fazer treinamento de armas. O Fundador praticou armas e as armas existem. É por isso que nós praticamos. Não há nada mais que isso.

(D.A.) Todo o mundo concorda que o aspecto espiritual é muito importante no Aikidô de Ueshiba Sensei; qual é o seu treinamento espiritual?

(H.S.) Eu não faço muita coisa. A casa de meus avós fica atrás do Monte Atago, em Iwama. Aproximadamente seis anos atrás, eu pratiquei misogi diariamente debaixo de uma cachoeira que há lá durante pouco mais de um ano. Eu não faltei um dia, houvesse chuva ou neve. Um dia, li um artigo sobre um interessante senhor chamado Sasame, que vivia em Monte Otake, em Okutama, Tóquio. O artigo falava que ele havia conhecido Onisaburo Deguchi; por isso, senti desejo em visitá-lo. Depois de ficar em uma prisão na Sibéria durante a guerra, Sasame foi repatriado no ano em que nasci (1957) e, a seguir, visitou Iwama. Ele conheceu O-Sensei em Tóquio, que o avisou para ir a Iwama rezar no santuário e se recuperar dos efeitos da prisão. Mas ele voltou para Tóquio porque ele tinha medo que O-Sensei e ele entrassem em conflito, pois ambos eram bastante teimosos. Eu aprendi muito sobre a filosofia de Sasame Sensei. Infelizmente, ele morreu este ano. Ele também teve uma relação íntima com a religião Omoto. Ele não era exatamente um seguidor, mas a disciplina espiritual que ele ensinava está relacionada à religião Omoto de antigamente. Sasame Sensei disse, “Ueshiba Sensei deve tê-lo enviado a mim” e eu tive a mesma impressão. O Fundador disse que era importante estudar a unidade entre o mundo de aparências e o mundo espiritual. Como resultado, me tornei um pouco mais aberto ao mundo invisível. Acho que meu caráter mudou um pouco, pelo menos. Eu era bem rude, mas cresci para poder abaixar minha cabeça a outros. Eu tenho agora 40 anos, sabe? (risos)

(D.A.) Há um livro de O-Sensei chamado Budo, escrito em 1938. Você pode falar sobre ele?

(H.S.) Aquele livro foi escrito quando O-Sensei ainda era vigoroso. O Aikidô do Fundador não tinha a mesma forma no início do que o visto em seus últimos anos. Em Iwama, o Aikidô permaneceu quase exatamente como era quando o Fundador o iniciou. É um livro muito importante para aprender sobre o Fundador e a história das técnicas. É um tesouro; gostaria que houvesse trabalhos como esse, que mostra o Aikidô de O-Sensei como ele praticava aos 50, 60 anos. Saito Sensei logo terá 70 anos; assim, esses que iniciam no Aikidô agora não sabem como ele era quando jovem, com exceção do pouco que conseguem obter em vídeos e livros. Porém, no dojo, há pessoas que têm praticado desde quando Saito Sensei era jovem. Com elas, dá para saber como Saito Sensei era. A relação entre as pessoas no dojo deve ser como uma pirâmide. O-Sensei está no topo, seguido por Saito Sensei, e então os alunos mais antigos. Deve-se aprender com os mais experientes. Outros materiais de aprendizado também são úteis, e o livro é um exemplo maravilhoso. Técnicas não permanecem no dojo, mas se mantêm vivas dentro do indivíduo.

(D.A.) Uns oito anos atrás, quando surgiu uma possível venda do dojo de Iwama, Saito Sensei construiu um dojo novo. Se o dojo e os antigos aposentos de O-Sensei, além de outras coisas desaparecerem, você acha que ainda poderá manter aquela imagem única de Iwama?

(H.S.) Nós podemos apenas fazer o melhor possível. Até mesmo se perdermos o dojo, o santuário permanecerá, Porém, nós também não deveríamos ficar apegados à forma das coisas. O Aikidô de O-Sensei permanecerá intacto até mesmo se este dojo desaparecer. O treino de Aikidô não requer um lugar especial. Contanto que o espírito se mantenha, tudo ficará bem. Eu ficaria contente mesmo se apenas uma pessoa aprendesse essa lição, embora, naturalmente, todos estaríamos bastante tristes sem o dojo. Se isso acontecer, teremos que fazer um memorial.

(D.A.) Há algum modo de assegurar a preservação deste dojo?

(H.S.) Houve muitas sugestões, inclusive pedir uma contribuição de todos para estabelecer um fundo de preservação, ou reservar uma parte do dojo para posteridade, mesmo se for só um canto.

(D.A.) Ouvi dizer que algumas pessoas conheceram Tamura Sensei na França e perguntaram a ele se poderiam desmontar o dojo para ser enviado à França às custas deles, para impedir que ele fosse destruído.

(H.S.) Eu posso imaginar bem porque as pessoas querem manter o dojo. Patricia Hendricks, uma aluna da Califórnia, diz frequentemente quando ela vem aqui que o Iwama Dojo tem uma atmosfera tão especial que nunca deixa de revigorá-la. Entendemos que Iwama é o centro original do mundo do Aikidô e nós não hesitamos em dizer isso, embora eu suponha que eles diriam a mesma coisa em Tóquio, Tanabe e Ayabe. Acreditamos que o Aikidô começou aqui. É uma atitude mental importante, que pode nos ajudar a terminar o que o Fundador deixou incompleto.

(D.A.) Como você pensa que o Aikidô se desenvolverá de agora em diante?

(H.S.) Depende da atitude individual de cada um. Se você está preparado para se disciplinar com rigor, da forma que requer o modo marcial, acho que o Aikidô se expandirá infinitamente. Porém, ele não progredirá nada se você treinar com um parceiro que apenas colabora com você, sem atacá-lo seriamente. Pode ser outro problema se você praticar Aikidô somente pela saúde ou amizade. Caso contrário, ninguém irá além do Fundador. No mundo do sumô, as pessoas devolvem a bondade dos mais antigos lançando-os. Nós podemos devolver a bondade do Fundador indo além dele. Posso soar arrogante, mas acho que deveríamos treinar com essa atitude. Todos nós deveríamos fazer um estudo profundo sobre Saito Sensei. Essa é a meta para os que treinam em Iwama. Você deve sempre observar atentamente Saito Sensei e os mais praticantes mais antigos para se aprimorar profundamente. Tendo os ensinos do Fundador e de Saito Sensei como base, eu gosto de treinar duro e compartilhar com todo o mundo, sem derramar a água que O-Sensei tirou do poço. Essa é nossa responsabilidade. Saito Sensei carrega um fardo maior e eu devo estar certo de que recebo a mesma água dele. Todos os que estão agora no dojo também devem receber dessa água e dá-la aos que nos seguem. Embora devermos beber um pouco primeiro (risos). Beba primeiro e passe; isso é preservar essa maravilhosa tradição. Em primeiro lugar, aprenda sobre o Fundador, então adicione suas ideias originais e dê um salto. Antes de falecer, o Fundador disse, “Continue fazendo o que eu deixo inacabado.” Nós precisamos nos perguntar diariamente o que o Fundador nos deixou para fazer.

(D.A.) Você vai suceder Saito Sensei e manter a tradição; mas há alguma outra coisa que você gostaria de adicionar ou alcançar?

(H.S.) Acho que o Aikidô de Iwama está bem como é. Se eu quisesse adicionar qualquer coisa pessoalmente, gostaria de fazer um treinamento mais espiritual, mas eu não exigiria o mesmo de outros. Eu gostaria de fazer misogi como o Fundador fazia, embora o que eu faço possa ser não mais que uma imitação. Então, quero tomar a responsabilidade em preservar as formas tradicionais da mesma maneira que Saito Sensei tem feito. Porém, você não pode fazer nada sem uma técnica boa. Se você se torna um carpinteiro por herança, mas suas habilidades são ruins, ninguém lhe dará trabalho. O sucesso depende da habilidade individual. Eu farei todo esforço para não envergonhar o nome de meu pai, mas não é tão fácil assim.

(D.A.) Hitohiro Sensei, por favor, pode dar aos nossos leitores mais algumas palavras para concluir esta entrevista?

(H.S.) Quero que todos aprendam sobre o ensino espiritual e técnico de O-Sensei, especialmente no período em que ele era muito vigoroso, em vez de seus últimos anos. Vocês acharão algo certamente original, que difere do Daito-ryu. O Daito-ryu também é maravilhoso e nós deveríamos aprender com Sokaku Takeda Sensei também; mas primeiro quero que todo mundo saiba como O-Sensei era quando jovem.

(D.A.) Alguém me disse certa vez, “O-Sensei eliminou as técnicas do jiu-jitsu do antigo Daito-ryu e criou uma arte mais magnífica”, mas quando eu perguntei, “O que foi eliminado e o que é original do Aikidô, então?”, a pessoa não pôde responder. Eu não digo que todo mundo deveria praticar o Daito-ryu, mas algum estudo pode nos dar uma compreensão sobre que partes do Aikidô é original e que partes são adaptações do Daito-ryu. O-Sensei também foi influenciado pela religião Omoto e por pessoas como Masahisa Goi, do Byakko Shinkokai. Ao falar sobre os pensamentos de O-Sensei, a sua originalidade é um aspecto muito importante.

(H.S.) Esses que aspiram a dominar o Aikidô devem estudar sua origem.

(D.A.) A menos que haja alguém que seja bem melhor que O-Sensei.

(H.S.) Como disse Sasame Sensei, “As técnicas de O-Sensei são técnicas divinas; assim, uma pessoa normal não poderá imitá-las, não importa o quanto ele treine.” Como as técnicas dele são realmente divinas, temos que nos aprimorar o máximo possível para ir além.

(D.A.) Acho que é importante ter uma atitude que diz, “Quero chegar até o ponto em que O-Sensei alcançou” ou até mesmo “Quero ir além” e fazer nosso melhor, em vez de medir até onde já chegamos. O que importa é como você vive sua vida enquanto você ainda está bem de saúde e espírito.

(H.S.) É verdade. Eu quero dizer aos que sinceramente desejam aprender Aikidô, “Por favor, venha a Iwama, conheça Saito Sensei, deixe-o tocar seu coração e abra sua mente.” Você pode não mais encontrar esse tipo de dojo.

(D.A.) Hitohiro Sensei, eu lhe agradeço muito por hoje.

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 Artigo – Em Busca da Espada Perdida (Willian Gleason sensei – 7º dan Aikikai – SHOBU AIKI)

(Fonte: http://www.aikiweb.com/weapons/gleason1.html – Adaptado e traduzido por: Gustavo N. Santos)

Ao falecer o Fundador, em 1969, o treinamento de espada na Hombu Dojo (Academia Central) no Japão deixou de ser parte do currículo. Naquele tempo, o treino com espada estava disponível os alunos mais graduados e era realizado a “portas fechadas”.
Pelo contrário, o treinamento de desarmar os oponentes continuou sendo parte dos processos de exame até hoje.
Já o estudo do uso e manuseio da espada, para todos os efeitos práticos, foi completamente suspenso.
Desde aquele tempo a controvérsia sobre praticar, ou não, se espada era realmente parte, importante do treino de Aikidô se intensificou.
Indubitavelmente, Morihei Ueshiba, fundador do Aikidô, considerava o treinamento como a espada como uma parte essencial de seu ensino, bem como a sua própria formação. Ele constantemente usou armas, especialmente a espada, para mostrar os princípios do Aikidô.
Por que a esgrima é tão valiosa para a compreensão da essência do Aikidô?
Se estudarmos esta questão por uma perspectiva histórica a resposta se tornará clara.
O-Sensei, segundo ele mesmo, foi o fundador do Aikidô, mas não foi o criador do principio do Aiki. Este princípio foi reconhecido nas antigas tradições da espada Japonesa bem como na filosofia japonesa do Xinto. O-sensei era um devotado estudante do Xintoísmo e passou vários anos estudando a espada japonesa. Entre os estilos de espada que o fundador estudou havia o antigo estilo Kashima que data do século XV. O fundamento desta escola é o conceito de Shinbu, “o caminho marcial divino” em que se vence sem lutar. Para realizar isto se tem que desenvolver-se, física e espiritualmente, ao nível dos Deuses. Vale ressaltar que a escola do Katori Shinto Ryu, também tem o conceito equivalente de vencer sem matar, chama-se “heiho”.
O ideograma SHIN neste caso significa “Divino” e o ideograma BU refere-se à força criativa da vida, o poder do Musubi, ou tornar-se uno com seu parceiro. Isto foi descrito como Hoyo Doka, uma aceitação dos sentimentos negativos dos outros e da reintegração de que esta atitude magnânima volta para aqueles que nos atacam. Na aceitação, e re-absorção, é a habilidade de receber a energia de seu parceiro e unificar-se de tal forma que este poder é reduzido à zero. No Aikidô está é uma boa explanação sobre o que chamamos do poder do Kokyu. Dominar os aspectos espirituais e psicológicos desta habilidade era chamado de Aiki. A palavra Aiki também era usada para denotar o mais elevado nível de maestria no estilo Yagyu de espada onde O-sensei também foi notável.
A realização, realmente incrível, do fundador foi aplicar estes princípios para o treinamento de mãos vazias para uma nova e única maneira.
Por que isto não foi praticado, naqueles tempos antigos, depois de sua morte?
Todos os estilos de espada técnicas de grappling ou formas de Jujutsu, para no caso do guerreiro perder sua arma no calor da batalha, ser capaz de tirar a espada de outro homem quando você estava desarmado. No estilo Yagyu, isto é considerada a maior façanha.
Foi a grande visão espiritual de O-Sensei ao perceber o treinamento desarmado não como grappling, mas como a luta de espada sem a espada. Por isto, Jigoro Kano Sensei, o fundador do Judô, declarou que o Aikidô era a arte que ele havia buscado por toda a sua vida. O-Sensei, através de suas práticas espirituais, percebeu que poderíamos usar nossas mãos, ou mesmo só as nossas mentes, para cortar o ataque ou a defesa de nossos parceiros como se fosse a espada.
Combinando sua visão espiritual com o treino efetivo de espada ele percebeu que era possível estender a influência do Ki, ou intenção, além dos nossos dedos da mesma forma que nosso movimento e alcance são estendidos quando seguramos a espada.
A extensão do Ki é a essência do Mutô ou “espada sem a espada” e não há melhor exemplificação disso do que na prática do Aikidô.
No estudo da espada aprendemos como controlar o Kensen, a linha em que o Kirisaki, a ponta da espada, traça em cada corte. Para isso devemos capazes de traçar esta linha apenas com nossos olhos da mente. Esta habilidade é um dos segredos da prática do Aikidô. Isto nos permite ver a forma invisível presente em cada técnica e enviar energia precisamente para o local correto no corpo de nosso parceiro. Esta habilidade leva vários anos para ser adquirida.
Sem o treino da espada, fica difícil ao estudante a descoberta disto.
Cortar com a espada japonesa é um movimento expansivo onde a ponta da espada deve estar com unida ao nosso centro.  Por exemplo, o corte diagonal, básico, chamado Kesa Giri, pode ser equiparado ao Ikkyo no treinamento desarmado do Aikidô.
Se uma pessoal realmente domina este corte, ela realiza o Shin Shin Toitsu ou unificação de corpo e mente. Na técnica da espada do Kesa Giri está o segredo do movimento espiral natural. A espada desce pelo seu próprio peso e o peso do corpo vem para guiar esta queda livre. O giro do quadril e a sutil conexão entre nosso centro e a ponta da espada criam uma força sem esforço e velocidade. Exatamente como no Aikidô, esta forma básica de corte com a espada depende de uma continua expansão dos nossos sentimentos; de fato está é a vida do próprio movimento.
Além do mais, o trabalho dos pés e todos os movimentos da esgrima são semelhantes aos do Aikidô. Todo movimento no Aikidô, corretamente compreendido, é um movimento de corte. Afinal de contas, a espada foi criada para se ajustar ao movimento natural do corpo e não o contrário.
Estas são as principais diferenças entre o Aikidô e qualquer uma das várias escolas de Jujutsu. O Nikkyo, Sankyo, e Yonkyo do Aikidô, por exemplo, são realizados como movimentos de corte amplo, e não como chaves de pulso de contração.
Aikidô é uma arte extremamente sutil e difícil. Requer uma vida de dedicação para alcançar sua essência. Por esta dificuldade o Aikidô é quase sempre mal interpretado e praticado, quer como uma forma de Jujutsu ou meramente como exercícios aeróbicos.
Praticar em qualquer uma destas formas falta conteúdo tanto marcial quanto espiritual. As técnicas do Aikidô são ineficazes até que a pessoa tenha compreendido a essência do movimento espiral expansivo e a utilização apropriada do Ki, ou poder interno. Portanto, eles não podem ser efetivamente usados da mesma forma que técnicas de Jujutsu, que dependem amplamente de movimentos contrativos para o propósito de quebrar as juntas do parceiro.
Combinando o estudo da espada com as técnicas desarmadas somos capazes de descobrir o antagonismo complementar sobre flexibilidade e o poder descontraído (relaxado) unidos com nitidez e precisão. Nas palavras do fundador, ”no treino desarmado você deve mover como se tivesse uma espada; quando segurando uma espada você não deve depender dela, mas mover-se como se não tivesse nenhuma.” Estudar este Kamae, ou posição, nos mantém centrado na realidade da situação marcial e, ao mesmo tempo, nos permite permanecer flexíveis e relaxados.
Unificar estes opostos é descobrir o principio do Aikidô: Yin e Yang como sendo um, e movimento e descanso como sendo um Irimi-Tenkan como sendo um, a unificação de todos os opostos em uma forma de Monismo dinâmico.
Este artigo pretende dar uma visão geral e as várias semelhanças entre treinamentos armados e desarmados a ser feito com um instrutor qualificado. Não bastarão simplesmente repetir os Kata de espada como formas fixas sem descobrir sua estratégia e conteúdo. Cada estudante, sobre a supervisão de um instrutor qualificado, deverá adquirir a forma de ambos os treinamentos, armados e desarmados, como parte de um todo, e através de contínuas pesquisas, analises, esforçar-se para refinar seu, ou sua, forma individual de praticar em níveis cada vez mais altos de perícia.

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OSU (OSS)

Leonardo Sakanashi (CDA Argentina)

A  palavra OSU vem de “Oshi Shinobu” e se escreve com dois kanji: “O” que significa “empurrar” (oshi) simbolizando 100% de esforço e “SU” (shinobu) que significa “aguentar”, “resistir”. Combinado, “OSU” é um compromisso de se esforçar ao máximo e resistir.

Arte Marcial requer muita disciplina que por sua vez exige um grande nível de autorreflexão, e a autorreflexão é mais afetada pelas verdades irrefutáveis do que pelas recompensas.

OSU significa paciência, respeito e reconhecimento. Para conseguir um corpo forte e um espírito forte é necessário passar por um rigoroso treinamento. Isso é muito desgastante, pois precisa-se levar o indivíduo ao seu limite, ao seu máximo. Quando chega a esse ponto o indivíduo deve lutar consigo mesmo, contra as suas fraquezas e vencer. Para isso você precisa aprender a ser perseverante, mas acima de tudo precisa aprender a ser paciente. Isso é OSU!

A razão pela qual você se sujeita a um treinamento duro é porque você se preocupa com você mesmo, e se preocupar consigo mesmo é respeitar a si próprio. Esse autorrespeito o domina e se expande para ser tornar respeito ao seu instrutor e aos seus colegas de treino. Quando você adentra o Dojo você se inclina e fala “OSU”. Isso significa respeito ao lugar e ao tempo em que se passa se treinando nele.

Esse sentimento de respeito é “OSU”!

Quando treinas, você treina forte e exige o máximo de você mesmo, porque você se respeita. Quando o treino termina você se inclina e fala “OSU” para o seu mestre e companheiros. Você o faz sem pensar. Esse sentimento de fazê-lo sem pensar é “OSU”.

Também usamos este termo como saudação, para nos despedirmos, como reconhecimento de algum feito, mas mais como do que tudo como sinal de reconhecimento – respeito e gratidão.

X – X – X – X

 

SHINKI AIKIDO

(Poesia criada por Sugawa Tsutomo Sensei, sucessor de Michio Hikitsuchi Sensei, 10º dan – traduzida por Flávio Luiz Mestriner Leonetti, aluno do INSTITUTO TAKEMUSSU, 1º dan, Dojo-Cho do Ki Mussubi DOJO, também é filosofo e poeta).

* Oyunohara – o maior Torii (Grande Portal entre o Mundo Divino e o material) do mundo, com 34 metros de altura. Construído no ano 2000 no exato lugar onde existia o Templo Xintoísta, Kumano Hongu Taisha, inundado em 1889.

A vitória sobre si:

A mais genuína vitória!

Não em relação ao companheiro

Ou oponente seu:

Mas ao próprio “Eu”…!

Do seu ser será o Aikido parte integrante

a sinceridade no próprio Caminho

Estando viva, atuante…!

Austero treinamento:

para com a Natureza Um se tornar

Ainda que com suor, e lágrimas

No próprio tatami, a demarcar

Eis o Aikido, a técnica dos Kami

Nos campos de Oyunohara* a ecoar…

Desenhe um círculo e, livremente,

Ao universo, como que esteja a dançar…

Do silencioso Rio, a água pura

Ao fluxo do Natural, não contraria…

À mente, a purificação, e malícia alguma aceitar

À Natureza, gratidão

E o maior apreço!

Aos outros, o presente da felicidade,

E alegria, dar

Eis o Aikido: Caminho do Amor

A sagrada respiração de Kumano subjaz em torno…

À fonte de origem, o retorno

Em meio ao Reino do Mistério

Ante os conflitos, a própria resistência cessar

Reinicie do Princípio, primeiro…

Por um pacífico mundo, com o corpo inteiro, orar…

Partida, e liderança, rumo ao seu sonho

Aikido: ao mundo, Ponte a iluminar…

X – X – X – X

MANDAMENTOS BÁSICOS PARA PRÁTICA DO BUDO

A fim de conservar os princípios básicos do BUDO, a Associação Japonesa de Budo decidiu escrever, em 1987, uma Carta do Budo, em que estabelece alguns “mandamentos” para a prática:

1 – Por meio do do treino mental e físico é possível formar o caráter do budoka, de modo a tornar um indivíduo disciplinado e de bem;

2 – Agir com cortesia e respeito durante o treino e desenvolver o equilíbrio entre o corpo, a mente e a técnica. Evitar a tentação de perseguir apenas a técnica de luta corporal;

3 – Ter humildade e autocontrole durante uma competição ou formas definidas de combate (kata);

4 – Demonstrar cortesia e respeito no DOJO;

5 – Os professores devem encorajar a evolução dos seus alunos e não devem dar ênfase somente às competições ou habilidade técnica;

6 – As pessoas que promovem o Budo devem ter a mente aberta para compreender os valores tradicionais japoneses. Elas devem desenvolver pesquisas e metodologias de ensino para a sua divulgação.

7 – Não importa quão rápido seja o movimento, este deve emanar de uma essência calma e silenciosa;

8 – A adversidade não faz esmorecer um praticante do BUDO, ajuda-o a florescer.

Os dez males aos quais um budoka não deve se entregar – segundo manuscrito da Escola de Kashima Shin (retirado do livro Segredos do Budo, organizado por John Stevens, editora Cultrix, 11ª edição).

1 – Insolência;

2 – Confiança excessiva;

3 – Ganância;

4 – Raiva;

5 – Medo;

6 – Dúvida;

7 – Suspeita;

8 – Hesitação;

9 – Desprezo;

10 – Vaidade.

X – X – X – X

O PAPEL DO MESTRE E DOS DISCIPULOS

Tradução Angelo Fares Souza.

Compartilho uma pequena e humilde reflexão. Em primeiro lugar, agradeço ao meu Shihan, Armando Cantu Reyna, por compartilhar a sabedoria de Soke Masaaki Hatsumi e aos guerreiros que me acompanham neste maravilhoso caminho.

Se você pretende comer apenas da árvore, é melhor aplicar o NRDDNC (nos reservamos o direito de não te conhecer).

O Budo é como uma árvore. Muitos querem apenas comer os frutos, mas muito poucos são os que estão empenhados em cultivá-los. Como qualquer árvore, requer cuidados. Você tem que regar, fertilizar, proteger de pragas, etc.

Você toma cuidado quando a árvore precisa de água?

Você toma cuidado quando os galhos começam a secar por falta de cuidado?

Os ramos seriam o equivalente aos mestres. Todos querem se acomodar à sua sombra, mas…

Quanto você tenta para que a árvore mantenha seus galhos saudáveis?

Você treina humildemente e ouve os ensinamentos de seus professores?

Você os apoia quando precisam de você?

Você se comporta como aluno, ou como cliente, que cobra em troca o que “pagou” com sua mensalidade?

Você é um daqueles que ainda acreditam que o ensino de um verdadeiro professor pode ter um preço?

Você é um daqueles que está nos momentos em que a seca ameaça a saúde da árvore ou daqueles que só aparecem quando a árvore dá seus frutos e se comporta como uma criança diante de uma bexiga cheia de doces que deixa cair seu doce conteúdo?

Muitos vêm fazer a colheita com a ideia: “outra pessoa vai cuidar da rega da árvore, então vamos aproveitar seus frutos”.

Não se esqueça que quem cuida da árvore, não só vê crescer… também cresce com a árvore. Tampouco devemos trabalhar pensando que o fazemos apenas para colher.

Você tem que pensar em compartilhar com outras pessoas. Não faltam os que cultivam só pensando na colheita e até no ganho monetário com os frutos.

Talvez a árvore não murche completamente, já que apenas uma é suficiente para mantê-la viva, mas… e quando aquele que estava no comando se for?

Nossa missão como guardiões da árvore é ensinar pelo exemplo a cuidar dela, protegê-la…

É preciso cuidar até das folhas menores dos rebentos, embora muitas caiam ao primeiro vendaval e algumas até com a mais ligeira brisa.

São aqueles que, à menor dificuldade, acabam saindo.

Mas sim, eles não se cansam de proclamar aos quatro ventos que “pertenciam” àquela árvore e até mesmo proclamá-la como sua.

O Budo existe…

Somos a favor do Budo?

O Budo é para todos, MAS NEM TODOS SÃO PARA O BUDO.

X – X – X – X

ENTREVISTA COM NOBUYUKI WATANABE SHIHAN

Tradução: Diego André Faulhaber.

Nobuyuki Watanabe nasceu em 25 de julho na prefeitura de Miyazaki, no ano 5 de Showa (1930). Ele começou no Aikido em 1952, aos 22 anos e é instrutor sênior no Aikikai Hombu Dojo. Ele foi fundamental na realização da Isogai Dynamic Therapy (um método quiroprático de tratamento para compensar as diferenças funcionais de comprimento das pernas) conhecida na Alemanha, onde ele frequentemente viaja para instruir em Aikido. Suas famosas demonstrações de Aikido (NO TOUCH) no All Japan (全氣演) são altamente controversas, mas sempre provocam uma resposta entusiasmada da multidão. O falecido Sadateru Arikawa costumava assistir estas demonstrações todos os anos, com uma cara feia.

Esta entrevista foi publicada em uma coleção de entrevistas com os alunos do Fundador, publicadas em japonês (顔como “Perfis do Fundador”) em 2009 e foi traduzida para o inglês por Christopher Li. Apareceu originalmente na edição de agosto de 2007 da Gekkan Hiden (月刊秘伝– “Ensinamentos Secretos Mensais”), uma conhecida revista de artes marciais no Japão.

Morihei Ueshiba O-Sensei em 1964, com Yutka Kurita, Kenji Shimizu, Mitsugi Saotome, Mitsunari Kanai, Akira Tohei, Kisshomaru Ueshiba, Shuji Maruyama e Nobuyuki Watanabe na extrema direita.

É porque eu amo isso que eu tenho sido capaz de continuar no caminho do Aiki.”

(Gekkan Hiden): Quantos anos você tinha quando se matriculou como estudante?

(Nobuyuki Watanabe): Eu me inscrevi formalmente quando me tornei shodan, mas eu já treinava antes disso. Comecei quando formaram um clube de Aikido no gabinete do Primeiro-Ministro (総府, agora o 内阁府) onde eu trabalhava. Tinha 22 anos na época.

(GH): Você estava praticando Judô até aquele momento?

(NW): Isso mesmo. Eu originalmente fiz Sumô, depois de Kyusei Chugaku (Nota do Tradutor:00 sistema do ensino médio pré-guerra para meninos de 12 a 17 anos) comecei o Judô. Ah, era tempo de guerra, então eu tive que cultivar meu corpo. Também fiz coisas como o Jukenjutsu (铳剣– luta de baioneta). Eu era bem grande, então sempre era usado como alvo na prática (risos).

(GH): Deve ter sido difícil! (risos) E depois da guerra?

(NW): Eu acho que eu tinha dezesseis anos, em Miyazaki…

Piloto das Forças de Ataque Especiais em Miyazaki antes da partida para Okinawa.

(GH): Havia muitos Tokkotai (N.T.: の攻队forças de ataque especiais, mais comumente conhecidas no ocidente como as bases “Kamikaze”) lá.

(NW): Isso mesmo. Havia uma base kaiten nas proximidades (N.T.:回のRetorno ao Céu”, comumente traduzido como “a volta para o céu”, “o agitador do céu” ou “mude o mundo” – torpedos tripulados e embarcações suicidas usadas pela Marinha Imperial Japonesa). Vivi com membros do Tokkotai desde os quinze anos de idade. É por isso que fumo o Presente Imperial de Cigarros desde então (risos) (N.T.: os cigarros imperiais, adornados com as 16 pétalas do emblema do crisântemo do imperador, foram dados aos pilotos suicidas Tokkotai, que costumavam fumá-los como um presente do imperador Hirohito antes da decolagem). Achei que ia morrer de qualquer maneira. Fomos banhados em disparos de metralhadoras. Eu sobrevivi, mas aqueles ao meu lado caíram em combate. Então é realmente misterioso que eu tive a chance de sair vivo, enquanto todos os outros morreram.

(GH): Depois de passar por essas experiências, o que você pensou quando encontrou o Aikido?

(NW): No começo, um conhecido me forçou a ir (risos), porque até então eu pensava: “o judô é o melhor!”. Eu estava motivado a me lançar sobre ele no Hombu Dojo. Alguém me disse para vir e depois me jogou em Shiho Nage. Eu pensei: “O que aconteceu?”. A partir daí foi muito difícil – tinha que ser tudo cronometrado, eu ia ao escritório pela manhã e depois direto para o treino matinal. Depois de trabalhar no escritório das 09:00 até o meio-dia, eu treinava no clube de Aikido e depois, à noite, treinava no Hombu. Depois de um tempo comecei a ir a um café para conversar com o Osawa (Kisaburo) Sensei após o treino matinal, depois ia treinar no clube de Aikido e à noite no Hombu.

(GH): Você não estava trabalhando afinal de contas, certo? (risos)

(NW): Bem, de alguma forma deu certo na época. Acho que meu supervisor desistiu. Na época havia muito pouco Uchideshi, então eu tomei um ukemi em uma demonstração das Forças de Autodefesa e meu supervisor disse: “Somos parte da mesma administração, então vá em frente, siga” (risos). Mas eu realmente trabalhei, porque recebi promoções especiais várias vezes – sempre fiz questão de trabalhar uma boa quantidade de dias. No entanto, chegou um momento em que meu supervisor foi trocado e quem entrou exigia que todos estivessem em suas mesas durante o horário de trabalho, então eu disse “estou fora”. Eu nunca mais voltei depois disso, nem mesmo uma vez, porque você não pode olhar para trás, para o passado.

(GH): Mas não foi difícil ganhar a vida?

(NW): Bem, eu era alimentado pela minha esposa (risos).

(GH): Então você realmente se demitiu?

(NW): Eu realmente gosto disto (Aikido) (risos). Mas nunca pensei que seria capaz de me alimentar do Aikido. Eu só gostei e quanto mais eu fazia, mais eu começava a ver algo. Acabei indo até o fundo por causa disso (risos).

O UMBIGO ESTÁ NO CENTRO.

(GH): Você se lembra de suas impressões ao conhecer o Fundador pela primeira vez?

(NW): Eu pensei: “Ah, é um Samurai. Alguém diferente de qualquer um que eu já vi antes. O ar ao seu redor é diferente!”.

(GH): Quem era o Uchideshi na época?

(NW): Tohei (Koichi) sensei, Tada (Hiroshi) sensei, Arikawa (Sadateru) sensei, Tamura (Nobuyoshi) sensei e Kuroiwa (Yoshio) sensei. Isso porque eu comecei tarde.

(GH): Você se lembra de sua impressão de segurar a mão do Fundador pela primeira vez?

(NW): Bem…eu não consegui agarrá-lo (risos). Eu já fui sugado e jogado. Ele deslizava para dentro e no momento em que nossos olhos se encontravam, meu corpo estava se movendo e eu era jogado.

(GH): Como limalha de ferro atraído por um ímã?

(NW): Essa reação é uma reação do Budo. A reação ocorre dentro do movimento. As pessoas de hoje não têm essa sensibilidade. O Fundador olharia de repente para os seus olhos e a reação das pessoas eram mais lentas, inúteis por um tempo. Então existia uma sensação de tensão que sempre deveríamos ter ao observar as mãos e pés do Fundador. O Fundador sabia utilizar com habilidade a energia de observação das pessoas.

(GH): É diferente hoje em dia?

(NW): É diferente. Quando eu estava lá foi justamente no momento em que o número de alunos do público geral estava começando a aumentar e a atmosfera gradualmente mudou. Originalmente, o Aikido era algo praticado por pessoas que já haviam treinado em outro Budo e buscavam melhorar suas habilidades. Quando o foco se tornou pessoas sem nenhuma experiência atlética, as coisas mudaram. Então agora quando você diz: “pegue o meu pulso”, há pessoas que perguntam: “Por que eu deveria agarrá-lo?” (risos). Por esta razão, em tempos passados, ukemi não era ensinado, todo mundo o recebia naturalmente.

(GH): Quem entre seus Sempai mais influenciou você?

(NW): Osawa sensei, claro.

Kisaburo Osawa sensei (の喜三郎) no All Japan em 1979.

(GH): O nome de Osawa sensei surgiu algumas vezes nesta série de artigos, que tipo de professor ele era?

(NW): Ele era com um monge budista zen (risos). Talvez você possa chamá-lo de funcionário chefe – na época ele era o organizador do Dojo. Seu Aikido era macio, mas severo. Ele ensinou o Kenpei Tai (“Corpo de Polícia Militar”) durante a guerra, então houve gravidade no meio de sua bondade. Eu recebi ukemi durante uma demonstração em Hibiya Kokkaido, mas depois que a demonstração acabou ele me levou ao Hombu Dojo e me fez receber ukemi por uma hora seguida. “O que você está fazendo não é ukemi. Ukemi não é se jogar”, disse ele.

(GH): O que ele quis dizer?

(NW): Ele quis dizer que só porque se é jogado, não significa que é ukemi. Apenas voar para longe não é ukemi. “Ukemi é sentir a técnica do seu parceiro e detectar onde ele está tentando jogar você”, disse ele.

(GH): Isso significa que ukemi é um treinamento para se perceber a intenção do seu parceiro?

(NW): Se você pensar sobre isso, é isso. Ser jogado é esse tipo de treinamento. É por isso que o treinamento de Aikido é feito dessa forma. Não é bom se você está apenas jogando ou sendo jogado como um objeto, e ser proativo e se jogar, também não funciona. É treinar o sentimento e detectar a intenção de seu parceiro naquele momento. Agora temos treinamento em arremesso e treinamento para ser jogado. Ambos os lados deveriam estar trabalhando sua sensibilidade, mas eles jogam fora isso e só querem jogar. Eu não entendia isso na época. É por isso que eu fui jogado por uma hora naquela época enquanto era repreendido. “Não é bom! Não é bom!” – mas no final me disseram “OK!”. Nunca mais fui repreendido por isso desde aquela época. Foi uma experiência valiosa.

(GH): Ele era um professor muito interessante, não era?

(NW): Sim, ele era. Não era só a prática física, era treinar para ver as coisas. Por exemplo, quando entrávamos em uma cafeteria juntos, ele apontava para um dos clientes e dizia: “Ei, quem você acha que é mais forte, você ou eu?”. Quando eles diziam “Huh?” e pareciam confusos ele dizia: “Não é bom a menos que você perceba imediatamente. Treine até perceber imediatamente!”(risos). Ou ele diria: “Se você acha que eu sou mais forte do que você, então treine novamente!” (risos).

(GH): Certamente parece um Zen Mondo (N.T.: diálogo de perguntas e respostas). Que palavras do Fundador você mais se lembra?

(NW): Ele falou principalmente sobre os deuses. O que mais me lembro é: “É o umbigo!”. Mas eu não entendia no início, havia muitas coisas que eu só entendi depois de estudar bonesetting (接骨 – Sekkotsu – uma forma de manipulação articular, semelhante à quiropraxia). O umbigo fica no centro quando se caminha ou senta. O umbigo é história, conecta você aos seus pais e antepassados.

(GH): Você sempre disse: “Mova-se como uma bola ao redor do umbigo” em suas explicações e “levante os ombros e respire firmemente”.

(NW): Isso mesmo. Isto porque se você levantar levemente seus ombros, poderá movê-los mais facilmente. Por isso que uma respiração firme torna-os firmes. Se você pensar em ficar em pé normalmente, descansará de pé, como um bastão. Se você pensar no umbigo, será a linha da pélvis. Tudo acima do umbigo se estende para cima, tudo abaixo se estende para baixo. Esta é a verdadeira maneira de ficar em pé. É por isso que podemos andar na forma de um “X”.

(GH): Você quer dizer ficar de pé ativamente em vez de apenas como um objeto colocado lá?

(NW): Isso mesmo. Então pode-se mover porque suas costas estão cheias de ar. Se você não tiver isso, seus joelhos não se movem. O lugar onde você está é “A Ponte Flutuante do Céu” (の浮橋), e eu acredito que este lugar está vivo. Por essa razão é que é importante primeiro se tornar uma bola e ficar firme.

A edição Shinpukuji do Kojiki, a mais antiga cópia conhecida do Kojiki.

(GH): O fundador frequentemente falava de coisas relacionadas com o Kojiki?

(NW): Isso mesmo. Uma vez o Fundador trouxe um gráfico anatômico humano e explicou com o Kojjiki em uma mão. Ele disse coisas como “a Naohi (直霊 – “mente correta”) está aqui” enquanto apontava para os músculos e ossos – ele realmente explicou claramente. Na época, no entanto, eu só pensei: “O que é isso?”. Foi só uma vez, então não me lembro de muitos detalhes.

(GH): Talvez para o Fundador a estrutura do Kojiki e a estrutura do corpo humano fossem as mesmas?

(NW): Em vez de qualquer coisa que disse, o que eu me lembro bem é o Kiai do Fundador.

(GH): Seu Kiai?

(NW): Eu me lembro. Não era o “Ei” normal. Primeiro havia uma ingestão de fôlego como que desenhando um arco, então havia um som “Iei-ei!” que parecia que estava puxando você. A voz dele não era retilínea, era uma voz espiralada. Seu abdômen girava e emitia sua voz. Lembro-me bem disso.

Nobuyuki Watanabe sensei ensinando no Aikikai Hombu Dojo.

A RESPIRAÇÃO DO AIKIDO É INALADA EM UM CÍRCULO.

(GH): Você já foi repreendido pelo Fundador?

(NW): Uma vez quando eu estava treinando com uma mulher jovem, ele gritou: “Você, apenas faça ukemi! Você deve tratar as jovens com cuidado!” (risos). Acabei fazendo ukemi por uma hora. Foi um bom treinamento! Já que a jovem não tinha muita força, se eu parasse em Shiho Nage suas mãos escorregariam. Como estava bem no meio da técnica e era bastante perigoso, então fiquei colado nela até o final, levando-a ligeiramente com o meu movimento.

(GH): Então a prática se torna em sentir e conectar com a energia?

(NW): As pessoas hoje em dia não podem fazer isso. Eles acabam apenas tentando jogar. É importante usar seu corpo suavemente e sentir a energia. Além disso, embora não tivesse acontecido comigo, ele repreendia as pessoas do escritório quando caminhavam atrás dele – “Diga com licença e passa na frente!”. Budoka não gosta quando as pessoas estão atrás deles, mas ninguém entendeu isso no início. Ele era rigoroso com as coisas assim.

Estátua de O-Sensei em Tanabe. Watanabe sensei frequentemente vê dicas importantes nas mãos do Fundador.

(GH): Posso entender que você percebe um monte de dicas nas fotos do Fundador?

(NW): Isso mesmo. Eu não fui capaz de ver o Fundador de frente muitas vezes, então eu olhava para as fotos e me perguntava: “Por que ele está com as mãos assim?”. Eu ficava pensando: “Por quê? Por quê?”.

(GH): Você notou algo nas fotos tiradas de frente?

(NW): Quando você olha para as fotografias do Fundador, cuidadosamente você verá que seu queixo é levantado ligeiramente para cima. Isso me incomodou por muito tempo – normalmente em Budo eles dizem: “puxem seu queixo”, mas quando você realmente tenta fazer, você descobre que a sua respiração fica mais confortável. O Fundador diria “Expire enquanto inspira e inspire enquanto expira”, mas eu só entendi isso pelas fotografias – há muitas dicas como essa.

(GH): O Fundador disse algo em particular sobre Kokyu (respiração)?

(NW): Ele nunca disse nada sobre respiração especial, mas me disseram “para Budo, respire inalando em um círculo, enquanto exala em um círculo”.

(N.T.: alguns alunos de Morihei Ueshiba expressaram a opinião de que isso se refere a uma forma de treinamento de respiração abdominal).

(GH): Em um círculo?

(NW): É por isso que eu encho os dois pulmões no início e depois me movimento enquanto encho um pulmão e esvazio o outro. Claro, o adversário vem para o lado que está inalando.

(GH): É difícil expirar enquanto inspira?

(NW): De jeito nenhum – se vocalizar enquanto se move isso acontece naturalmente, então eu ensino aos alunos “Diga ‘Wa’ enquanto você faz isso”.

(GH): Você pensou nesse modo de explicar por conta própria?

(NW): Sim, porque as explicações de O-Sensei eram quase todas sobre os deuses e você não podia fazer nenhuma pergunta (risos). No entanto, nas aulas particulares, às vezes havia uma pequena explicação. O Fundador às vezes treinava um a um em aulas particulares e às vezes eu participava como uke. Essas pessoas eram relativamente livres para fazer perguntas. Não havia como os alunos normais fazerem perguntas (risos).

(GH): É isso mesmo (risos)? Há alguma coisa que você se lembre daquela época?

(NW): O Fundador costumava mover suas mãos quando descansava de joelhos, em Seiza. Uma pessoa perguntou: “Sensei, por que suas mãos estão se movendo?” e ele disse: “Eu inspiro com esta (a mão direita) e fechou-a e expiro com esta (a mão esquerda)”. Na época eu só ouvia sem prestar atenção, mas agora eu penso: “Ahh, claro…”. Mas de qualquer forma, falava-se muito sobre os deuses (risos).

Nobuyuki Watanabe sensei ensinando no Aikikai Hombu Dojo.

AIKIDO É O TRABALHO DE CONHECER A SI MESMO.

(GH): Você geralmente chama atenção para as mãos…

(NW): Fornecem grandes dicas! A maioria das pessoas usam as mãos descuidadamente. As mãos não são apenas para agarrar e liberar, elas são importantes para transmitir a sensação ao oponente.

(GH): Sensação?

(NW): Depois que as mãos se abrem, elas se retraem ligeiramente, não é? Isso é sucção. Nesse momento, sente-se a sensação de ar nas mãos e se move com a intenção de jogar esse ar em direção ao rosto do oponente. Se continuarmos a segurar essa sensação então será capaz de mover sem puxar ou empurrar. São as mãos que criam esse tipo de sensibilidade.

(GH): Que tipo de treinamento você usa para desenvolver isso?

(NW): Muitas coisas. Por exemplo, golpear uma parede com uma bola de ar e visualizá-la se dispersando em todas as direções. Quando fizer isso, encontrará o lugar onde pode atacar com uma melhor sensação. Você vai entender onde a bola de ar explode com um estrondo. Quando estamos de pé e sentamos, se você sentar um pouco ainda estando de pé você será capaz de levantar muito mais rápido e firme. É uma sensação sutil.

(GH): Por que você começou a pensar em coisa assim?

(NW): Hmm…acho que foi depois que comecei a dar aulas. Quando você começa a ensinar aos alunos, o movimento deles começa a se parecer com os seus depois de dois ou três anos. No começo eu estava feliz com isso, mas quando eu pensei sobre isso eu percebi que não era bom. Percebi que significava que eu não estava mudando e pensei: “Isso não é bom.” Se eu não melhorar continuamente, eles também não melhorarão.

(GH): É isso mesmo?

(NW): Fui ensinar Aikido aos Maori na Nova Zelândia, mas quando tentei começar minhas explicações com “O-Sensei…”, eles disseram: “Nós não conhecemos O-Sensei. Estamos sendo ensinados por você no Aikido, então ensine o seu Aikido”. “Ah…é isso!”, eu pensei. Naturalmente O-Sensei e eu somos diferentes, então não posso dizer : “O-Senseio é assim”. A partir desse momento comecei a pensar no meu próprio Aikido.

(GH): A maneira como você ensina mudou também?

(NW): Mudou. “Eu faço assim, mas todos vocês são livres para fazer o que quiserem”. O corpo e a mente de todos são diferentes, então você não pode fazer a mesma coisa.

(GH): E o Fundador? Você notou mudanças no Fundador?

(NW): Pelo o que vi, eu realmente não sei, mas uma vez no treino matinal ele disse: “Sinto muito, o que te ensinei ontem foi um erro. Os deuses me repreenderam em meus sonhos.”

(GH): O Fundador?

(NW): Sim. Então ele nos mostrou, mas não conseguíamos entender o que era diferente (risos). A forma era provavelmente a mesma, mas mentalmente o interior deve ter sido diferente.

(GH): Eu ouvi que o Fundador não gostava de ser perguntado: “você poderia me mostrar isso mais uma vez?”.

(NW): Isso mesmo. Ele era fortemente contra a prática do kata como “fazer isso e depois fazer isso”.

Administrador-chefe do Xogunato Togugawa, li Naosuke (の伊 直弼), 1815-1860 também era um Mestre do Chá e ele cunhou a frase “Ichigo Ichie” (の期 – “uma vez na vida”).

(GH): Estava tudo ok se cada vez fosse diferente?

(NW): Sim, estava. “Ichigo Ichie ( の期”uma vez na vida”) – de momento em momento na técnica o corpo é movido pela mente para que não se possa fazer a mesma coisa duas vezes. No momento em que O-Sensei entrava no Dojo, seu corpo se expandia em um flash e as vibrações de sua presença se espalhavam pelo recinto. Ele não estava ensinando, era o seu próprio treinamento pessoal, ele expandia firmemente os seus sentimentos em todas as direções. É diferente quando alguém está tentando ensinar. Por isso eu não tento ensinar também. É treinamento. Quando se tenta ensinar o nível de treinamento cai.

(GH): Seu próprio treinamento pessoal?

(NW): Mas você não pode treinar sozinho, sabia? Há um tempo atrás eu estava treinando no Hombu Dojo e todos começaram a dizer que me sentiam pesado. Até o O-Sensei disse: “Você é pesado. Você só está praticando por si mesmo. É por isso que não é bom. Primeiro torne-se uma bola de ferro, em seguida torne-se uma bola de ouro. O ouro derrete facilmente e é macio. É por isso que é bom trabalhar com ele”. É por isso que você deve esticar os seus sentidos cada vez e pensar no que você está fazendo.

(GH): Você que dizer que O-Sensei não fazia as coisas por hábito, mas seguia seus sentidos cada vez?

(NW): Onde estão as pessoas que podem desenvolver esse tipo de sensibilidade hoje? Todo mundo fica obcecado demais com kata. O ditado favorito do Fundador era: “Jogue mil como um e jogue um como mil” (投 切っ切り). Como nos filmes de Samurai. Ele gostava destes (risos).

(GH): Os katas não são as técnicas de Aikido?

(NW): São técnicas para condicionar o seu corpo e desenvolver os seus sentidos. Então, se você pensa “o que é Aikido?”, no final deve ser conhecer a si mesmo e viver a sua vida.

Watanabe sensei em uma demonstração de Aikido (NO TOUCH) no All Japan.

X – X – X – X

SERVINDO A O-SENSEI – UM SAMURAI MODERNO!

Morihiro Saito Sensei em frente ao Aiki Shrine.

Morihiro Saito Shihan (Aikikai 9º dan) começou a praticar Aikido em 1946 com o Fundador do Aikido, Morihei Ueshiba, no Dojo de Iwama. Este ano marca o 50º aniversário de sua dedicação à prática da arte do Aikido. Ele publicou muitos livros, incluindo os 5 livros da série clássica Tradicional Aikido, além de vários vídeos.

Esta entrevista com Morihiro Saito Sensei se deu em ocasião do seminário realizado no Dojo de Gaku Homma Sensei, em Denver, Colorado.

Gaku Homma praticou Aikido por mais de 30 anos e é o Fundador do Nippon Kan Culture Center em Denver, Colorado. Ele é autor do Aikido for Life e de outros livros sobre Aikido e cultura japonesa.

Parece que em toda etapa importante da minha vida, Saito Sensei esteve lá. Ele estava em Iwama durante os anos em que eu fui um uchi deshi com o Fundador, Morihei Ueshiba. Seis anos após a morte do Fundador, Saito Sensei atendeu ao meu convite para uma demonstração em um clube de Aikido na Base da Força Aérea de Misawa, onde eu organizava uma demonstração que meu deu a oportunidade de vir aos Estados Unidos pela primeira vez. Agora, 20 anos mais tarde, em outubro de 1995, eu tive a oportunidade de convidar Saito Sensei para lecionar no Aikido Nippon Kan, em Denver, Colorado.

Parece um piscar de olhos o tempo que passou tão rapidamente. Eu me lembro de experiências do passado como se tivessem acontecido ontem. Eu tenho 45 anos agora e Saito Sensei 67. Conforme o tempo passa e nós envelhecemos, eu acho que o nosso temperamento e nossos valores mudam, tornando-nos mais tolerantes e no geral mais aceitáveis. Durante o nosso seminário, enquanto eu tomava conta de Saito Sensei e observava-o ensinando, eu claramente percebi o quanto o tempo passou e quantas lembranças eu tenho.

Como Saito Sensei ensinou, eu nunca o ouvi falando sobre forças universais, Deus, auras, paz ou Ki. Eu nunca o ouvi fazer quaisquer outras referências cósmicas. Em cada um de seus movimentos, seu corpo mostrava os sentimentos que essas palavras lutam para capturar. Essa força de tocar o coração das pessoas através da eloquência de seus movimentos é o que o diferencia dos outros. Sua técnica física e a sua filosofia são simples e plantadas firmemente no solo. Quem ele é e o que ele ensina são baseados no realismo, não em conceitos ilusórios que podem ludibriar e confundir.

Conforme eu entrevistava Saito Sensei, não pude conter o sentimento de estar ouvindo um pai envelhecendo, passando a sabedoria de sua experiência para as futuras gerações.”

(Gaku Homma) Saito Shihan, você é muito saudável. Qual você acha que é o segredo da sua boa saúde?

(Morihiro Saito) Agora eu tenho 67 anos. No Japão isso me torna elegível a participar de atividades em grupo de cidadãos seniores. Eu recebo muitos folhetos e convites para participar de atividades de cidadãos seniores da cidade de Iwama. Eu não me sinto pronto para isso, entretanto, qual é o segredo da minha saúde? Não há segredo realmente. Eu não como muita carne e comidas gordurosas. Eu como alimentos com muita fibra. Ir às turnês de seminários é uma boa chance para perder um pouco de peso; eu geralmente não como muito quando estou viajando. Denver foi uma exceção, entretanto comer as refeições que Homma-kun preparava para mim, estimulava meu apetite. (Kun é um sufixo que indica familiaridade). Se eu tivesse um segredo para a boa saúde, seria manter-me ocupado.

Eu tento criar uma situação bem ocupada para mim, mantendo todos os dias cheios de atividades positivas. Meu motto diário é a cada passo que dou, deve ter uma outra tarefa esperando para ser realizada. No mesmo dia em que eu estiver voltando desta turnê pelos Estados Unidos, eu viajo para o norte de Honshu, para fazer uma demonstração no Tohoku Regional Aikido.

(G.H.) Durante o tempo em que morei no Aiki Shrine Dojo em Iwama, todos te chamavam de Mou-chan de Iwama (Mou é uma abreviação de Morihiro e chan é um termo carinhoso) ou Napoleão de Iwama. Por que você tinha esses apelidos?

(M.S.) Desde que eu me tornei um uchi deshi no Dojo de Iwama até a morte do Fundador, eu era um jovem muito ocupado. Durante o período que eu era um uchi deshi, eu também trabalhava para a Japan National Railroad. O único tempo que eu tinha para mim mesmo era nas viagens entre o dojo e a estação de trem e a volta. Mais que isso, eu não tinha tempo para mim. Minha vida consistia em trabalhar e praticar. Eu não podia ouvir música ou seguir os esportes da moda como os garotos da minha idade.

Às vezes eu trabalhava no turno da noite nas ferrovias e então os meus dias e noites se misturavam. Se eu quisesse ter um tempo extra para fazer alguma tarefa pessoal, como arrumar o meu uniforme, por exemplo, eu tinha que diminuir minhas horas de sono. As pessoas da cidade costumavam dizer: “Napoleão precisava apenas de 3 horas de sono em seu cavalo”. O Mou-chan de Iwama precisa de apenas 30 minutos de sono para estar pronto para trabalhar de novo. Eventualmente, o nome Napoleão pegou e virou meu apelido. Meu corpo não esqueceu aqueles tempos e eu ainda estou ocupado!

O apelido Mou-chan também traz de volta memórias. Eu não fiz isso acontecer, mas por alguma razão as pessoas da cidade de Iwama e das áreas ao redor tinham medo desse nome. Todos conheciam e isto tinha um estigma. Se algum dos Yakuza da vizinhança ou garotos da região tentassem causar algum problema em Iwama, a menção do nome Mou-chan geralmente os pararia. Isso foi uma grande surpresa para mim. Um dia, antes de um festival acontecer na cidade de Iwama, os garotos da região começaram uma briga com um grupo rival de uma cidade vizinha. Aparentemente o grupo rival queria pegar o espaço de venda para o festival e os garotos pensaram que isso poderia ser oportuno para invadir o território de Iwama. Eles reuniram o grupo e se aventuraram para dentro de Iwama com a Yakuza na liderança. Um dos jovens de Iwama veio até mim e pediu minha ajuda para separá-los dos seus rivais. A princípio eu recusei, pois não queria me envolver nas brigas pessoais deles. Mas, sendo jovem e não conhecendo o significado do medo, eu concordei em ajudá-los. Vestindo botas de couro para proteger os meus pés e uma jaqueta pesada de couro para me proteger de um ataque de faca, eu saí para ajudá-los. Eu fiquei surpreso quando cheguei no local. Eu não tinha idéia de quantas pessoas haviam se juntado na rua, prontas para brigar. Não sabendo o que mais fazer, eu andei diretamente entre os dois grupos e disse: “lutar em um dia de festival shrine não é bom”. O chefe rival deu um passo e perguntou: “Ei, você, jovem, quem é você?” “Eu sou Saito” – respondi. Mas isto causou pouco impacto. Depois alguém de Iwama gritou: “Ele é o Mou-chan de Iwama”. Nisso, o chefe rival ajoelhou-se, abaixou a cabeça até o chão e desculpou-se. Eu disse aos garotos de Iwama que começaram a brigar para se desculparem também. Então eu reuni os líderes de ambos os grupos e levei-os até um bar local de sakê.

Conversando com os garotos de Iwama, disse severamente: “qualquer um que começar uma briga está errado e deverá remediar a situação servindo sakê para aqueles que eles machucaram. Conserte esta situação agora!” e depois disso saí. A maioria das pessoas da cidade conhecia o meu nome, mas não o meu rosto já que eu estava ocupado trabalhando o tempo todo. Como eu praticava Aikido, minha reputação parecia crescer no seu próprio acorde. Eu era frequentemente chamado para resolver disputas menores, mesmo antes da polícia ser chamada. Eu ainda não tenho certeza se a minha reputação era boa ou ruim. Claro, eu não tenho mais uma reputação deste tipo. Aqueles dias eram muito diferentes de hoje. Os tempos eram mais inocentes, especialmente no campo.

(G.H.) Parece que você ainda é o Napoleão de Iwama. Durante esta turnê de seminário, em um período de duas semanas, você viajou dos Estados Unidos para o Japão, ensinou em ambas costas leste e oeste e então veio a Denver sem nenhum descanso intermediário. Parece uma programação extenuante para mim. Como você vê, o que faz a vida válida?

(M.S.) O que me deixa mais feliz é ensinar o que eu herdei do Fundador. Eu tenho uma grande realização quando visito os meus alunos por todo o mundo, podendo ficar na casa deles, ensinando e praticando juntos.

Quando estou em casa, em Iwama, se houver um pouco de tempo extra, eu aproveito ficando no Aiki no Ie (casa do Aiki) sentado ao redor da irori (fogueira) com outros amigos, comendo e bebendo juntos. Este é um momento feliz para mim. Num dia como estes, o que eu mais gosto de fazer é cozinhar. Eu não sou uma pessoa que fica beslicando, mas eu tenho um estilo único quando estou cozinhando. Por exemplo, eu gosto de fazer meus próprios temperos com os chilli que eu planto no meu jardim. Eu tenho um jeito especial de juntar os chilli com óleo de gergelim. Tem que ser assim. Eu também gosto de fazer o meu próprio udon (macarrão de farinha branca) e soba (macarrão de trigo sarraceno). Eu gosto de secar e moer os grãos, fazer a massa e cortar o macarrão sozinho. Meu filho Hitoriho tem seu próprio restaurante de soba, então eu tenho uma fonte de trigo sarraceno fresco. Eu não gostaria de dizer a mim mesmo, mas eu acho que meu macarrão tem uma reputação muito boa.

Eu também gosto de ir ao hinoki furo (casa de banho) para relaxar. Eu não posso descrever o quanto me faz sentir bem.

Eu já sou avô. Eu tenho 13 netos. Mas eu acredito que para as pessoas que possuem seus próprios dojos, não há aposentadoria. É meu destino continuar. Eu sinto que é minha obrigação ensinar o Aikido do Fundador para o máximo de alunos possível. Quando eu morrer, uma ligação direta com a técnica dele irá desaparecer.

Eu recebi um presente de 23 anos de experiência com o Fundador. O que eu aprendi, eu aprendi com ele e o que eu aprendi eu me sinto na obrigação de ensinar.

Outros Shihan têm liberdade, eu não tenho. Há Shihans espalhados por todo o Japão e por todo o mundo, que em certo ponto, reuniram-se com o Fundador para praticar. O Fundador entendeu a essência do Aikido e guardou na palma da sua mão. Aqueles que se juntaram rapidamente, nunca realmente alcançaram o dom que o Fundador manteve em sua mão e então eles se foram.

Iwama é para os aikidoístas, o que por exemplo Meca é para os muçulmanos ou o Vaticano é para os católicos. Metaforicamente, Iwama é um farol e é minha obrigação manter sua luz brilhando claramente. Para outros Shihans, o farol simboliza os grandes empreendimentos e conquistas do Fundador. Eles usam essa luz para iluminar seus caminhos enquanto navegam livremente em barcos que eles mesmos construíram.

Enquanto esta luz continuar a brilhar em Iwama, as raízes do Aikido continuarão a existir. Eu acredito que é muito importante não esquecer este ponto. Eu comecei no Iwama Dojo em 1946. Até a sua morte, eu passei todos os dias durante 23 anos com o Fundador. Desde a sua morte, eu tenho ficado em Iwama mesmo tendo uma posição de Shihan no Aikikai Hombu Dojo. Eu tenho dedicado todos os dias em manter a luz brilhando claramente no farol deixado pelo Fundador.

Eu tenho escutado que alguns aikidoístas distinguem as técnicas do estilo de Iwama das do Aikido mais moderno, chamando o estilo Iwama de tradicional e até antiquado. Na minha opinião isto é um erro. Eu acredito que se nós negamos as origens de nossa própria prática, nós negamos sua validade.

Quando as pessoas dizem que o estilo Iwama de Aikido é antiquado, eles me fazem lembrar de pessoas cortando o galho de uma árvore, enquanto eles estão sentados no próprio tronco sendo serrado.

Eu nunca diria que o estilo Iwama de Aikido é o único válido. Cada instrutor tem a sua própria personalidade que é construída com base na sua própria bagagem cultural e do ambiente. É natural que estilos diferentes e organizações diferentes tenham sido desenvolvidas. Ter viajado por todo o mundo me ajudou a entender isso, já que eu estive em contato com muitas pessoas, lugares e culturas diferentes. Eu acho que é bom para os alunos aprenderem com vários instrutores e praticarem em vários dojos diferentes.

Entretanto eu também acredito que é vitalmente importante praticar as técnicas da fundação do Aikido. Nós não podemos esquecer a fonte de nossa prática.

Nas vidas das pessoas, geralmente chega um momento em que elas refletem sobre as suas próprias raízes e heranças. Eu acho que é importante para cada um de nós incluir um estudo das técnicas do Fundador conforme viajamos em nossa própria jornada no Aikido. Nossa ligação mais próxima à fonte é o Fundador, Morihei Ueshiba, e a ligação mais próxima à ele é o Iwama Dojo. É importante para a comunidade do Aikido que mais pessoas percebam que as raízes da nossa prática estão com o Fundador. É importante passar pelos grandes acontecimentos e conquistas do Fundador corretamente, mesmo se for feito por uma pessoa de cada vez.

Por esta razão, eu mantenho a luz do farol acesa e brilhante em Iwama. É por isso que eu não tenho liberdade. Em vez de liberdade eu tenho o meu destino e eu gosto disso. Mantendo o dojo do Fundador vivo e bem, é o que faz minha vida válida.

(G.H.) Eu sei que faz muito tempo, mas você poderia nos contar como era sua época como uchi deshi no Iwama Dojo?

(M.S.) Eu ingressei no Iwama Dojo em 1946. Isto foi logo após o Japão ter perdido a guerra e não havia muitos recursos disponíveis. Era uma época de muita pobreza. Nascido e criado na cidade de Iwama, eu ingressei no dojo com 18 anos.

Não muito mais tarde, alguns dos uchi deshi do Hombu Dojo vieram a Iwama. O senhor Gozo Shioda (fundador do Yoshinkan Aikido) mudou-se para lá com a sua família de 6 pessoas (o que me deixou um pouco surpreso). Eles ficaram por aproximadamente 2 anos. O senhor Koichi Tohei (fundador do Ki Aikido) também chegou na mesma época após ser dispensado do serviço militar.

Eu me lembro de pensar naquela época se a guerra havia tornado ele alguém firme e forte. Ele deixou o dojo quando se casou. E havia outros dois estudantes que se tornaram uchi deshi na mesma época que eu. Um deles desde então se tornou um diretor regional de educação e o outro é hoje um membro do parlamento. Eu sou o único que restou ainda por Iwama (risadas)!. É difícil imaginar a aparência de Iwama naquela época. Onde agora você vê casas, havia acres de madeira selvagem. Nenhuma das ruas era pavimentada e quando chovia elas ficavam com muita lama. Nós usávamos geta (sandálias de madeira) com uma das bases da sandália sobressaindo do chão, uma vez que a lama ficava presa entre as bases de um geta normal de duas bases, tornando-os muito pesados. O geta de base única era melhor para caminhar na lama e no chão seco eles eram úteis para desenvolver equilíbrio e coordenação! Nós usávamos pouca eletricidade, especialmente nas áreas ao redor do dojo.

A noite era tão escura que alguém poderia encostar em você e você não saberia quem era! O Fundador era um membro proeminente da comunidade e se diferenciava por possuir a única energia elétrica da área. O contraste entre a escuridão total e as luzes brilhantes do dojo à noite, faziam o lugar parecer mágico. Mais tarde, quando minha casa foi construída, nós puxamos eletricidade da casa do Fundador para a minha casa. Naquela época, isso era considerado um luxo.

O pessoal da cidade achava que o que acontecia no dojo do Ueshiba-san era um pouco incomum. Por exemplo, a maneira que nós, os uchi deshi, nos vestíamos causava muitos olhares surpresos à medida que andávamos pela cidade. Nós vestíamos o keiko gi (roupa de treino, puída e remendada no colarino), hakama desbotado (mais curto que o de hoje, na altura do tornozelo) e haori (parte de cima do kimono, porém curto) decorados com padrões batik. Usávamos jo de ferro para tornar nossos braços mais fortes, balançando-os e girando-os fazendo barulho atrás de nós conforme andávamos. As pessoas da cidade eram conhecidos por dizerem que nunca deixariam seus filhos irem à casa do Ueshiba-san por qualquer motivo. Como uma advertência, os pais ameaçavam seus filhos preguiçosos que se eles não entrassem em forma, eles seriam mandados para o Ueshiba-san (risadas). Eles costumavam nos chamar de bankara (um grupo de aparência forte e ameaçadora). Ouvindo a fofoca local, o Fundador nos alertaria com um sorriso para não amedrontar muito as pessoas da cidade.

Alguns anos após o final da guerra, a vida começou a voltar ao normal. O país ainda estava em transição e havia muitas pessoas desempregadas. Muitos se associaram ao dojo de Iwama em busca de uma nova chance na vida. Embora houvesse uma horta no dojo, de repente haviam mais bocas para alimentar do que a nossa capacidade. O Fundador colocou os novos uchi deshi para trabalharem limpando os campos ao redor, para que pudessem ser plantados.

Os campos eram cobertos com uma densa plantação de bambu, cujo emaranhado de raízes tornava o trabalho de capinar e limpar a área extremamente desgastante. Alguns dos novos aprendizes acharam que o trabalho era muito duro, juntaram-se e desapareceram na noite. O trabalho era duro para mim também, mas mesmo que eu quisesse fugir não havia outro lugar para ir, uma vez que nasci e fui criado em Iwama. Na realidade, ainda não saí (risadas)! Após o incidente com a limpeza dos campos, o Fundador diminuiu as tarefas difíceis.

A área do dojo onde nós agora praticamos boken e jo é onde o Fundador e sua esposa tinham a sua horta particular. Em outros campos maiores havia plantações de batata, amendoim e arroz. Atualmente tenho uma pequena horta que considero um hobby. Somente alguns uchi deshi selecionados têm a permissão para trabalhar na horta. Na verdade a maioria dos uchi deshi são explicitamente proibidos de trabalharem na horta. Quando eles trabalham, apenas resulta em mais trabalho para consertar o que eles fizeram. O último uchi deshi que trabalhou nas hortas foi você, Homma-kun, e a empregada do Fundador, Kikuno-san. Eu me lembro de você com um monte de vegetais preso às suas costas quando você foi ao Hombu Dojo, de Tóquio, para acompanhar o Fundador e sua otomo (assistente). Após a morte do Fundador não houve nenhum outro uchi deshi que trabalhasse especificamente nas hortas.

(G.H.) Eu me lembro também. Naquela época eu tinha apenas 17 anos. Aqueles dias foram difíceis. Depois que o Fundador terminava sua cerimônia matinal diária, eu o acompanhava até a horta para pegar os vegetais que seriam usados nas refeições do dia ou, se houvessem extra, para levar ao Hombu Dojo em Tóquio. Falando do Hombu Dojo eu li muitos artigos e livros sobre a história do Aikido, escrita pelos uchi deshi do Hombu Dojo. Mas, quando eu acompanhei o Fundador em Tóquio, não havia nenhum uchi deshi morando no Hombu Dojo. Você poderia esclarecer isso?

(M.S.) No final da guerra, haviam muitos uchi deshi morando no Hombu Dojo. Na sua maioria aquelas pessoas estão muito velhas ou já morreram. Depois que a guerra acabou, o Fundador morou na maior parte em Iwama e ia a Tóquio apenas para cerimônias especiais ou eventos. Da última geração de estudantes que deveriam estudar diretamente sob a orientação do Fundador, muitos dos que diziam ser os uchi deshi do Fundador eram na verdade 2º e 3º dan Shidoin (instrutores assistentes) no Hombu Dojo. A maioria recebia o equivalente a aproximadamente 200 dólares de salário mensal, moravam em apartamentos baratos perto do dojo e iam ao dojo somente para praticar. Estes kayoi deshi (estudantes que moravam fora do Dojo) não cuidavam do Fundador. Exceto quando eles estavam ajudando-o como uke, os kayoi deshi não poderiam ficar próximos a ele. O Fundador exigia este nível de respeito.

Muitos agora dizem que eles ficavam próximos ao Fundador, mas não era realmente o caso. Mais tarde na vida do Fundador, pouco antes dele morrer, mesmos os Shihans melhores posicionados no ranking somente poderiam oferecer cumprimentos. Eles não estavam nem na posição de conversar com ele. O Fundador não queria ter muitas pessoas à sua volta e havia realmente poucas que, pessoalmente, cuidavam dele.

(G.H.) Quando falamos daqueles que cuidaram do Fundador na sua vida particular não podemos esquecer de sua esposa. Você poderia nos falar um pouco sobre ela?

(M.S.) Em 1951 o Fundador limpou a terra onde hoje está a minha casa. Nós construímos a casa juntos. No jardim há uma castanheira que o Fundador plantou. Desde que eu era um uchi deshi, era esperado que eu serviria o Fundador. Minha mulher não era uma aluna do Fundador e então não tinha a mesma obrigação. Mas ela trabalhou ainda mais duro que eu para cuidar do Fundador e sua esposa. Eu ia trabalhar todos os dias, portanto não ia sempre ao dojo. Minha mulher trabalhou 24 horas por dia durante 18 anos cuidando dele. Ela cuidou tão bem deles, que se por alguma razão ela não podia estar lá, Hatsu, a esposa do Fundador teria problemas em saber onde as coisas estavam.

Uma vez Hatsu adoeceu e teve problemas com a voz. Minha mulher conseguiu entender o que ela tentava falar apenas observando sua boca. Isso mostra quanto tempo eles conviveram.

Eu recebi promoções e reconhecimentos de dedicação do Hombu Dojo, mas minha mulher é a pessoa que merece a maioria dos créditos no que diz respeito aos cuidados oferecidos ao Fundador e à sua esposa. Somente minha mulher podia conversar com o Fundador diretamente, dando-lhe conselhos e oferecendo suas opiniões.

Além de cuidar do Fundador, ela também cuidava de nossa própria família e incontáveis uchi deshi por vários anos. Eu admiro muito a minha esposa.

(G.H.) Eu me lembro de sua esposa muito bem. Ela sempre soube quando aparecer com uma tigela de arroz cheia. Como você disse, se o Fundador estivesse bravo e sua esposa aparecesse, o humor do Fundador mudaria milagrosamente para o de uma criança feliz. Isso sempre me espantou.

Pouco antes do Fundador ir ao hospital em Tóquio, os efeitos de sua doença estavam no seu pior momento. Nós todos nos sentimos muito tristes por ele, mas era difícil nos aproximarmos dele. Foi triste ver um grande artista marcial perto do seu fim.

(M.S.) Foi uma época difícil para você também, Homma-kun, já que você cuidava dele pessoalmente. O temperamento do Fundador era imprevisível. Se ele estivesse mal humorado, quando você o encontrasse ele o envolveria com o seu mau humor.

Durante o último ano de sua vida, ninguém de Tóquio visitou o Fundador, porque eles não queriam se envolver. Foi uma época muito tumultuada para o Fundador. Deve ter sido muito difícil para vocês dois, Homma-kun e Kikuno-san, uma vez que vocês eram muito jovens.

(G.H.) Sim, foi uma época difícil. Talvez foi porque nós éramos tão jovens que o Fundador se sentia confortável e conversava conosco, mesmo próximo à sua morte. Falando de eventos recentes, Sensei, o que você achou do seminário aqui em Denver?

(M.S.) Fiquei surpreso que mais de trezentas pessoas se registrassem para os três dias de seminário. É realmente bastante gente! Foi bom ver um seminário que não ofereceu “atrativos” tais como exames de faixa, etc. O fato de um dojo independente como o Nippon Kan conseguir atrair tantos estudantes do mundo inteiro para um seminário próprio é muito bom. Eu percebi que houve participantes de 17 organizações diferentes e de outros dojos independentes.

Eu estou muito contente de tantos estudantes comparecerem. Acho que o Fundador lá no céu deve estar contente também.

A comunidade de artistas marciais, incluindo a comunidade do Aikido, enfrenta um futuro no qual mais e mais grupos se tornarão independentes, especialmente nos Estados Unidos e Europa. A organização do Fundador, o Aikikai, precisa prestar atenção nisso. Acredito que em vez de eles se concentrarem em fazer mais regras e restrições, seria melhor se eles reconhecessem e respeitassem organizações independentes. Isso abriria o caminho para um relacionamento mais forte e um futuro mais estável.

Ir além de diferenças de organizações e estilos cria uma oportunidade maravilhosa para as pessoas se encontrarem, como demonstra esse seminário. A filosofia de harmonia e amor do Fundador se manifestou nesse seminário. Eu ficaria muito feliz de viajar para qualquer lugar para ensinar em seminários como esse. Essa é a minha missão. Você, Homma-kun, não é afiliado ao Aikikai ou com o estilo Iwama de Aikido. Mas não há problema nisso. O fato de um dojo independente como o Nippon Kan conseguir reunir mais de 300 pessoas não pode passar despercebido. Seus alunos devem se sentir orgulhosos da estrutura própria, do dojo e da sua reputação que ganhou através das contribuições à comunidade. Eu não acho que seja necessário transferir os seus sucessos para uma outra organização.

Pessoalmente eu espero continuar a ser um conselheiro e a dar suporte ao Nippon Kan. Como eu prevejo mais dojos independentes no futuro, eu quero que o Nippon Kan sirva como um exemplo a ser seguido. Eu tenho as mais altas expectativas no seu papel como um dojo independente e estabelecido.

(G.H.) Muito obrigado, Saito Sensei. Durante o seminário eu escutei as pessoas dizendo que “o estilo de Aikido Iwama é muito mais acessível que eu pensava. Eu pensava que o estilo do Saito Sensei fosse mais estrito e severo.”

(M.S.) A minha maneira de ensinar significa ter uma prática alegre que demonstre claramente a instrução do dia, para que os alunos possam entender inteiramente e levar o ensinamento para casa. É claro que eu sempre quero uma prática sem acidentes ou machucados. Quando eu ensino e sinto que minhas explicações serão longas, eu peço aos alunos para se sentarem. Se há muita gente, peço para as pessoas que estão atrás ficarem em pé para que possam ver. Eu tento me mover ao redor para que todos tenham uma chance de ver claramente. Eu procuro explicar devagar e claro. Não estou interessado apenas em jogar ukes ao ar.

Somente esse ano, eu viajei para fora do país três vezes. Somando tudo, já conduzi seminários fora do Japão mais de 50 vezes. Francamente não sei por quanto tempo ainda vou continuar ensinando pelo mundo todo. Se a minha saúde continuar boa, eu sinto que preciso prosseguir minha missão de testemunha da obra do Fundador.

Eu me sinto feliz em ter estudantes maravilhosos ensinado e praticando ativamente nos Estados Unidos e em todo o mundo. Eu peço aos meus estudantes para continuar minha filosofia. Por causa dos esforços deles, as pessoas do mundo inteiro viajam para Iwama para treinar como uchi deshi.

“Recebi uma benção de 23 anos de experiência com o Fundador. O que eu aprendi, eu aprendi com ele e o que eu aprendi me sinto na obrigação de ensinar.” Em certas ocasiões, eu soube de estudantes que praticaram em Iwama e retornaram aos seus países só para causarem problemas com outros grupos de Aikido. Isso me preocupa, porque essas pessoas obviamente não compreenderam totalmente o treinamento que receberam em Iwama. Eles transmitiram essa falta de compreensão à medida que representaram erroneamente o estilo Iwama de Aikido para outras pessoas. Isso nunca foi a minha intenção. É importante que trabalhemos bem e de uma maneira amigável dentro da comunidade do Aikido.

Hoje em dia eu viajo com o meu otomo, mas houve épocas em que viajei sozinho. Uma vez, quando cheguei em um aeroporto nos Estados Unidos, não havia ninguém lá para me receber. Como não sei falar inglês, foi um problema! Por minha sorte, um grupo de turistas japoneses passou por mim e eu os segui para sair do aeroporto (risadas). Eu não esqueço as vezes em que carreguei minha panela de arroz na mala, cozinhando para mim mesmo nas viagens. Eu nunca imaginei que eu estaria aqui, sentado na casa de Homma-kun comendo comida japonesa em Denver, Colorado.

(G.H.) Foi uma honra e um prazer, Sensei. Muito obrigado.

Após sua chegada em Denver, a primeira pergunta que Saito Shihan me fez foi: “Que técnica eu devo ensinar essa noite?”. Depois de cada aula, ele perguntava se a aula havia sido adequada e se uma certa série de técnicas seria apropriada para a próxima classe. Eu fiquei impressionado pela atitude dedicada e profissional dele.

Depois do treinamento, na sala de espera, Saito Sensei agradecia a todos pelo comparecimento e oferecia frutas e refrigerantes. Foi um prazer ver tanto calor e gentileza demonstrado por um homem da posição dele. Um sentimento de generosidade permaneceu em sua volta durante o seminário inteiro.

Durante a festa de encerramento, nós acompanhamos Saito Sensei ao lavatório e esperamos ao lado da pia para lhe dar uma toalha para secar suas mãos. Eu me emocionei ao vê-lo cuidadosamente limpar a pia que havia sido molhada por outros, como uma cortesia ao próximo.

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MESTRES DE ARTES MARCIAIS QUE SE DESCULPAM.

Por Stanley Pranin – www.aikidojournal.com, 14/03/2013.

Há muitos anos que escuto o coro estrondoso, de críticas duras, que atacam o Aikido por ser visto como uma arte marcial ineficiente. As críticas às técnicas irreais do Aikido são ouvidas até mesmo nos lugares onde se pratica a arte. Confesso que até eu mesmo estava entre aqueles que criticavam, pois em muitos países acontecem muitas coisas nos dojos de Aikido, que não estão em conformidade ou são contraditórias com os princípios da arte.

Muitas vezes me surpreendi com os padrões utilizados pelos críticos do Aikido para humilhá-lo. No entanto, se um crítico quer discutir as vantagens e desvantagens do Aikido como arte marcial, não seria melhor determinar-se primeiro o que ele entende por arte marcial? Caso não ocorra, como podemos ter uma discussão razoável sobre o tema?

Por exemplo: a definição de “artes marciais” dada pelo dicionário online Merriam-Webster, é: “todas as artes projetadas para competições e autodefesa (como Karatê e Judô), que são amplamente difundidas como disciplinas esportivas.”

É isso? Eu não posso acreditar! Esta é uma definição completamente ridícula para começar. Também não há compreensão da origem do termo “combate” e sua conexão com Marte, o Deus da Guerra. Dizer que estas artes “para competição e autodefesa” são praticadas como um desporto é incompreensível. Quando é que as artes marciais se tornaram um desporto? Além dos gladiadores romanos, os participantes de competições esportivas, geralmente, não arriscam suas vidas.

Outra observação: o Fundador do Aikido, Morihei Ueshiba, proibiu, de forma dura, a competição no Aikido. Kenji Tomiki que introduziu elementos de competição no Aikido, e que devido a esta má conduta, tornou-se uma pessoa não bem-vista pelo Aikikai Hombu e desde então segue em uma linha separado deste.

Com isto, de acordo com a definição do dicionário Merriam-Webster, o Aikido obviamente não é uma arte marcial. O que falar então? Por que então discordamos uns dos outros, se, no sentido do termo utilizado o Aikido não é arte marcial?

Bom, seguirei o meu próprio conselho e para o efeito deste artigo, discordo da definição acima de “artes marciais”. Acredito que tenho uma definição melhor e mais próxima do significado dos mestres de artes marciais, quando dizem sobre a sua eficácia em situações “reais”. Desta forma, talvez, possamos discutir de uma maneira mais significativa se o Aikido pertence à categoria de artes marciais ou não.

Vamos definir as artes marciais como: “um sistema de técnicas e estratégias aplicadas, projetadas para serem usadas em um ambiente perigoso.” Ou seja, se alguém estuda uma disciplina que pode ser descrita como “arte militar”, suas expectativas (reais ou imaginárias) serão de que conseguirá dominar seus adversários em uma situação desfavorável.

Então surge a questão: Qual das denominadas artes marciais contemporâneas podem inspirar aqueles que as praticam a aguardar um resultado favorável, caso sejam colocadas à prova em um cenário realista? Judô, Karatê, MMA, Taekwondo, Aikido? Elas atenderiam as expectativas? Podemos responder claramente a esta pergunta?

Suponhamos que a resposta seja: “Ok, vamos testar!” Vamos supor que um praticante se encontre rodeado por uma gangue de rua, armada, em um beco escuro. Será que a pessoa pode prever o que vai acontecer nesse caso? Quantos bandidos existem no beco? Quais as intenções deles? Eles estão armados com o quê? Há mais alguém sendo atacado? O meu cérebro recusa-se a trabalhar quando tento imaginar o desenvolvimento deste cenário, porque é demasiado hipotético.

Vamos manter as coisas mais simples. Imagine um praticante de artes marciais (coloque o nome da arte marcial que desejar, aqui nos parenteses) bebendo uma bebida, descontraído, em um bar lotado. Sem prestar atenção, um sujeito bêbado se aproxima dele e começa a provocá-lo para uma luta. Poderá ele se defender, de maneira segura, de uma situação como essa? Seria possível responder a esta pergunta com segurança?

Tudo bem então, vamos adicionar mais alguns detalhes para que possamos prever melhor o resultado e assim determinar a eficácia da arte marcial que se colocou nos parênteses. Suponhamos que o praticante seja um cara grande e bem treinado. Um mestre na arte que pratica e com certa experiência em brigas. O sujeito que o está molestando é igualmente grande e forte, mas por estar aparentemente sob efeito do álcool, não conseguirá utilizar isso em seu favor. Desta forma tudo fica mais claro! Certamente, que o praticante vai ganhar e, portanto, a arte marcial que pratica (cujo nome está entre parênteses) será uma verdadeira arte marcial! É simples.

Agora vamos dar os seguintes passos: vamos detalhar (quanto mais detalhado, melhor) várias situações de perigo, características das pessoas e arredores. Depois vamos acrescentar possíveis resultados de tais situações e “cientificamente” determinar quais são as artes que merecem ser classificadas como “de combate”. Depois de feito isto, não haverá mais disputa, pois teremos um padrão objetivo para julgar.

Percebe-se como tal argumentação é absurda!

Neste momento, acredito que não podemos discutir racionalmente os méritos referentes de várias artes, uma vez que ainda não chegamos a um acordo sobre o significado dos termos básicos. Tudo o que podemos fazer é sentar-nos em círculo e construir situações possíveis, assumindo apenas o seu resultado. Este tipo de discussão é sempre emocional e bastante intuitiva e rapidamente perde-se o controle. Afinal, como discordar de um invencível especialista em artes marciais.

Neste caso, o melhor é manter a calma e olhar para o assunto de um ângulo completamente diferente. Vamos supor que o propósito das artes marciais seja o propósito do Budo – não ser derrotado, mas não lutar. Imagine um homem que praticou artes marciais há décadas mas nunca esteve numa luta “real” e, portanto, nunca sofreu uma derrota. Pessoas assim existem? Claro que sim. Conheci centenas de pessoas assim – e provavelmente você também. Podemos dizer que estes “mestres das artes marciais invencíveis” desperdiçaram o seu tempo porque nunca estiveram numa situação de risco de vida? Eles podem ser chamados de mestres das artes marciais sem nem sequer terem testado a sua bravura? No final, qual mestre é melhor: aquele que nunca foi derrotado e cujo placar é 0X0, ou o campeão do ringue com um placar de 35X2? Você tem que decidir por você mesmo. Afinal é você quem irá escolher a arte e decidir como a viverá todos os dias.

Claro que a ideia de um “mestre das artes marciais invencíveis” não é minha. Não sei quem pode se qualificar a altura deste conceito. Mas uma coisa é clara: Morihei Ueshiba, fundador do Aikido, expressou-se como o mais brilhante. Ele foi uma essência da filosofia do Budo. Quem desejar explorar mais sobre o assunto, pode começar com esta dica.

Inicialmente, o nome que eu escolhi para o meu artigo foi: Sentimentos duplos. Fiz isto, para tentar me focar no fato de que muitas pessoas do Aikido possuem sentimentos duplos pela arte. O Aikido funciona mesmo? Muitos se perguntam.

Acredito que a grande maioria dos praticantes de Aikido, percebem que perderão se entrarem no ringue contra um formidável lutador de MMA. Isto deve-se ao fato de que nunca treinaram para uma situação como essa e não é esse o propósito de sua prática. Da mesma maneira, temerão a perspectiva de ficarem sozinhos numa rua, à noite, rodeados por bandidos. Mas não seria da mesma maneira que o lutador de MMA, que tendo derrotado o Aikidoka no ringue, se sentiria numa igual situação? A situação descrita anteriormente, talvez, não fosse um problema tão grande para um policial. Qualquer pessoa que sobreviva a esta situação teria sorte.

Talvez fosse necessário, somente, evitar situações como a descrita acima, para nunca precisar aplicar as suas habilidades, mesmo que as tenha treinado persistentemente? Em caso afirmativo, seria apenas uma questão de sorte ou coincidência? Ou haveria relacionamento com os exercícios e com a sua capacidade de decisão que adquiriste através da sua prática no Dojo? Seja como for, este é o objetivo que o Fundador do Aikido e as artes marciais do mundo têm buscado.

Quando for ao seu próximo treino no Dojo, pergunte aos seus companheiros se eles já tiveram que usar o Aikido numa luta “real”? Pergunte quais são os objetivos deles e de seu treinamento? Depois me diga o que você sabe.

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O CORAÇÃO DO AIKIDO

por Rinjiro Shirata Sensei (com comentários de John Stevens) – extraído do livro “Aikido the way of harmony.”

Tradução: Diego André Faulhaber.

Rinjiro Shirata Sensei e John Stevens

Milhares de horas são gastas no desenvolvimento das técnicas, porém muitas mais são gastas lutando com os grandes tópicos da existência humana. Considerar o AIKIDO como uma arte marcial que envolve somente arremessos e imobilizações – habilidades que podem ser adquiridas em qualquer sistema de defesa pessoal – é um insulto à incansável busca espiritual do Fundador.

A mensagem do Fundador, no entanto, não pode ser assimilada rapidamente. Ele usou livremente suas ideias para expressar sua própria visão. Suas conversas eram uma mistura de frases do Budismo esotérico, de obscuros mitos Xintoístas e enigmáticas doutrinas da Oomoto-Kyo. Nenhuma pessoa, incluindo o próprio Fundador, jamais alegou compreendê-las por completo. Em uma ocasião ele afirmou: “Palavras e letras nunca poderão adequadamente descrever o AIKIDO – seu significado é revelado somente para aqueles que através de um intensivo treinamento obtém o esclarecimento.”

Shirata Sensei contou-me que embora, no início, estivesse desorientado pelas explicações de O-Sensei, gradualmente com o passar dos anos elas começaram a fazer sentido.

A seguir um resumo dos principais pontos da filosofia religiosa do Fundador, feito por Shirata Sensei.

O AIKIDO possui sua própria cosmologia. As palavras AIKI, KAMI e TAKEMUSSU são termos antigos, porém o Fundador as reinterpretou sob a luz do seu profundo despertar. KI é a energia primária que surgiu do vazio. Através do AIKI, a combinação do KI positivo com o KI negativo (Yin e Yang), as infinitas formas dos fenômenos foram e são manifestadas.

AIKI, a fonte e amparo da vida é Kami “O Divino”. Originalmente essa palavra consiste dos caracteres Ka (fogo) que simboliza o espírito e Mi (água) simbolizando a matéria. A confluência desses dois elementos resulta no surgimento do mundo material. A partir das funções do KAMI, como o IKI (Kokyu, a vivificante respiração da vida), surgem os KOTODAMA (vibrações divinas). A essas duas forças procriadoras o Fundador acrescentou uma terceira, o TAKEMUSSU (o valor da atividade do ser). TAKE (ardor marcial) também pronunciado BU, como em BUDO, é o empenho incansável e MUSSU é MUSSUBI, o poder de transformação.

A grande percepção do Fundador sobre o universo é TAKEMUSSU AIKI. Em seu mais alto nível, TAKEMUSSU AIKI pode ser interpretado dessa forma: BU nasceu do AIKI; BU dá a luz ao AIKI.” Dentro da perspectiva humana, poderia ser descrito assim: “Eu nasci dos meus pais; Eu dei a luz aos meus pais.” Isso é o mesmo que dizer: “Eu sou AIKI; Eu sou o universo!” Em termos mais concretos AIKI é principalmente aplicado para harmonizar as três funções: Corpo, Mente e KI.

Depois de realizada essa harmonização, usamos o AIKI para fundir nossos movimentos com os do parceiro quando executamos uma técnica. Nesse caso AIKI é A-I-KI, representado por um triângulo, um círculo e um quadrado que juntos formam os modelos básicos da criação. Os movimentos do AIKIDO surgem a partir desses modelos: postura triangular, entrada circular e controle quadrado (devemos lembrar que as técnicas não são AIKI; AIKI trabalha através das técnicas).

Uma vez que essas harmonizações são alcançadas – não com muita facilidade – é necessário nos colocarmos em sintonia com a natureza, naturalmente nos ajustando as suas mudanças (por isso que os DOJOS no Japão nunca estão frios ou quentes demais para se treinar). Eventualmente nós imperceptivelmente nos fundimos com o universo, incorporando seu dinamismo ao nosso próprio, esse processo completo é KIMUSSUBI (unificar os KI para promover a vida).

O AIKI unifica o corpo e a mente, nosso Eu com os demais, matéria e espírito, o homem e o universo. Em seus últimos anos o Fundador sugeriu que AI (harmonia) deveria ser vista como AI (amor), já que o amor é a forma mais elevada da harmonia que nutri todas as coisas e as conduz para a realização: O amor é a divindade guardiã de todos os seres; sem o amor nada pode florescer. O caminho do AIKI é uma expressão do amor…o amor não odeia, ao amor não existe nada para se opor. O amor é a essência de Deus.”

KAMI SAMA (Deus) foi a frase que o Fundador usou para representar o mais elevado nível, o absoluto, o espírito universal de amor e harmonia. HITO, palavra japonesa para ser humano, é composta do símbolo HI (centelha divina) parada temporariamente nesse vaso ao qual chamamos nosso corpo. O KA de KAMI, e HI de HITO são o mesmo símbolo – se não há KAMI não há HITO e vice-versa. Por isso que o Fundador insistia que “o ser humano é filho de Deus e um santuário vivo do divino.”

AIKI O KAMI (O grande espírito do AIKI) é o símbolo supremo dos ideais que o Fundador mais estimava. Através da prática devota das técnicas do AIKIDO – funções do divino – é possível avançarmos para esse elevado estado. De fato podemos nos tornar um KAMI, um ser humano perfeito. Um KAMI não é uma criatura sobrenatural, mas sim alguém que descobriu sua verdadeira natureza – nada mais que o universo em si – através de seu constante esforço. “O AIKIDO é o caminho de Deus estabelecendo a força do AIKI e edificando a força da atividade divina.”

A força da atividade divina é nenhuma outra senão TAKEMUSSU AIKI. Antigamente TAKE significava “lei da selva”: “Se eu não o matar, ele provavelmente o fará.” Tal atitude é contrária à sobrevivência da humanidade e o Fundador compreendeu que TAKE não significava destruição e morte, mas sim vida e luz. A força e determinação do guerreiro devem ser canalizadas para um propósito elevado: O restabelecimento da harmonia, a preservação da paz e a proteção de todos os seres.

Shirata Sensei acredita que o Fundador foi uma espécie de mensageiro divino, que esteve aqui para prevenir a nós, imprudentes seres humanos da inutilidade do empreendimento da guerra e da matança uns dos outros. “AIKI” não é uma arte para derrotar os outros, mas sim para a unificação do mundo e para reunir todas as raças em uma grande família.”

Sobretudo o AIKIDO é MISSOGI, o grande caminho de purificação. Já que estamos dotados de vida somos divinos, porém devido a pensamentos inferiores e imperfeições, nossa verdadeira natureza está obscurecida. Em vez de utilizarmos a água para purificar nossas impurezas, nós utilizamos as incorruptas técnicas do AIKIDO, sendo que cada corte de espada, cada estocada do bastão e cada movimento do corpo é um ato de expulsar o mal, limpando o coração.

MISSOGI é o processo de conduzir para fora do corpo a maldade, livrando-o de corrupções e polindo o espírito. Conforme as camadas de sujeira e corrupção são retiradas, nossa imaculada luz interior brilha com maior intensidade.

O legado espiritual do Fundador – como viver em harmonia divina com o mundo e todos os seus habitantes, cheio de uma força indomável e de um criativo amor – deve ser buscado através do treinamento sincero do AIKIDO.

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A PRÁTICA SOLITÁRIA

Por Tsuda Itsuo (traduzido do Francês por Luiz Carlos Cintra).

(Itsuo Tsuda nasceu no Japão em 1914, viveu e estudou na França entre 1934 e 1940 e ao retornar ao Japão estudou recitação Nô com o Mestre Hosada, Seitai com o Mestre Noguchi e Aikido com o Mestre Ueshiba. A partir de 1970 voltou a viver e a ensinar na Europa).

Não pratico mais o Aikido tal como ele é definido no Ocidente. Contudo, não paro de tentar compreender o que Mestre Ueshiba queria dizer com esse nome.

Eu me explico. No começo de minha permanência na Europa, seguia meu caminho sem me colocar questões demais, mas muitas vezes terminava envolvido em “diálogos de surdos”. Isso me fez refletir. Terminei por compreender que os ocidentais não procuram a mesma coisa que eu procuro. Somos, portanto, diferentemente orientados, de uma parte e de outra.

Para eles é a procura do poder. Para mim, uma procura pessoal interior. Isso lhes deu a oportunidade de me criticarem como sendo egoísta ou fraco. Para mim tanto faz. Eles têm sua razão e eu tenho a minha. Eu os deixei e continuo meu pequeno bom caminho. Quero evitar sobretudo que eles venham com um espírito contrário, porque ao final de algum tempo eles podem me acusar de lhes “derrubar a casa”.

Mestre Ueshiba não parava de repetir que o Aikido não é um esporte, nem uma arte de combate. Mas hoje ele é considerado em todo lugar como um esporte de combate. De onde vem essa diferença de concepção tão flagrante?

Para melhor visualizar a situação, comparo as três noções: esporte, artes marciais e Aikido, e tento ressaltar a diferença fundamental.

O esporte já sabemos o que é. É um exercício dos músculos voluntários. As crianças são bastante agitadas, mas elas não são capazes de praticar um esporte, porque ainda não têm o controle suficiente de seus músculos voluntários. O esporte começa a se aproximar na adolescência, quando se submetem às regras do jogo e organizam-se as competições a fim de manter o interesse no jogo. É uma boa maneira de consumir energia quando os hormônios aumentam. A competição nos incita a obter a vitória, mas ela não visa a destruição ou o aniquilamento do adversário.

É completamente diferente quando se trata de artes marciais. As circunstâncias que as fizeram nascer foram muito particulares: a sociedade feudal do Japão.

No momento em que a Europa, libertando-se da Idade Média, adquiria uma nova face com a Renascença, o Japão estava sendo agitado por guerras internas. Os guerreiros, surgindo de todas as partes, revoltavam-se contra o antigo regime de senhores, submetidos ao poder central de Kyoto, sob o shogunato Ashikaga. Como vemos no filme de Kurosawa, Kagemusha, os poderosos senhores Takeda, Uesugi, Oda e outros, guerreavam nas províncias.
Naquela época, a vitória era obtida por alguns condutores de homens bem decididos a combater. Um exemplo: em 1560, Oda Nobunaga atacou Imagawa Yoshimoto, que contava com 25.000 homens. Nobunaga, com apenas 26 anos na época, tomou a decisão – recitou e dançou uma passagem da peça “Atsumori”, do teatro Nô: “A vida humana não dura mais que cinquenta anos. Comparada à eternidade é não mais que um sonho efêmero. Uma vez nascido, quem pode evitar a desaparição para sempre?”

Oda Nobunaga

Foi um belo convite à morte. A morte e a dor são como os cachorros que perseguem aqueles que tentam fugir. Uma vez enfrentados, cessam de provocar medo. Na pressa, ele comeu um bolinho de arroz, de pé, e sem esperar que seu exército estivesse pronto e atacou montado em seu cavalo, seguido por apenas cinco cavaleiros. Foi alcançado a meio caminho, por apenas dois mil homens. Quando terminou a tempestade que caía sobre a região onde estava acampado o exército de Yoshimoto, mais de doze vezes superior em número, este estava dizimado e seu adversário Yoshimoto, decapitado.

As armas de fogo, trazidas por uma tripulação portuguesa naufragada em 1543 na ilha de Tanegashima, no sul do Japão, produziram uma importante mudança na profissão das armas.

A batalha de Nagashino em 1575 foi decisiva como marco desse ponto de inflexão na arte da guerra. Os valentes cavaleiros de Takeda, portanto pesadas armaduras, tentaram em vão assaltos suicidas contra os simples soldados de infantaria de Nobunaga, que atiravam com três mil fuzis, à vontade, bem protegidos atrás das árvores.

Foi no século XVI que vimos aparecer alguns nomes de mestres da espada. Desses mestres conservamos alguns escritos, concernentes não a suas técnicas, mas ao estado de ânimo ao qual chegaram após toda uma vida de busca.

É difícil explicar aos ocidentais que podem existir certas relações entre a profissão das armas e um estado de espírito, um físico e o outro psíquico. Mas não é impossível.

Contaram-me o caso de um acrobata experimentado, a quem foi perguntado como fazia para evitar acidentes graves. Ele respondeu: “Quando erro o salto, eu me jogo como um velho chinelo usado”.

Eis o segredo. É fácil de entender mas quanto a colocar em prática é a coisa mais difícil de fazer, porque as pessoas se tensionam automaticamente por causa do medo.

A contração involuntária se reforça à medida que a imaginação se enche de medo. O medo não fica só na cabeça. Ele paralisa todo o corpo. Sobretudo os punhos, que perdem a flexibilidade e os braços perdem a sensibilidade. Foi o que aconteceu com dois samurais que se batiam em um duelo, cuja história li em algum lugar. Eles seguravam a espada com as duas mãos e se enfrentavam, a vários metros de distância um do outro. Nessa distância, eles ainda estavam fora de perigo, não importa o que fizessem, mas seus rostos já estavam pálidos. Provavelmente eles estavam banhados em um suor frio. Eles permaneceram lá, à mesma distância, por um certo tempo. Finalmente, após se baterem, um jazia por terra e o outro estava de pé. O combate havia terminado. Mas o vencedor permanecia lá, incapaz de largar sua espada, porque os dedos estavam crispados no cabo da arma. A contração era tal que lhe era difícil soltá-los.

Curiosamente, esse estado de pânico pode acontecer mesmo com um gesto tão anódino como o yuki, ou seja, ao se colocar simplesmente as mãos sobre alguém e expirar através delas. É uma coisa tão singela como a carícia, com a única diferença de que as mãos ficam imóveis. Muitas pessoas relataram, nessa situação, sua incapacidade de sentir os braços e as mãos, transformados em bastões e em espátulas de madeira. Basta um pequeno nada para provocar esse pânico: a tomada de consciência numa cerimônia religiosa em grupo ou um gesto de uma benzedeira. Com mais razão ainda, ao se ter o corte de uma lâmina afiada sob o nariz, à espera do momento de nos aniquilar.

Voltando aos mestres que nos deixaram seus escritos, devemos citar o nome de Kamiizumi Isenokami, morto em 1573.

Kamiizumi Isenokami

O coração que não se destrói, diz ele, mesmo queimado nas chamas, esmagado sob uma rocha, esse verdadeiro coração é o mestre em quem confio”.

A palavra kokoro, que traduzi por “coração”, é etimologicamente idêntica a este último: o órgão central do aparelho circulatório. Contudo, a acepção é totalmente diferente. “Coração” em português é sobretudo o sentimento, enquanto que kokoro em japonês é não tão-somente o sentimento, ou o espírito, ou o pensamento. É algo que sentimos no interior de nós mesmos, que se aproxima mais da palavra mind em inglês. Se a traduzirmos por mental ou psíquico, ainda será diferente.

A busca de um kokoro que permaneça imperturbável frente a um perigo iminente, que permaneça calmo em qualquer circunstância, esse é o objetivo principal que se impõe àqueles que tentam chegar à perfeição, na profissão das armas.

Como dominar o medo da morte, que nos paralisa e nos impede de manifestar plenamente nossas faculdades naturais? Essa questão começou a tomar importância à medida que se operava a transformação na arte do combate, no correr do século XVI.

Durante os períodos difíceis, eram recrutadas pessoas que não tinham formação especial para serem militares e que não tinham tempo para serem treinadas. Só sobreviviam os mais fortes ou os que tinham mais sorte. Mas percebeu-se aos poucos que aqueles que possuíam um treinamento especial para o manejo das armas tinham menor probabilidade de esgotar-se ou de perder o fôlego durante os combates, e portanto maiores chances de sobreviver. Frente a superioridade demonstrada pelas armas de fogo, renunciou-se às pesadas armaduras para adotar vestimentas mais leves, que permitiam maior mobilidade. Diversas escolas, Ryu, foram fundadas a partir dessa época, por aqueles que obtiveram um nível fora do comum no manejo da espada, da lança ou de outras armas.

A unificação política do Japão, realizada pelos esforços de três heróis históricos, Nobunaga, Toyotomi Hideyoshi e Tokugawa Ieyasu, teve por resultado a formação de uma classe privilegiada e hereditária de guerreiros: os samurais. Hideyoshi recorreu a tudo para definir a separação de classes, confiscando as armas brancas dos camponeses, mantidas em segredo, que lhes permitiam fomentar suas revoltas. Essa situação tornou-se definitiva a partir do século XVII, com o advento do shogunato Tokugawa. O primeiro shogun, Ieyasu, era um tipo de gênio da organização. Quatro classes, samurais, camponeses, artesãos e comerciantes, foram instituídas nessa época, por ordem honorífica decrescente, um pouco como as castas na Índia e foram mantidas até a restauração Meiji, em 1867. Os guerreiros deixaram de ser camponeses e se tornaram citadinos, a serviço de seu respectivo senhor. O treinamento em artes marciais tornou-se um imperativo de sua profissão.

Um detalhe importante de sua vestimenta: o samurai portava duas espadas, cujas bainhas ficavam atadas firmemente entre a cintura e o lado esquerdo do quadril: uma era longa, para combater e causar a morte aos outros, e a outra curta, wakizashi, para matar a si próprio.

O samurai estava portanto, perpetuamente, acompanhado pela morte, voltada para o exterior e também voltada para o interior, para si próprio. Ele devia estar pronto para cortar seu ventre a qualquer momento, a fim de evitar a desonra. Essa “honra” à moda japonesa era bastante diferente do honor espanhol e também da “honra” social francesa.

Imaginemos um pouco a presença desses seres, vivendo constantemente na consciência da morte. É verdade que as relações entre eles eram bem regulamentadas, com cortesia. Mas isso não impedia que chegassem a se bater até a morte, por razões diversas. Não podiam recuar frente a um desafio, sem se desonrar. Não podiam desistir em uma luta, como num esporte. A possibilidade de ser emboscado não estava excluída, mesmo durante a escuridão completa. Uma fração de segundo de hesitação podia ser fatal. A tensão em que estavam obrigados a viver não poderia ser imaginada nos dias de hoje.

É claro que existe também a tensão nos esportes, como em todas as atividades humanas. Quando há arbitragem e penalidades, regras e terreno designado, o risco não é total. Mesmo que sejamos batidos, com uma pontuação medíocre, não estaremos morto.

Os feitos de Miyamoto Musashi, que morreu em 1645 aos 62 anos, são bastante conhecidos no Japão, através de escritos e de romances em que ele é o herói. Até a idade de 30 anos, ele enfrentou mais de sessenta combates reais, sozinho contra um ou mais adversários, até mesmo contra dezenas deles, e saiu sempre vivo. Se o avaliamos pelos desenhos que deixou, de uma precisão extraordinária, sentimos que era realmente alguém especial.

Mesmo quando se sai vencedor de todos os combates em que a aposta é “tudo ou nada”, os problemas não estão todos resolvidos: a pessoa pode tornar-se presa das dúvidas.

Musashi, aos cinqüenta anos, colocou-se a questão de saber se suas vitórias não eram devidas ao fato de seus adversários serem mais fracos que ele, ou simplesmente de terem tido menos sorte. De qualquer maneira, ele não estava verdadeiramente convencido de si mesmo.

Harigaya Sekiun, que morreu em 1662 com a idade de mais de setenta anos, foi mais categórico. Após ter se atormentado por longo tempo pela incerteza que impera quando nos encontramos em uma situação extrema, quando o recurso a algum precedente não serve para nos justificar, concluiu: “Vencer os mais fracos, fazer-se bater pelos mais fortes e aniquilar-se mutuamente entre iguais, essas são as soluções possíveis”.

Mesmo que se obtenha a vitória golpe a golpe, isso não é mais que uma bestialidade, segundo ele. Não há mais nisso do que combates de lobos ou de tigres. Ficaremos sempre dentro da relatividade, da oposição. É necessário sair disso para encontrar o verdadeiro caminho.

Como sair da bestialidade para encontrar o verdadeiro caminho? Sobretudo em uma situação em que o resultado não se mede por pontos. A fórmula consagrada até então era o “ai-uchi”, a aniquilamento mútuo. Ao querer vencer o outro, tentando resguardar sua própria integridade, perde-se tudo, porque no último momento somos tomados pelo medo que nos paralisa. A fim de sair dessa dualidade que nos atormenta, decidimos morrer, abandonando tudo o que temos. “Quando tiveres minha pele, terei tua carne. Quando tiveres minha carne, terei teus ossos”, assim segue a fórmula de bravata. Permanecemos do mesmo modo na bestialidade.

Após longos anos de meditação, Sekiun encontrou sua fórmula ai-nuke, que é passar além mutuamente. A base dessa fórmula é a descoberta do kokoro, imutável, eterno, no qual não há aniquilamento do adversário, mas somente o respeito ao outro.

Esse ai-nuke mostra uma posição bastante próxima daquela do Aikido do Mestre Ueshiba. Se fazemos frente ao outro sem nenhuma agressividade, isso é ai-nuke, mas se guardamos a menor agressividade, isso é ai-uchi.

Mas como podemos nos esvaziar de toda agressividade quando nos encontramos justamente numa situação de agressividade onde arriscamos perder tudo?

Essa não-agressividade, se ela vem da parte não de um moralista ou de um pacifista religioso, mas de alguém que passou por 52 combates reais até chegar aos 50 anos de idade, pode ter um valor totalmente diferente.

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ENTREVISTA COM MORIHEI UESHIBA E KISSHOMARU UESHIBA

(Tradução: Stanley Pranin e Katsuaki Terasawa)

Esta entrevista, conduzida por dois jornalistas não identificados, apareceu no livro em japonês “Aikido” de Kisshomaru Ueshiba, Tóquio, Kowado, 1957, páginas 198-219.

Morihei Ueshiba (O-Sensei)

O verdadeiro Budo significa vencer a si mesmo e eliminar o coração combativo do inimigo”.

Jornalista: Quando eu era um estudante universitário, meu professor de filosofia nos mostrou um retrato de um filósofo famoso e agora, estou impressionado com a semelhança com você, Sensei.

O-Sensei: Entendo. Talvez eu devesse ter entrado no campo da filosofia ao invés das artes marciais. O meu lado espiritual é mais enfatizado do que o lado físico.

J: Diz-se que o Aikido é bem diferente do Karatê e do Judô.

O-Sensei: Em minha opinião, pode-se dizer que é a verdadeira arte marcial. A razão para isso é que é uma arte marcial baseada na verdade universal. Este Universo é composto de muitas partes diferentes e, ainda assim, o Universo como um todo está unido como uma família e simboliza o estado final de paz. Tendo essa visão do Universo, o Aikido não pode ser nada além de uma arte marcial de amor. Não pode ser uma arte marcial de violência. Por esta razão, pode-se dizer que o Aikido é uma outra manifestação do Criador do Universo. Em outras palavras, o Aikido é como um gigante (de natureza imensa).

Portanto, no Aikido, o Céu e a Terra tornam-se os campos de treinamento. O estado de espírito do aikidoísta deve ser pacífico e totalmente não violento. Quer dizer, aquele estado de espírito especial que leva a violência a um estado de harmonia e esse é o verdadeiro espírito das artes marciais japonesas. Recebemos esta terra, para nós transformarmos em um paraíso na terra. A atividade de guerra está totalmente fora do lugar.

J: É bem diferente das artes marciais tradicionais, então.

O-Sensei: Na verdade é bem diferente. Se olharmos para trás, veremos como as artes marciais foram mal utilizadas. Durante o período Sengoku (1428-1558 – Sengoku significa “país em guerra”), os senhores locais usavam as artes marciais como uma ferramenta de luta para servir aos seus próprios interesses particulares e para satisfazer a sua ganância. Isso eu considero totalmente inapropriado. Eu mesmo já ensinei artes marciais para serem usadas com o propósito de matar outros soldados durante a guerra e fiquei profundamente perturbado depois que o conflito terminou. Isso me motivou a descobrir o verdadeiro espírito do Aikido há sete anos, quando tive a ideia de construir um paraíso na terra. A razão para esta resolução foi que, embora o Céu e a Terra (ou seja, o universo físico) tenham alcançado um estado de perfeição e sejam relativamente estáveis em sua evolução, a humanidade (em particular, o povo japonês) parece estar em um estado de convulsão.

Em primeiro lugar, devemos mudar essa situação. A realização desta missão é o caminho para a evolução da humanidade universal. Quando cheguei a essa conclusão, percebi que o verdadeiro estado do Aikido é o amor e harmonia. Assim, o “Bu” (marcial) no Aikido é a expressão do amor. Eu estava estudando Aikido para servir ao meu país. Portanto, o espírito do Aikido só pode ser amor e harmonia. O Aikido nasceu de acordo com os princípios e funcionamento do Universo, portanto, é um Budo (arte marcial) de vitória absoluta.

J: Você falaria sobre os princípios do Aikido? O público em geral considera o Aikido algo místico, como o Ninjutsu, já que você, Sensei, derrubou oponentes enormes com a velocidade da luz e levantou objetos pesando várias centenas de libras.

O-Sensei: Parece apenas ser místico. No Aikido utilizamos completamente o poder do oponente. Portanto, quanto mais força o oponente usar, mais fácil será para você.

J: Então, nesse sentido, existe Aiki no Judô também, já que no Judô você se sincroniza com o ritmo do seu oponente. Se ele puxar, você empurra; se ele empurra, você puxa. Você o move de acordo com este princípio e o faz perder o equilíbrio e então aplica sua técnica.

O-Sensei: No Aikido não há absolutamente nenhum ataque. Atacar significa que o espírito já perdeu. Nós aderimos ao princípio da não resistência absoluta, ou seja, não nos opomos ao atacante. Portanto, não há oponente no Aikido. A vitória no Aikido é Masakatsu Agatsu (vitória correta, vitória própria); visto que você vence tudo de acordo com a missão do Céu, você possui força absoluta.

J: Isso significa Go no Sen? (Este termo se refere a uma resposta tardia a um ataque).

O-Sensei: Absolutamente não! Não é uma questão de Sensen no Sen ou Sen no Sen. Se eu tentasse verbalizar, diria que você controla seu oponente sem tentar controlá-lo. Ou seja, o estado de vitória contínua. Não se trata de ganhar ou perder para um oponente. Nesse sentido, não há oponente no Aikido. Mesmo se você tiver um oponente, ele se torna uma parte de você, um parceiro que você controla apenas.

J: Quantas técnicas existem no Aikido?

O-Sensei: Existem cerca de 3.000 técnicas básicas, e cada uma delas têm 16 variações. Portanto, existem muitos milhares. Dependendo da situação, você cria novas.

J: Quando você começou o estudo das artes marciais?

O-Sensei: Por volta dos 14 ou 15 anos. Primeiro eu aprendi Tenshinyo-ryu Jiujitsu com Tokusaburo Tozawa Sensei. Depois Kito-ryu, Yagyu-ryu, Aioi-ryu, Shinkage-ryu, todas estas formas de jujutsu. No entanto, pensei que poderia haver uma forma verdadeira de Budo em outro lugar. Experimentei Hozoin-ryu sojitsu e Kendo, mas todas essas artes estão preocupadas com formas de combate um-a-um e elas não me satisfaziam. Por isso visitei muitas partes do país em busca do Caminho e do treinamento, mas tudo em vão.

J: Esse é o treinamento ascético do guerreiro?

O-Sensei: Sim, a busca pelo verdadeiro Budo. Quando eu frequentava outras escolas, nunca desafiava o sensei do Dojo. Um indivíduo encarregado de um Dojo está sobrecarregado com muitas coisas, então é muito difícil para ele mostrar a sua verdadeira habilidade. Eu iria prestar-lhe os devidos respeitos e aprender com ele. Se eu me julgasse superior, voltaria a prestar-lhe meus respeitos e voltaria para casa.

J: Então você não aprendeu Aikido desde o início. Quando o Aikido surgiu?

O-Sensei: Como eu disse antes, fui a muitos lugares em busca do verdadeiro Budo. Então, quando eu tinha cerca de 30 anos, me instalei em Hokkaido. Em uma ocasião, enquanto estava hospedado em Hisada Inn, em Engaru, província de Kitami, conheci um certo Sokaku Takeda Sensei do clã Aizu. Ele ensinou Daito-ryu Jujutsu. Duranto os 30 dias em que aprendi com ele, senti uma espécie de inspiração. Mais tarde, convidei esse professor para minha casa e junto com 15 ou 16 de meus funcionários tornei-me um aluno em busca da essência do Budo.

J: Você descobriu o Aikido enquanto estava aprendendo Daito-ryu com Sokaku Takeda?

O-Sensei: Não. Seria mais correto dizer que Takeda Sensei abriu meus olhos para o Budo.

Sokaku Takeda

J: Então houve alguma circunstância especial envolvendo sua descoberta do Aikido?

O-Sensei: Sim. Aconteceu assim. Meu pai ficou gravemente doente em 1919. Pedi licença a Takeda Sensei e parti para minha casa. No caminho para casa, disseram-me que se alguém fosse a Ayabe, perto de Kyoto, e fizesse uma oração, qualquer doença seria curada. Então eu fui lá e conheci Onisaburo Deguchi. Depois, quando cheguei em casa, soube que meu pai já estava morto. Mesmo tendo conhecido Deguchi Sensei apenas uma vez, decidi me mudar para Ayabe com a minha família e acabei ficando até o final do período Taisho (por volta de 1925). Naquela época eu tinha cerca de 40 anos. Um dia eu estava me enxugando perto do poço. De repente, uma cascata de flashes dourados cegantes desceu do Céu envolvendo meu corpo. Então, imediatamente, meu corpo se tornou cada vez maior, atingindo o tamanho de todo o Universo. Embora oprimido por essa experiência, de repente percebi que não se deve pensar em tentar vencer. A forma do Budo deve ser amor. Deve-se viver em amor. Isso é Aikido e essa é a velha forma de postura no Kenjutsu. Depois dessa constatação, fiquei muito feliz e não consegui conter as lágrimas.

Onisaburo Deguchi

J: Então, no Budo não é bom ser forte. Desde os tempos antigos, a unificação do “Ken” e “Zen” era ensinada. Na verdade, a essência do Budo não pode ser entendida sem esvaziar sua mente. Nesse estado, nem o certo nem o errado têm significado.

O-Sensei: Como eu disse anteriormente, a essência do Budo é o Caminho do Masakatsu Agatsu.

J: Eu ouvi uma história sobre como você se envolveu em uma briga com cerca de 150 trabalhadores.

O-Sensei: Pelo que me lembro, Deguchi Sensei foi para a Mongólia em 1924 a fim de cumprir seu objetivo de uma comunidade asiática maior em linha com a política nacional. Acompanhei-o a seu pedido, embora me tenham pedido para entrar no exército. Viajamos pela Mongólia e pela Manchúria. Enquanto estávamos no último país, encontramos um grupo de bandido montados e houve um grande tiroteio. Eu devolvi o fogo com um mauser e então comecei a correr para o meio dos bandidos, atacando-os ferozmente, e eles se dispersaram. Consegui escapar do perigo.

J: Eu entendo, Sensei, que você tem muitas conexões com a Manchúria. Você passou muito tempo lá?

O-Sensei: Desde aquele incidente, tenho estado na Manchúria com bastante frequência. Fui consultor de artes marciais para a organização Shimbuden e também para a Universidade Kenkoku na Mongólia. Por isso sou bem recebido por lá.

J: Ashihei Hino escreveu uma história chamada “Oja na Za” em Shosetsu Shincho, na qual ele discute o período da juventude de Tenryu Saburo, rebelde do mundo do Sumô, e seu encontro com a arte marcial do Aikido e seu verdadeiro espírito. Você se envolveu nisso, Sensei?

O-Sensei: Sim.

J: Então, isso significa que você esteve associado ao Tenryu por algum período?

O-Sensei: Sim. Ele ficou em minha casa por cerca de três meses.

J: Isso foi na Manchúria?

O-Sensei: Sim. Eu o conheci quando estávamos circulando após uma celebração do 10º aniversário do estabelecimento do governo da Manchúria. Havia um homem bonito na festa e muitas pessoas o provocando com comentários como: “Este Sensei tem uma força tremenda. Que tal se testar contra ele?”

Perguntei a alguém ao meu lado quem era essa pessoa e foi-me explicado que ele era o famoso Tenryu, que havia se retirado da Associação de Lutadores de Sumô. Fui então apresentado a ele e finalmente acabamos medindo nossas forças, um contro o outro. Sentei-me e disse a Tenryu: “Por favor, tente me empurrar. Empurre com força, não há necessidade de se conter.”

Já que eu conhecia o segredo do Aikido, não podia ser movido um centímetro. Até Tenryu pareceu surpreso com isso. Como resultado dessa experiência, ele se tornou um estudante de Aikido. Ele era um bom homem.

J: Sensei, você também se associou à Marinha?

O-Sensei: Sim, por um bom tempo. Começando por volta de 1927 ou 28, por um período de cerca de 10 anos, fui professor em tempo parcial na Academia Naval.

J: Você instruiu soldados na época em que ensinava na Academia Naval?

O-Sensei: Tenho ensinado com bastante frequência para os militares, começando com a Academia Naval por volta de 1927-28. Por volta de 1932 ou 1933, comecei uma aula de artes marciais na Toyama School para o exército. Então, em 1941-42, ensinei Aikido a alunos da Academia de Polícia Militar. Além disso, em uma ocasião, dei uma exibição de Aikido a convite do General Toshie Maeda, Superintendente da Academia do Exército.

J: Desde que você estava envolvido no ensino de soldados, deve ter havido muitos episódios com tipos rudes.

O-Sensei: Sim. Eu até fui emboscado uma vez.

J: Foi porque eles o consideraram um professor autoritário?

O-Sensei: Não, não foi isso. Foi para testar a minha força. Foi no tempo que comecei a ensinar Aikido para a Polícia Militar. Uma noite, enquanto caminhava pelo campo de treinamento, senti algo estranho acontecendo. Eu senti que algo estava acontecendo. De repente, de todas as direções, por trás dos arbustos e depressões, muitos soldados apareceram e me cercaram. Eles começaram a me atacar com espadas e rifles de madeira. Mas como eu estava acostumado a esse tipo de coisa, não me importei em nada. Enquanto eles tentavam me atingir, girei meu corpo para um lado e para o outro e eles caíram facilmente enquanto eu golpeava. Finalmente, todos eles ficaram exaustos. De qualquer forma, o mundo está cheio de surpresas. Outro dia conheci um dos homens que me atacou. O ex-aluno da Polícia Militar é assessor na Prefeitura de Wakayama. Durante uma reunião recente, um indivíduo reconheceu meu rosto e veio até mim sorrindo. Depois de conversarmos por alguns minutos, descobri que ele foi um dos homens que em atacou naquele dia, muitos anos atrás. Enquanto coçava a cabeça, ele me contou o seguinte:”Lamento muito por esse incidente. Naquela dia estávamos conversando sobre o novo professor de Aikido e se ele era realmente forte ou não. Um grupo, do tipo de policiais militares de sangue quente, estava discutindo o assunto e decidiu testar o novo professor. Cerca de 30 homens aguardaram. Ficamos completamente surpresos de que nós, 30 homens auto confiantes, nada pudemos fazer contra a sua força.”

J: Houve algum episódio enquanto você estava na Escola Toyama?

O-Sensei: Competições de força? Um incidente ocorreu, creio eu, antes do episódio com a Polícia Militar. Vários capitães que eram instrutores na Escola de Toyama me convidaram para testar minha força contra a deles. Todos eles se orgulhavam de suas habilidades, dizendo coisas como: “Eu fui capaz de levantar tal e tal peso” ou “ Eu quebrei uma tora com tantos centímetros de diâmetro”.

Eu expliquei a eles: “Eu não tenho força como a sua, mas posso controlar pessoas como você só com o meu dedo mindinho. Eu lamentaria por você se eu o jogasse, então vamos fazer isso em vez disso.” Assim, eu estendi o meu braço direito e descansei a ponta do meu dedo indicador na ponta de uma escrivaninha e os convidei a deitarem sobre o meu braço com os seus abdómen. Um, dois, depois três policiais sozinhos sobre o meu braço, e nessa altura todos ficaram com os olhos arregalados. Continuei até que seis homens se deitaram sobre o meu braço e então pedi um copo de água ao oficial que estava perto de mim. Enquanto eu bebia a água com a mão esquerda, todos ficaram quietos e trocando olhares.

J: Além do Aikido, você deve ter uma força física tremenda.

O-Sensei: Na verdade, não.

Kisshomaru Ueshiba: Claro que ele possui força, mas deve ser descrito como o poder do Ki, ao invés de força física. Há algum tempo, quando fomos para um novo assentamento no país, vimos sete ou oito trabalhadores tentando em vão levantar um enorme toco de árvore. Meu pai ficou olhando para ele por um tempo e então pediu que eles se afastassem para que ele pudesse tentar. Ele ergueu o coto facilmente e prontamente o levou embora. É totalmente inconcebível fazer tal coisa com mera força física. Também houve um incidente envolvendo um certo Mihamahiro.

J: Ele era o mesmo Mihamahiro da Takasago Beya Sumo Wrestling Association?

O-Sensei: Sim. Ele era da província de Kishu. Quando eu estava hospedado no Shingu em Wakayama, Mihamahiro estava indo bem nas fileiras do Sumô. Ele tinha uma força tremenda e podia levantar três dormentes que pesavam várias centenas de libras. Quando soube que Mihamahiro estava hospedado na cidade, convidei-o para vir, Enquanto conversávamos, Mihamahiro disse: “Também ouvi dizer que você, Sensei, possui uma grande força. Por que não testamos nossa força?”

“Tudo bem. Eu posso te prender apenas com o meu dedo indicador” eu respondi. Então eu o deixei me empurrar enquanto eu estava sentado. Este sujeito capaz de levantar pesos enormes bufou e bufou, mas não conseguiu me empurrar. Depois disso, redirecionei seu poder para longe de mim e ele passou voando. Quando ele caiu, prendi-o com o meu dedo indicador e ele permaneceu totalmente imobilizado. Era como um adulto prendendo um bebê.

Então sugeri que ele tentasse novamente e deixei que ele empurrasse a minha testa. No entanto ele não conseguia me mover. Então eu estendi minhas pernas para frente e, me equilibrando, levantei minhas pernas do chão e o fiz me empurrar. Mesmo assim, ele não conseguiu me mover. Ele ficou surpreso e começou a estudar Aikido.

J: Quando você diz que imobiliza uma pessoa com um dedo, você empurra um ponto vital?

O-Sensei: Eu desenho um círculo ao redor da pessoa. Seu poder está contido dentro desse círculo. Não importa o quão forte seja um homem, ele não pode estender seu poder fora desse círculo. Ele se torna impotente. Portanto, se você imobilizar seu oponente enquanto estiver fora do círculo dele, poderá segurá-lo com o dedo indicador ou o dedo mínimo. Isso é possível porque o oponente já se tornou impotente.

J: Mais uma vez é uma questão de física. Também no Judô, quando você arremessa ou imobiliza um oponente, você se coloca na mesma posição. No Judô, você se move de várias maneiras e tenta colocar seu oponente nessa posição.

J: Sua esposa também é da província de Wakayama?

O-Sensei: Sim. Seu nome de solteira em Wakayama era Takeda.

J: O sobrenome Takeda está intimamente associado às artes marciais.

O-Sensei: Você pode dizer isso. Minha família é leal à Casa Imperial há muitas gerações e temos sido de todo o coração em nosso apoio. Na verdade, meus ancestrais desistiram de propriedades e fortuna e se mudaram para servir à Família Imperial.

J: Já que você também, Sensei, tem se mudado continuamente desde que era jovem, deve ter sido muito difícil para sua esposa.

O-Sensei: Como estava muito ocupada e ficava em casa, não tinha muito tempo de lazer.

Kisshomaru Ueshiba: Como a família do meu pai era bastante abastada, ele foi capaz de se dedicar ao treinamento ascético nas artes marciais. E outra coisa, uma das características do meu pai é que ele se preocupa pouco com dinheiro. O seguinte incidente ocorreu em uma ocasião. Quando meu pai se estabeleceu em Tóquio em 1926, sua segunda visita à capital, ele veio primeiro sozinho e depois foi seguido pela família, que veio de Tanabe em 1927.

O lugar onde todos nós nos instalamos foi em Sarumachi. Shibashirogane em Tóquio. Alugamos aquele lugar com a ajuda do Sr. Kiyoshi Yamamoto, filho do General Gambei Yamamoto. Naquela época, meu pai possuía uma grande quantidade de propriedades ao redor de Tanabe, incluindo campos cultivados e não cultivados e terreno montanhoso. No entanto, ele tinha pouco dinheiro.

Ele teve que pedir dinheiro emprestado para sobreviver. Apesar disso, nunca lhe ocorreu vender qualquer terrreno. Não só isso, quando seus alunos trouxeram ofertas mensais, ele respondia: “Eu não quero esse tipo de coisa”. Ele disse a eles para oferecê-lo ao Kamisama (divindade) e nunca aceitou dinheiro diretamente. E quando precisava de dinheiro, ele se apresentava humildemente em frente ao altar do Kamisama e recebia presentes da divindade. Nunca pensamos em cobrar dinheiro pelo Budo. O salão de treinamento naquela época era a sala de bilhar da mansão do conde Shimazu. Muitos dignitários, incluindo oficiais militares como o almirante Isamu Takeshita, bem como muitos aristocratas, vieram praticar. O nome que usamos foi Aikijujutsu ou Ueshiba-ryu Aikijutsu.

J: Qual é a melhor idade para começar o treinamento do Aikido?

Kisshomaru Ueshiba: Você pode começar a treinar por volta dos 7 ou 8 anos, mas o ideal é que o treinamento sério comece por volta dos 15 ou 16. Fisicamente falando, a estrutura do corpo se torna mais resistente e os ossos um pouco mais fortes nessa idade. Além disso, o Aikido contém muitos aspectos espirituais (é claro, o mesmo acontece com outras formas de Budo), então nessa idade a pessoa começa a adquirir uma perspectiva do mundo e da natureza do Budo. Portanto, no geral, eu diria que 15 ou 16 anos é uma boa idade para começar o estudo do Aikido.

J: Comparando com o Judô, há muito poucas ocasiões em que alguém luta com seu oponente no Aikido. Portanto, não é necessária muita força física no Aikido. Além disso, você pode lidar não apenas com um, mas com muitos oponentes ao mesmo tempo e isso é realmente ideal como Budo. Nesse sentido, também existem muitos tipos de brigões que vêm estudar Aikido?

Kisshomaru Ueshiba: Claro, esse tipo de indivíduo também se inscreve. Mas quando esse tipo de pessoa estuda Aikido com a intenção de usá-lo como ferramenta de luta, ele não dura muito. Budo não é como dançar ou assistir a um filme. Faça chuva ou faça sol, você deve praticar em todos os momentos de sua vida diária para progredir. Em particular, o Aikido é como um treinamento espiritual praticado usando a forma de Budo. Nunca pode ser cultivado como uma ferramenta por aqueles que o usariam para lutar. Além disso, os indivíduos inclinados à violência param de se comportar dessa maneira quando aprendem Aikido.

J: Entendo. Por meio de treinamento constante, eles param de se comportar como brigões.

O-Sensei: Já que o Aikido não é um Bu (método marcial) de violência, mas sim uma arte marcial de amor, você não se comporta violentamente. Você converte o oponente violento de uma maneira gentil. Eles não podem mais se comportar como brigões.

J: Entendo. Não é controlar a violência com violência, mas transformar a violência em amor.

J: O que você ensina primeiro como os fundamentos do Aikido? No Judô aprende-se ukemi (quedas).

Kisshomaru Ueshiba: Primeiro, movimentos corporais (Taisabaki), depois o fluxo de Ki.

J: O que é fluxo de Ki?

Kisshomaru Ueshiba: No Aikido, treinamos constantemente para controlar o Ki do nosso parceiro livremente através do movimento do nosso próprio Ki, atraindo o parceiro para o nosso próprio movimento. A seguir, praticamos como girar nossos corpos. Você move não apenas o corpo, mas também os braços e as pernas juntos. Então, todo o corpo se torna unificado e se move suavemente.

Morihei Ueshiba e Kisshomaru Ueshiba

J: Observando a prática do Aikido, os alunos parecem cair naturalmente. Que tipo de prática você faz para o ukemi?

Kisshomaru Ueshiba: Diferente do Judô, onde você luta com o seu oponente, no Aikido você quase sempre mantém alguma distância. Consequentemente, um tipo mais livre de ukemi é possível. Em vez de cair com um baque surdo como no Judô, fazemos quedas circulares, uma forma mais natural de ukemi. Portanto, praticamos esses quatro elementos com bastante diligência.

J: Então você pratica Tai no Sabaki (movimentos do corpo), Ki no Nagare (fluxo do Ki), Tai no Tenkan Ho (giro do corpo), Ukemi e, em seguida, começa a prática das técnicas. Que tipo de técnica você ensina primeiro?

Kisshomaru Ueshiba: Shihonage. Uma técnica para lançar um oponente em várias direções diferentes. Isso é feito da mesma maneira que a técnica da espada. Claro, usamos bokken (espadas de madeira) também. Como eu disse antes, no Aikido até o inimigo se torna uma parte do seu movimento. Posso mover o inimigo livremente à vontade. Segue-se naturalmente que, quando você pratica com todos os meios disponíveis, como um bastão ou uma espada de madeira, ele se torna uma parte de você tanto quanto um braço ou uma perna. Portanto, no Aikido, o que você está segurando deixa de se tornar um mero objeto. Torna-se uma extensão do seu próprio corpo.

O próximo é Iriminage. Nessa técnica você entra no momento em que seu oponente tenta golpeá-lo e, nesse momento, dois ou três atemi (golpes) são feitos. Por exemplo, o oponente golpeia o lado de seu rosto com o punho ou a lâmina da mão (tegatana). Usando a força de seu oponente, você abre seu corpo para a parte traseira esquerda enquanto conduz a mão direita do oponente com as duas mãos estendidas, continuando a direção de seu movimento. Então, segurando a mão de seu oponente, você o move em um movimento circular ao redor de sua cabeça. Ele então cai com a mão em volta da cabeça. Esse também é o fluxo do Ki. Existem várias teorias sofisticadas sobre esse ponto. O oponente fica totalmente impotente, ou melhor, o poder do oponente é conduzido na direção que você deseja levá-lo. Portanto, quanto mais poder o oponente tiver, mais fácil será para você. Por outro lado, se você chocar com o poder do seu oponente, você nunca pode esperar vencer uma pessoa muito forte.

O-Sensei: Além disso, no Aikido você nunca vai contra o poder do atacante. Quando ele ataca você golpeando ou cortando com uma espada, há essencialmente uma linha ou um ponto. Tudo que você precisa fazer é evitar isso.

Kisshomaru Ueshiba: Em seguida, fazemos as seguintes técnicas:Ikkyo sentando no ataque de Shomenuchi, Nikyo, depois técnicas de articulação e técnicas de imobilização e assim por diante.

J: O Aikido contém muitos elementos espirituais. Quanto tempo levaria para adquirir uma compreensão básica do Aikido desde o início?

Kisshomaru Ueshiba: Como existem pessoas coordenadas e descoordenadas, não posso fazer nenhuma afirmação geral, mas quando uma pessoa pratica por cerca de três meses, ela passa a ter algum entendimento do que é o Aikido. E quem já completou três meses de prática vai treinar por seis meses. Se você praticar por mais de seis meses, poderá continuar por tempo indefinido. Aqueles que têm apenas um interesse superficial irão desistir antes de três meses.

J: Compreendo. Haverá um exame de shodan no dia 28 deste mês. Quantos faixas-pretas existem atualmente?

Kisshomaru Ueshiba: A classificação mais alta é o 8º grau, e há quatro deles. Existem seis titulares de faixa-preta de 7º grau. E os detentores de primeiro grau são bastante numerosos, mas é claro que este número inclui apenas aqueles que contactaram o Hombu Dojo após a guerra.

J: Eu entendo que há um número considerável de pessoas aprendendo Aikido em países estrangeiros também.

Kisshomaru Ueshiba: O Sr. Tohei visitou o Habaí e os EUA com o objetivo de ensinar Aikido. O lugar mais popular para o Aikido é o Havaí, onde há 1.200 ou 1.300 praticantes. Este número para o Havaí seria equivalente a 70.000 ou 80.000 aikidoístas em Tóquio. Também existem alguns detentores de faixas-pretas na França. Há um francês que começou a estudar Aikido depois de se machucar praticando Judô. Ele queria experimentar o espírito do Aikido, mas não foi capaz de fazer isso na França. Ele sentiu que para buscar o verdadeiro espírito do Aikido, ele tinha que ir ao local de nascimento da arte. Ele explicou que foi por isso que veio ao Japão. O embaixador do Panamá também está estudando Aikido, mas parece que o clima no Japão é muito frio para ele e ele não pratica no inverno. Além disso, há uma senhora chamada Onoda Haru que foi a Roma para estudar escultura. Ela tem vindo ao Dojo desde o tempo em que era estudante na Escola de Belas Artes de Tóquio. Recentemente recebi uma carte dela onde ela diz que conheceu por acaso um italiano que pratica Aikido e que ele a tratou muito bem.

Kisshomaru Ueshiba, Morihei Ueshiba e Koichi Tohei

J: E com relação à interpretação das técnicas de Aikido?

O-Sensei: Os pontos essenciais se tornam Masakatsu, Agatsu e Katsuhayabi. Como eu disse anteriormente, Masakatsu significa “vitória correta”, Agatsu significa “vencer de acordo com a missão celestial dada a você” e Katsuhayabi significa “o estado de espírito de vitória rápida”.

J: O Caminho é longo, não é?

O-Sensei: O Caminho Aiki é infinito. Eu tenho 76 anos agora, mas ainda estou continuando minha busca. Não é tarefa fácil dominar o Caminho no Budo ou nas artes. No Aikido, você deve compreender todos os fenômenos do Universo. Por exemplo, a rotação da Terra e o sistema mais complexo e de longo alcance do Universo. É um treinamento para toda a vida.

J: Então, Aiki são os ensinamentos do Kami, assim como o caminho marcial. Então, qual é o espírito do Aikido?

O-Sensei: Aikido é Ai (amor). Você faz deste grande amor do Universo o seu coração, e então você deve fazer de sua própria missão a proteção e o amor de todas as coisa. Para cumprir esta missão, deve haver o verdadeiro Budo. O verdadeiro Budo significa vencer a si mesmo e eliminar o coração combativo do inimigo. É um caminho para a auto perfeição absoluta em que o próprio inimigo é eliminado. A técnica do Aiki é o treinamento ascético e um meio pelo qual você atinge um estado de unificação do corpo e do espírito pela realização dos princípios celestiais.

J: Então Aiki é o caminho para a paz mundial?

O-Sensei: O objetivo final do Aiki é a criação do paraíso na Terra. Em qualquer caso, o mundo inteiro deve estar em harmonia. Então, não precisamos de bombas atômicas e de hidrogênio. Pode ser um mundo confortável e agradável.

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COMO EXIBIR UM KATANA

Independentemente de quão ativo você é nas artes marciais, sua katana provavelmente passará a maior parte do tempo em exibição – e tudo bem quanto a isso. Uma katana de alta qualidade serve como um ponto focal, provocando a conversa de qualquer um que a veja. Mas há algumas coisas que você deve saber sobre a exibição de uma katana.

O KATANAKAKE

Existem dezenas de vitrines e diferentes estandes nos quais você pode colocar sua katana. Um dos mais populares, no entanto, é o katanakake. O katanakake é essencialmente um suporte de madeira com pares de ganchos que é projetado para segurar uma ou duas espadas. No Japão feudal, os guerreiros samurais colocavam suas espadas no katanakake antes de entrar nos edifícios, embora esse tipo de katanakake apresentasse um design ligeiramente diferente.

O CORTE VOLTADO PARA CIMA

Tradicionalmente, espadas japonesas como a katana são exibidas da mesma maneira como são usadas. Como a katana é usada com o fio de corte voltado para cima, ela também deve ser exibida da mesma forma, com o fio de corte voltado para cima.

Algumas pessoas dizem que exibir espadas com o fio de corte voltado para cima ajuda a proteger a lâmina de danos, mas isso não é necessariamente verdade. Exibir a katana com o fio de corte voltado para cima é um meio de “respeitar” a espada. Isso remonta a centenas de anos ao Japão feudal, durante o qual esta era a maneira padrão de exibir katanas. Desde então, a tradição permanece, com praticantes de artes marciais e colecionadores de espadas continuando a exibir suas katanas dessa maneira.

TSUKA À ESQUERDA OU À DIREITA?

Do ponto de vista funcional, exibir sua katana com o tsuka à esquerda ou à direita não faz diferença. Você pode exibir sua katana com o tsuka em ambos os lados sem se preocupar com isso afetando negativamente a lâmina ou outros componentes.

Com isso dito, a etiqueta tradicional japonesa diz que as katanas exibidas com o tsuka à esquerda sinalizam paz, enquanto exibir a katana com o tsuka à direita sinaliza prontidão de combate e capacidade de lutar. Supondo que você exiba sua katana em sua casa, de qualquer maneira é perfeitamente aceitável. No entanto, se você estiver exibindo-o em um DOJO, você deve pedir ao seu sensei uma recomendação.

Independentemente de como você exibe sua katana, é importante limpá-la, poli-la e lubrificá-la regularmente. Com o tempo, poeira, detritos e umidade se depositarão na lâmina, o que pode levar à ferrugem. Ao limpar e lubrificar sua katana, no entanto, você pode protegê-la de danos como este. O mais recomendado mesmo é manter a sua katana dentro da saya (bainha), aumentando assim a sua proteção.

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ENTREVISTA COM O SHIHAN HIROSHI KATO

(publicado na revista Gekkan Hiden (月刊秘伝/ “Secret Teachings Monthly”, em abril de 2007).

Hiroshi Kato Sensei (1935-2012)

Hiroshi Kato nasceu em Tóquio, em 24 de março de 1935 e entrou no Aikikai Hombu Dojo em 1954, aos 18 anos.

Ele foi um dos primeiros estudantes de Aikido do pós-guerra no Aikikai Hombu Dojo, mas escolheu trabalhar como impressor em vez de fazer uma carreira em tempo integral da arte marcial. Conhecido por seu rigoroso auto-treinamento em Aikido, em sua juventude ele praticava armas sozinho durante a noite, cumprimentava o nascer do sol na manhã seguinte e depois ia trabalhar em uma gráfica.

Em 1975, ele formou um grupo de prática informal no Suginami Ward Koenji Gymnasium perto de sua casa e em abril de 1987 ele estabeleceu o dojo Suginami Aikikai (杉並合気会) no Suginami Ward de Tóquio, Japão como um dojo filiado da Fundação Aikikai.

Entrevistador(E): Qual foi a sua impressão ao conhecer o Fundador pela primeira vez?

Hiroshi Kato (K): Eu pensei: “Há realmente pessoas assim no mundo? Maravilhoso!”. De alguma forma, eu pensei “Vou continuar isso para o resto da minha vida…” – e mesmo agora eu ainda estou continuando. (risos)

E: Foi tão intenso?

K: O que ele estava fazendo era incrível, mas também era relacionado com a atmosfera, que era incrível. Isso é importante, pois como você sabe, ele foi a primeira pessoa assim.

E: Como era a atmosfera do dojo naquela época?

K: Bem, estava repleto de pessoas estranhas. (risos) Isso porque era o tempo em que, em primeiro lugar, as pessoas pensavam: “eu quero me tornar forte”. Na verdade, a maioria das pessoas já eram Yudansha no Karate, Judô ou Kendo e já eram fortes antes mesmo de começarem (risos). Então, é claro, o treinamento era severo.

E: Não foi difícil para você sem qualquer experiência especial em Budo?

K: Não foi difícil. Era apenas treino. Não é como se eles estivessem vindo para lutar com você. Felizmente, eu tinha muita potência. Se você não tivesse poder físico, você não teria sido capaz de treinar (risos). Havia também algumas pessoas que, esporadicamente, tentavam aplicar uma rasteira em você (risos). Mas se você aprende a tomar as quedas honestamente todos os dias, então você será capaz de reagir bem a elas quando alguém vai além do princípio que está sendo treinado. Quando penso nisso agora, parece que todo mundo era bastante violento (risos). Mas, no final, foi por ter sido capaz de treinar com tantas dessas pessoas que meu corpo é capaz de se lembrar dessas coisas.

E: Você fez algum treinamento básico de força física?

K: Não no dojo. Mas eu sempre fiz esse tipo de coisa em casa ou em outros lugares. Aquela era uma época em que havia poucos clubes esportivos, mas havia alguns sempais que levantavam pesos. Bem, mesmo que não fossem pesos, todo mundo estava fazendo algo assim. Se você não o fizesse, não seria capaz de acompanhar o treinamento.

E: Que tipo de coisas você fez?

K: Eu praticava um monte de ukemi. Eu fazia mae-ukemi várias centenas de vezes no dojo quando ninguém estava lá. Andava pelo dojo em shikko umas dez vezes e fazia um monte de coisas assim. Além disso, eu fazia coisas como balançar um tronco ou fazia cortes com um bokken. Eu treinei golpes de Karate também, em um makiwara que eu mesmo fiz. Eu nunca fiz Karate, mas se eu não fizesse esse tipo de coisa, isso seria feito em mim, pelos meus companheiros de treino. Ao praticar golpes em si mesmo, a pessoa passa a entender os sentimentos de um oponente que está vindo para atacá-lo.

E: Qual foi a maior influência no seu Aikido?

K: A principal influência era O-Sensei. Eu não tenho nenhuma outra imagem além dessa. Fora isso, de alguma forma me lembro de treinar por conta própria e das coisas que pratiquei. Tenho medo de ter esquecido tudo o que me foi ensinado pelo meu sempai. Embora, é claro, eles devem ter tido uma influência sobre mim. No entanto, a coisa interessante sobre o Aikikai é que eles não forçam você a: “fazer assim”. Por essa razão, é necessário a sensibilidade para aceitar as coisas boas, separando-as das más. Então, todo mundo tem características individuais. Do ponto de vista de um espectador, as pessoas são tão diferentes que podem pensar: “estão realmente fazendo a mesma coisa?”.

E: Cada um deles fez Aikido com um sentimento diferente?

K: Isso porque o Aikido é algo que parece diferente com cada pessoa. Então, todo mundo era muito forte. Inclusive eu (risos). Acho que é por isso que foi tão difícil para o Kisshomaru Sensei juntar tudo. Todo mundo estava apenas fazendo o que queria (risos). No entanto, acho que essa foi a razão pela qual o Aikido se tornou tão grande quanto é. Se uma estrutura estrita tivesse sido estabelecida: “isto é Aikido”, então o sentido de seu valor teria se tornado muito mais estreito. Eu acho que também há uma força em manter uma variedade de visões, de sentimentos diferentes.

Hiroshi Kato Sensei demonstrando tachi-dori
“Depois de sentir, o movimento é muito lento, mesmo depois de sentir seu Ki é tarde demais. O ideal é mover-se antes de sentir o seu Ki.”

E: Olhando para trás, você vê muitas mudanças no seu Aikido?

K: Houve uma grande mudança depois que completei trinta anos, quando machuquei as costas. Cometi um erro no meu método de treino.

E: Qual foi o seu erro?

K: O uso da parte inferior do meu corpo. Até aquele momento eu usava meu ímpeto para saltar, isso não era bom. No final, eu pensei que (o que o Aikido era): “não era uma técnica para o conflito, para derrotar outras pessoas”, e eu mudei. No entanto, tive dificuldades depois disso. Porque eu não entendia o que fazer, entende?

E: Foi completamente diferente do que você tinha feito até aquele momento?

K: Foi diferente. Muda-se seus sentimentos. Há aqueles que podem fazê-lo em um instante e aqueles quem pode levar anos – eu demorei algum tempo.

E: Até aquele momento você estava se movendo com força bruta (瞬発力)?

K: Isso mesmo. Mas há um problema nesse tipo de movimento. Se algo errado acontecer, você se machuca. Não se engane.

E: Qual foi o novo princípio, ou movimento, daquela época?

K: O uso da parte inferior do corpo em si não é um erro. No entanto, a maneira como você a usa, o equilíbrio da quietude e do movimento lá, o problema dos aspectos internos e a consciência… Originalmente, meu movimento era muito mais rápido. Em vez de dizer músculo, era a velocidade da força física (魄力). O-Sensei muitas vezes me disse: “não é o corpo (魄), é a mente (魂)”. Mas eu era estúpido e não ouvia (risos).

E: É difícil perceber quando seu corpo está se movendo, não é?

K: Sim, você não percebe. Quando me tornei incapaz de mover meu corpo, pensei: “Ah, então é isso!”. Isso não é um princípio, é algo dentro do corpo que ele entende instintivamente. Se isso não ocorrer naturalmente em seu treinamento, talvez, esse sentimento, seja criado durante seu movimento. Quando há esta ligação, então um ritmo será criado e se alguém tentar tomar a distância, será capturado e será controlado. É por isso que se diz: “começar o Aikido a partir do vazio”. Então eu fiquei pensando em coisas como: “se não é o movimento do corpo (魄), como alguém pode se tornar um com o oponente?” – que teve o efeito oposto de me tornar incapaz de mover meu corpo e eu, realmente, caí em uma queda.

E: Uma queda?

K: Não sei por quanto tempo falhei. Eu só pensava que um dia eu iria entender e continuar fazendo isso, não importa se as pessoas estavam rindo de mim ou não.

E: Foi doloroso?

K: Eu particularmente não senti que era doloroso. Se é algo que você não pode fazer, então simplesmente, não têm como ser ajudado. Eu sou apenas “comum” (risos). Mas é porque eu sou uma pessoa que dedicou tempo para se lapidar que agora há momentos em que posso dizer: “não faça isso”. Surpreendentemente, aqueles que possuem talento podem fazer essas coisas naturalmente, mas eles não entendem aqueles que não têm.

E: O que você fez para aumentar seu senso dos aspectos internos?

K: Ficava balançando um bokken a noite toda, sentado com a boca bem aberta em um atordoamento, andando na encosta da montanha… Eu andei até 60 quilômetros em uma única noite!

E: Por que você fez esse tipo de coisa?

K: Para esquecer de mim mesmo. O método japonês de “gyo” (“treinamento espiritual” / 行) é jogar fora tudo o que se tem. A fim de unificar todos os seus aspectos físicos, é necessário fazer alguma quantidade de “gyo”.

E: Por que você acreditava que isso era necessário?

K: Não é que eu fiz isso porque eu decidi fazer. Eu fiz porque não havia mais nada que eu pudesse fazer. Quando alguém pensa: “se eu fizer isso, então vou melhorar”, então este sempre irá falhar. No entanto, no meio das minhas noites balançando o bokken, muitas vezes eu ficava surpreso com insights repentinos. Se alguém tentar pensar nisso primeiro, simplesmente não funcionará.

E: O que mudou como resultado dessas práticas?

K: Eu realmente fiquei mais calmo. Acho que minha técnica também mudou, inclusive recentemente ela está diferente. Se ocorrer mudanças à medida que envelhece, você acabará falhando. Além disso, aquelas pessoas que pensam que são capazes de fazê-lo, acabarão falhando. Somente porque a pessoa pensa que ainda não pode fazer isso que se torna capaz de inovar, somente assim é que fica capaz de mudar.

E: Qual você acha que é o seu Aikido ideal?

K: No final, a naturalidade é o principal. Eu acho que começa quando a pessoa esvazia sua mente e seu corpo se move naturalmente.

E: É impossível alcançar esse estado sem algum tipo de treinamento espiritual (“gyo”)?

K: Bem, pode-se chamar de treinamento espiritual alguém que fica balançando um bokken com toda intensidade. É necessário avançar com toda a intensidade. Mesmo que alguém balance um bokken, se alguém tiver a sensação de tentar balançá-lo fortemente com os braços, isso absolutamente não fará nenhum bem. Como em todo o resto, quando se pratica o pensamento: “Eu entendi, eu percebi”, então isso não funcionará (risos). Eu mesmo repeti isso muitas vezes.

E: Quando você começou a mudar?

K: No final, não adianta pensar em derrotar outras pessoas, é preciso pensar: “vamos praticar de uma maneira alegre”. Isso porque, uma vez que se pensa em derrotar a outra pessoa, isso se mostra em sua postura. Isso é o mesmo que: “A harmonia deve ser valorizada” (Nota do tradutor: 和を似て尊しとなす – da Constituição dos Dezessete Artigos estabelecida pelo Príncipe Shotoku no século 7, na qual ele enfatizou a importância primária da harmonia nas relações sociais).

Princípe Shotoku – xilogravura do século VIII

E: Quando você diz que a harmonia parece uma teoria ética idealista, isso também é um elemento necessário do Aikido no sentido técnico?

K: Essa ética é necessária. É dela que a distância entre nós desaparece, a pessoa é capaz de se mover e a técnica aparece. Mas não é fácil, como você pensa. É importante não ficar com raiva quando o atacante vem até você (risos).

E: Essa harmonia é uma coisa instantânea?

K: Em vez de dizer em um instante, é melhor dizer que é preciso mudar a maneira como a pessoa vê o adversário. No momento em que este se projeta, deve-se envolvê-lo. Isso é algo que O-Sensei tinha. Eu senti isso. Se alguém consegue suprimir seus desejos e descartá-los, este se tornará livre, não é? Sem essa parte, a pessoa sempre estará presa ao conflito. A razão pela qual não há competições no Aikido é que: “se você quer fazer a sua vida de forma que tais coisas não sejam necessárias, você pode fazê-la”. Talvez, se isso continuar a se espalhar, o mundo ficará em paz.

E: Isso deve exigir um alto nível de consciência desses treinamentos, não é?

K: Acho que sim. Por essa razão, nossa metodologia é treinar em um único fluxo, cada pessoa recebendo ukemi de uma para a outra. No entanto, a coisa mais assustadora sobre esse tipo de treinamento é se deixar levar pelo imaginário. Gostaria que todos soubessem que estamos “fazendo algo além dos contextos”.

Hiroshi Kato Sensei demonstra morote-dori – “É responsabilidade daquelas pessoas que tomaram a mão de O-Sensei mostrar que o Aikido é uma coisa maravilhosa.”

E: Eu acho que a “Harmonia” (和) que estávamos apenas discutindo está relacionada ao “descartar a si mesmo” do treinamento espiritual (“gyo”). Alguma imagem do Fundador vem à sua mente daqueles momentos?

K: Certamente isso acontece – a imagem de O-Sensei surge mesmo enquanto eu estou dormindo, e a intensidade é devastadora!

Morihei Ueshiba, O-Sensei em 1961, diretamente antes de partir para o Havaí
Hiroshi Kato Sensei na porta ao lado de Kisaburo Osawa Sensei

E: Como ele aparece?

K: Hmm… ele aparece de pé. A partir daí, muitas coisas fluem através da minha mente – veja você, dentro de mim O-Sensei ainda não faleceu. Fico feliz só de tê-lo ao meu lado.

E: Ele tem uma imagem bastante mal-humorada, não é?

K: Sim, isso é porque, de repente, ele ficou com raiva. Mas ele logo estaria sorrindo (risos).

E: Que tipo de coisas fazia ele ficar com raiva?

K: Quando ele estava de mau humor, sobre qualquer coisa (risos). Mas ele estava sempre nos observando. Quando treinávamos, havia algumas pessoas que eram muito fortes e quando o treino ficava muito intenso, eu realizava ukemi, independentemente de ter sido jogado ou não. Quando isso acontecia, eu ouvia sua voz gritando: “Apenas cair quando você é jogado não é maneira de treinar!”. Ele era capaz de sentir quando nossa intensidade havia fugido. Mas ele não fazia outras explicações, então como interpretar isso era responsabilidade dos alunos.

E: Vocês já viajaram juntos?

K: Uma vez, quando fui a Iwama no início do ano novo, me disseram: “o velho está voltando para Tóquio, então vá com ele como seu Otomo (“atendente”)”, então voltei com ele para o Hombu Dojo. Afinal, eu não podia recusar – mesmo sendo realmente exaustivo (risos).

Iwama Taisai, 1965
Hiroshi Kato, frente à direita.

E: (rindo) Estar com ele não era agradável?

K: Estar juntos por horas a fio foi realmente uma coisa (risos). Eu estava sem jeito e ele andou muito rápido. Aquele homem de oitenta anos simplesmente escorregava através da multidão. Eu estava carregando os bilhetes, então de alguma forma eu o acompanhei, mas fiquei encharcado de suor frio. Esse foi um treinamento realmente intensivo em Ashi-sabaki, Tai-sabaki e Irimi! Por algum milagre eu consegui ficar com ele. Eu acho que o fio que conecta nossos sentimentos não foi cortado, então eu fui capaz de seguir junto dele. Se eu tivesse pensado sobre isso com a minha cabeça, então eu não teria sido capaz de fazê-lo. Eu realmente aprendi algo naquele dia.

E: Eu acho que não houve problemas em seu movimento?

K: Claro que não! Se tivesse tido eu teria ficado preso. Houve uma vez que um grupo de autores de histórias de detetives se reuniram no dojo discutindo coisas como Sen-no-sen e Go-no-sen (Nota do tradutor: “Go-no-sen” – movendo-se depois que o ataque chega até você, “Sen-no-sen” – movendo-se ao mesmo tempo que o ataque, mas antes que ele chegue a você, “Sen-sen-no-sen” – movendo-se antes mesmo do ataque começar). Quando isso aconteceu, O-Sensei disse: “Sen-sen-no-sen? Não seja um, eu já teria vencido desde o início!”.

E: Ele estava bem ali?

K: Sim. Todo mundo apenas se sentou lá com a boca aberta. Quer se trate de Sen-sen-no-sen ou Go-no-sen, são todas estratégias com um problema nelas. São estratégias relativas aplicadas em relação ao oponente. Mas O-Sensei disse: “Não é isso. Quando você se move para a direita, está terminado”. Acho que sim.

E: O-Sensei lhe ensinou algo em particular sobre movimento?

K: Um dos Kuden (“transmissões orais”) que me ensinaram é: “As pernas são usadas através da cintura, as mãos são usadas através da educação do intelecto” (脚は腰で使い、手は知育で使う). Se alguém se move pelos pés, as coisas vão parar ali mesmo. Mas quando se usa a cintura, pode-se mover continuamente sem interrupção. Que as mãos sejam usadas através do treinamento intelectual não significa que se pense em como usá-las, significa movê-las naturalmente.

E: Como foi tomar ukemi do Fundador?

K: Ele era a pessoa mais fácil de tomar ukemi. Ele jogava com o fluxo e não permitia que você se machucasse. Mas foi assustador. Você podia ver o teto, virando completamente de cabeça para baixo quando você caia. Eu pensei: “Eu odeio ter esse medo”. Mas foi uma sensação ótima, foi inspiradora. Mesmo agora eu posso me lembrar da sensação de seu toque. Esse é o meu tesouro. Foi a partir desses tempos que pude aprender que o Aikido não pode ser competitivo, há de se sentir com seus próprios sentidos.

E: Isso é porque ele te conheceu mais pessoalmente?

K: Não é isso. Eu estava completamente absorvido: “Isto é Aikido!” – Eu tinha entendido a teoria, mas lá eu fui capaz de realmente experimentá-la.

E: Você já entrou em embate durante os treinos?

K: Ocorre porque duas pessoas que estão se propondo a fazer isso não querem cair juntas, mas isso é da mesma forma que a água gradualmente suaviza uma pedra áspera em uma redonda. Entretanto, no meio disso tudo é necessário demonstrar que: “é realmente diferente, você sabe”, ou o caminho será cortado, e as pessoas pensarão: “é isso?”. Não há muita gente assim? Na realidade, as pessoas realmente não caem tão facilmente, você sabe. Isso é uma ilusão. Dessa forma é agradável, mas em algum momento seus olhos serão abertos. Eu mesmo passei ano após ano em delírio. Mas quando alguém começa a vislumbrar um pouco da verdade, eles entenderão. Jogar outra pessoa não é tão fácil assim. Se você pensar em jogá-los e ficar rígido, então não vai funcionar. Sinta-se confortável. Uma vez uma pessoa que era um boxeador, de repente, jogou um uppercut durante o treino – (risos), mas eu lidei com ele naturalmente. Quando o treinamento é suave e adaptável, ele vai sair. É porque estou me movendo confortavelmente que os problemas desaparecem e eu sou capaz de me mexer.

E: Faça isso confortavelmente…

K: Sim, mas a imagem que você tem de “confortável” é diferente, a “condição” (調子) é diferente. Certamente, tudo tem uma certa condição. Mas o que é importante não é a condição entre você mesmo e o oponente. O que é importante é a condição que se aplica aos seus próprios sentimentos. Incluindo Kokyu. Por essa razão, cria-se uma condição que é grande o suficiente para envolver o oponente ou há, também, um tipo de condição que encurralará o oponente em um instante. Você deve ter os dois.

E: Isso é difícil, não é?

K: É difícil! Há quantos anos você acha que eu faço isso (risos)? Para fazer isso, você deve entender três coisas.

E: Que três coisas?

K: Primeiro e mais importante é conhecer o passado. Estude a história. Em seguida, é o conhecimento das condições atuais. E, finalmente, para promulgar o futuro. Quando digo conhecimento das condições atuais – por exemplo, se você é uma pessoa com aproximadamente a mesma quantidade de força que eu, então a estratégia e as táticas são necessárias. Mas, no futuro, o sonho e o objetivo da humanidade de eliminar a necessidade disso exigirão esforço. Eu sou a favor da eliminação dessa necessidade, e é por isso que eu me esforço. É por isso que é difícil. Isso é mais difícil do que ganhar ou perder.

Hiroshi Kato Sensei teaching in the United States – 2005

E: Poderíamos ouvir um pouco mais sobre os ensinamentos do Fundador?

K: Ele realmente não falou com muitos detalhes. No entanto, embora muitas vezes se diga que O-Sensei não ensinou, e eu acho que esse não é o caso. Havia uma certa maneira de ensinar… Eu acho que sua maneira de ensinar era realmente a melhor.

E: Como era?

K: Mostrando a melhor coisa. Mostrando-o em ação, mostrando sua energia. Não é uma questão de mostrar como jogar. Depois de observar os movimentos do Fundador, o que cada pessoa tirou foi deixado para suas próprias habilidades e estudos. Dito de outra forma, dependendo de como se olhava para o Fundador, tudo era diferente. Mesmo apenas um balanço do bokken era completamente diferente, entende? Mas eu acho que a razão pela qual eu continuo no Aikido mesmo agora é porque eu vi o Fundador realizando os melhores movimentos, e fui tocado por sua mão.

E: Mostrando a melhor coisa…

K: Não havia explicações sobre a técnica de O-Sensei, porque ele só falava sobre os deuses. Como “Aikido veio do Céu”. No entanto, isso também é uma coisa boa, porque há momentos em que se pode pensar “isso não foi algo feito pelo homem, então haverá algumas partes que são apenas um mistério”.

E: O que você achou na época em que ouviu esse tipo de discurso?

K: Eu não entendi (risos). Aquelas pessoas que entraram através do relacionamento com a religião tentaram parecer que entendiam, mas as coisas importantes não deveriam ser entendidas através das palavras. Isso porque eles deveriam ser expressos em seu próprio corpo através de sua prática.

E: Então não faz sentido tentar estudar teoria?

K: Eu suponho que há algum valor para estudar, mas deve haver algo que extrapole para fora do seu corpo. O que eu acho que deve ser Aikido? Sinto que as pessoas hoje entendem mais ou menos isso. Mas eu não desgostei de seus discursos. Eu não os entendia, mas sentia como se fossem algo importante.

E: Se chegar um momento para entender, alguém entenderá?

K: Talvez não haja problema em não entender. É apenas o meu ideal ser capaz de pensar: “eu tenho algo maravilhoso”, já que a forma de O-Sensei, sua imagem, está dentro da minha cabeça.

E: Qual é a imagem do Fundador que mais ficou com você?

K: O que posso dizer, algo maravilhoso. Algo como o Buda ao fundo… Seja o que for, para mim ele é absolutamente um Kami-sama. Estou feliz apenas por ter havido alguém que foi capaz de me fazer sentir assim. Eu não posso tomar o lugar dele no entanto (risos). Quer alguém acredite ou não nos deuses, quando há um sonho como esse, isso não se torna o ideal de alguém?

E: Seu ideal?

K: Sim. Quando eu faço Aikido eu digo: “Você não pode simplesmente gostar, você tem que se apaixonar por ele”. Você tem que se apaixonar por ele. Se você for tão longe a ponto de se apaixonar por ele, então, mesmo quando estiver em silêncio, você estará treinando. Se você gosta de algo, quando ficar exausto, você vai parar. Claro, é difícil, quando eu era jovem e até agora. Mas mesmo quando era difícil, era agradável. Até agora eu gosto. Se eu fizer isso com um olhar entediado no meu rosto, não seria muito interessante, não é (risos)? Então, eu não ensino, nós praticamos juntos. No entanto, dentro disso, deve-se colocar o máximo de esforço possível.

E: Qual é o seu esforço máximo?

K: Eu devo me expressar para que eu possa deixar a todos com a impressão de que “o Aikido é uma coisa maravilhosa”. Acho que essa é a responsabilidade das pessoas que tomaram a mão de O-Sensei. É claro que, dentro disso, houve muitas mudanças. Em tempos passados eu pensava: “Eu não tenho que fazer esse tipo de coisa, eu só vou jogá-las fora!” (risos).

E: Você também passou por muitas mudanças, não é (risos)?

K: Uma coisa que me lembro bem das palestras de O-Sensei é quando ele disse: “Eu não tenho nem um único aluno”. Pensávamos que éramos estudantes (risos). Mas quando perguntávamos: “E o que somos?”, então ele dizia: “Mas eu tenho muitos companheiros” (仲間).

E: Companheiros?

K: Eu acho que Shinran (親鸞, o Fundador do Budismo Jodo Shinshu) disse isso também, ele os chamou de “companheiros” (同行の士). Eu acho que é uma boa maneira de colocá-los, então eu penso da mesma maneira. Estou no topo da estrutura de ensino, mas somos todos companheiros. Alguém que aparece de repente e ensina algo que as pessoas gostam tanto que o seguem em silêncio deve ser um Fundador.

Shinran Shonin (1173-1263)

E: Você sentiu isso com o Fundador?

K: Eu sim. As pessoas são diferentes, mas eu me sentia assim.

X – X – X – X

ENTREVISTA COM SHIHAN WAGNER BÜLL, 7ª dan AIKIKAI

(Revista BUDÔ Online – por Paulo Pinto / GLOBAL SPORTS
18 de dezembro de 2022 / Curitiba (PR))
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AIKIDO , UM CAMINHO PARA CHEGAR À PLENA CONEXÃO DO CORPO COM O ESPÍRITO

Shihan Wagner Bull busca fazer um aikidô eficiente como defesa pessoal e que ofereça elevação espiritual © Global Sports

Recém chegado do Japão, Shihan Wagner Büll revela por que aos 73 anos ainda busca aprofundar-se na prática e no ensino do aikidô.

Há pouco mais de meio século nos tatamis, Shihan Wagner Büll edificou uma trajetória muito acima da média e daquilo que estamos acostumados a ver quando examinamos histórias forjadas pelos líderes e pioneiros das artes marciais. Mas essa estrada parece estar longe do fim, pois sua bagagem continua a ser aumentada, como ocorreu em sua recente viagem ao Japão.

“Quando chegamos a uma certa idade, não nos permitimos mais perder tempo. E, mais do que ninguém, quero chegar ao ponto de fazer um aikidô eficiente como defesa pessoal e que, ao mesmo tempo, me proporcione elevação espiritual e me leve à harmonia entre corpo e mente. Ou seja, o que busco de mais valoroso no aikidô é a reverberação com as forças da natureza, o Dao, como propõe a essência de qualquer religião. A diferença é que este  busca o poder espiritual tornando suas técnicas de defesa pessoal eficientes e harmônicas, como é a natureza em tudo que realiza. Antes de me aposentar, tenho como missão de vida deixar o caminho pavimentado não só para os meus alunos, mas para todos que buscam elevar-se espiritualmente e que se identificaram com esta proposta, de aikidô eficiente como defesa pessoal, mas um caminho de iluminação espiritual.”

O aiki-jujutsu cultiva muito o aiki, aquele aikidô de desenvolver a sensibilidade, o terceiro olho © Global Sports

Shihan Büll sabe exatamente onde quer chegar, mas sentia necessidade de aprofundar-se ainda mais. Por intermédio de Angelo Armano, um mestre da Itália, conseguiu fazer contato com dois ícones japoneses: Hideo Hirosawa e Yoshinobu Takeda. Hirosawa, que foi professor no dojô de Iwama, era cunhado do grande mestre Morihiro Saito e é o único aluno ainda vivo do O-sensei Morihei Ueshiba, o fundador do aikidô, de quem cuidou até o último dia da sua vida. Takeda, hachi-dan (8º dan) e comandante de uma grande organização internacional, é o aluno mais antigo de Seigo Yamaguchi, considerado o maior expoente da modalidade.

“Treinei sete dias diretamente com o professor Hirosawa e dois dias com o professor Takeda. Fiz todas as experiências, testei, verifiquei o que funcionava ou não, enfim, esclareci todas as dúvidas que me restavam. Finalmente entendi como o aikidô funciona mais profundamente e por que funciona, e assim posso transmitir melhor os segredos desta arte. Ficou bem claro por que o aikidô moderno é assim, por que o aikidô do O-sensei é assado. Tive confirmação de fonte fidedigna do que sempre afirmei: o aikidô de O-sensei é um, o aikidô moderno é outro. Neste sentido posso responder a qualquer pergunta – dos meus alunos principalmente, que são aqueles a quem eu devo respostas e dos quais tenho a responsabilidade de tomar conta, para que não percam tempo com coreografias sem a profundidade necessária.”

Quem acreditar em mim pode me procurar, que eu terei o maior prazer de ajudá-lo © Global Sports

Shihan Büll acha que perdeu muito tempo, assim como muitos de seus companheiros do passado, treinando por muitos anos as bases do aikidô de O-sensei de forma equivocada. Os movimentos são idênticos, mas a energia que tem de correr por dentro do corpo é completamente diferente. “O aikidô brasileiro atrasou no mínimo uns 20 anos porque começou com maus professores”, explica. “Felizmente hoje a situação é diferente, há muitos bons professores ensinando aikidô de várias linhas. Não importa a graduação deles, pois ela nem sempre reflete a qualidade e a profundidade do conhecimento que possuem.”

Um longo caminho cheio de descobertas

Nascido em 5 de março de 1949 em Londrina (PR), Wagner Bull é engenheiro civil, pós-graduado em administração de empresas pela FGV, autor de oito livros sobre aikidô e tradutor das principais obras publicadas em português sobre aikidô, judô e karatê.

Shihan Wagner Büll em seu dojô © Global Sports

Iniciou-se na prática do aikidô em 1969 e em 1986 tornou-se professor, tendo formado ao longo dos anos centenas de faixas-pretas com nível internacional. Por 14 anos foi discípulo do Shihan Yoshimitsu Yamada, aluno do fundador do aikidô, ajudando-o a difundir sua organização na América Latina, e já participou de seminários com os principais nomes da modalidade do mundo. Ministrou seminários na Argentina, Peru, Venezuela, México, Portugal e Estados Unidos, e introduziu a escola de Yamada sensei em Cuba. Em 11 de janeiro de 2009 recebeu o título de Shihan, consignado pelo Aikikai Hombu Dojo de Tóquio, escola cujo dojô original foi fundado por Morihei Ueshiba em 1931, sob o nome de Kobukan. Conhecido pela designação de O-sensei, o criador do aikidô nasceu em 14 de dezembro de 1883 na cidade de Tanabe, na província de Wakayama, e faleceu em 26 de abril de 1969.

Hoje Shihan Büll é shichi-dan (7º dan) e Shihan (PhD de aikidô), sendo o primeiro praticante sem ascendência japonesa no Brasil a receber tal graduação. Desde a infância, porém, manteve estreito contato com a colônia japonesa no Paraná, absorvendo conhecimento de sua rica cultura e principalmente das artes marciais. Praticou judô, karatê, boxe e, por fim, encontrou o aikidô, arte que o acompanharia por toda a vida.

O que busco de mais valoroso no aikidô é a reverberação com as forças da natureza, o Dao, como propõe a essência de qualquer religião © Global Sports

Isso aconteceu em 1969, estudante universitário em Curitiba, com o professor Jorge Van Zuit, quando conheceu o mestre Horie, go-dan (5º dan), um grande budoka que o impressionou muito e cujas informações sobre o aikidô o fizeram apaixonar-se pela arte.

Em 1971 mudou-se para São Paulo para se pós-graduar em cálculo estrutural de edifícios, vindo a treinar durante cinco anos com sensei Keisen Ono e o introdutor do aikidô em São Paulo, Reichin Kawai. Em 1985 conheceu o bispo xintoísta Massanao Ueno, alto grau no Takemussu Aikidô, que mesclava a prática do aikidô ao esoterismo Shinto. Naquela ocasião foi iniciado no Takemussu Aikidô e nos aspectos esotéricos e espirituais do caminho, como o Kotodama. Foi então que teve contato com a espiritualidade xintoísta, que ensina as práticas físicas e meditativas para desenvolver a sensibilidade e reverberar com o mundo divino. Esta experiência modificou sua forma de ver a vida. Houve um incidente e o monge Ueno voltou ao Japão e seu mestre se desligou do Aikikai, fundando a Takemusu Kai, que não poderia funcionar legalmente no País devido à legislação centralizadora das artes marciais da época. Wagner Büll, restringido então pelas regras absurdas existentes na época da ditatura, decidiu enfrentar tudo pelo amor que tinha pelo aikidô, iniciando um movimento político e contratando advogados.

Sensei Büll em Tóquio, diante de templo xintoísta © Arquivo

Em 1988, fundou o Instituto Takemussu e teve sucesso em sua ação, conseguindo o reconhecimento da entidade como representante do aikidô tradicional no País pelo Conselho Nacional de Desportos (CND), equivalente à atual Secretaria Especial do Esporte, o que possibilitou a criação da Confederação Brasileira de Aikidô Brazil Aikikai, única entidade no Brasil reconhecida pelo governo como efetivamente praticando a arte nos moldes estabelecidos pela Federação Internacional de Aikidô (IAF na sigla em inglês). Este feito acabou com o monopólio que impedia que mais de uma organização fosse oficialmente reconhecida, possibilitando que a arte começasse a crescer e prosperar com mais liberdade e maior velocidade.

Em 1988, estabeleceu contato com o Hombu Dojô do Japão, por meio do sensei Yoshimitsu Yamada, de Nova York, aluno de Morihei Ueshiba, que se tornou responsável pelas promoções de faixas-pretas no Brasil, com apoio do filho do fundador Kishomaru, que tinha conhecimento das restrições à liberdade do aikidô no País. Isto provocou um boom no aikidô brasileiro, e os alunos mais graduados antigos saíram da organização que centralizava tudo. O crescimento foi vertiginoso dali para frente.

Professor Büll com Hideo Hirosawa, último aluno interno no fundador. Foi ele que recebeu a última evolução do mesmo, o que em japonês se diz bannen aikido, ou seja, o aikidô do velho e sua última conclusão sobre o caminho © Arquivo

Em 1999 foi graduado roku-dan (6° dan) por Yoshimitsu Yamada, promoção reconhecida pelo doshu do aikidô de Tóquio em 2002. Nesse mesmo ano assumiu o Doshu Moriteru, neto do fundador, com o falecimento de seu pai, o qual reconheceu o imenso trabalho de Büll Shihan no Instituto Takemussu – Brazil Aikikai como uma organização nacional oficializada pelo Aikikai Hombu Dojo do Japão. Desde então as promoções de faixas-pretas passaram a ser conduzidas diretamente por Shihan Büll, autorizado a examinar e habilitar promoções para todos os graus.

Wagner Büll organizou dezenas de seminários com grandes mestres internacionais de altíssimo nível, elevando a qualidade técnica da arte no País e criando oportunidade para que os praticantes conhecessem a maioria dos mestres mundiais, a princípio com ajuda de seus companheiros que fundaram suas próprias organizações. O mais notável é que, posteriormente, com o apoio da Federação Paulista de Aikidô e junto com o professor Makoto Nishida e apoio do professor Shikanai, organizou o grande seminário com o doshu Moriteru Ueshiba, ao qual compareceram mais de 2.100 pessoas, sendo o segundo maior seminário de aikidô até hoje realizado no mundo em número de participantes e o maior em área de tatames. Foi algo gigantesco. Büll também é considerado o maior divulgador da modalidade no País. Desde 1996, escreveu centenas de artigos em revistas especializadas no Brasil e no exterior, bem como no jornal São Paulo Shimbum e na extinta revista Kiai, renomada publicação especializada da época.

Em busca da iluminação espiritual

Tecnicamente falando, Büll é um tradicionalista que procura ensinar o aikidô o mais próximo possível da forma ensinada por Ueshiba, sempre destacando que, embora seja uma arte marcial eficiente, tem como propósito a iluminação espiritual. Além de formar até agora 445 faixas-pretas, estimulou a criação de vários dojôs de aikidô nas principais cidades brasileiras.

Wagner Büll e Alexandre Büll com sensei Hideo Hirosawa, na visita realizada em seu dojô no mês de novembro © Arquivo

Büll recorda que se apaixonou pelo aikidô em função da convivência com o monge Massanao Ueno, com o qual treinou de 1984 a 1989, e que lhe mostrou que o aikidô do O-sensei não era uma religião, mas uma espécie de essência de todas as religiões e que nada mais é que a união do corpo com o espírito. Não por meio de uma linguagem intelectual, mas por meio de uma linguagem do coração (Kokoro) e fundamentada na intuição e percepção do praticante.

“Eu senti o que o monge Ueno queria me ensinar. Os japoneses têm um provérbio que diz ishi den shi, ou seja, transmissão direta. Eu tive isso, essa felicidade, principalmente ao conhecer o monge Ueno, que veio ao Brasil para instituir o xintoísmo na América Latina. Ele havia treinado com Toshinobu Susuki aluno particular de O-sensei, um homem rico. Naquele tempo O-sensei dava aulas para pessoas de alto nível, políticos e empresários do Japão. E foi esse monge que me ensinou verdadeiramente o aikidô, junto com o xintoísmo. A partir dali passei a ver o aikidô não mais como uma prática de defesa pessoal, mas como um shi budô, (budô espiritual), um treinamento para evoluirmos como ser humano, transcender a materialidade e buscar a espiritualidade, ou seja, o que toda religião prega, o que todo mundo busca de forma consciente ou inconsciente.”

Hideo Hirosawa instruindo Wagner Büll e passando os segredos que o fundador revelou a ele © Arquivo

“Se o homem se separou do espírito”, reflete Büll, “o homem tende a voltar para o espírito, e o aikidô é isso: um treinamento para o homem unir seu corpo ao espírito e com a grande natureza, (daishizen), seja o nome que se queira dar a ela, com Alá, com Deus, com o Cosmos – isso vai depender da cultura e da visão da vida de cada um.”

“O aikidô do O-sensei não era uma religião, era uma espécie de essência de todas as religiões, que nada mais é que a união do corpo com o espírito.”

Esse foi o aikidô que Büll aprendeu no final da década de 1980. Mais tarde, teria um contato bastante intenso com o professor Yoshimitsu Yamada, um expert no aikidô moderno, como foi dito que aprendeu e sua forma que Büll denomina o aikidô moderno, no qual formou vários alunos.

Hideo Hirosawa e Alexandre Büll no cemitério onde está enterrado Saito sensei  © Arquivo

“Apresentei sensei Yamada para a maioria das pessoas que hoje o seguem aqui no Brasil. Fui também a primeira pessoa que trouxe para cá o norte-americano Donovan Waite, que nos ensinou a cair como faziam os japoneses, parecendo gatos. Treinei com vários outros mestres. O mais notável foi Hiroshi Kato, e cada um deles me ensinou um pouco, mas sempre mantive o foco no aikidô do O-sensei. O Instituto Takemussu possui em seus quadros excelentes aikidoístas que praticam aikidô moderno e sempre somos elogiados pelos mestres modernos que nos visitam, mas além de meus alunos também há inúmeros bons praticantes e mestres no Brasil que aprenderam o aikidô moderno graças à contribuição especial de Yamada sensei, Ichitami Shikanai e Seki shihan.

Ampliando o conhecimento

Sempre em busca de mais conhecimento, sensei Büll procurou estudar o aiki-jujutsu e, ao treinar com o professor Tatsuo Kimura, do Japão, percebeu que o segredo técnico do aikidô antigo estava ali e passou a estudar este estilo. Na época, Kimura era o instrutor-chefe do clube Daito-ryu Aiki-jujutsu na Universidade de Tsukuba.

Em seizá, Wagner e Alexandre Büll com os alunos mais graduados do sensei Hideo Hirosawa © Arquivo

“Kimura aprendera com o grande Yukiyoshi Sagawa, o aluno mais forte do Shihan Sokaku Takeda. Para Kimura seu aiki era mais forte que o do O-sensei e o de Kodo Horigawa, o segundo aluno de Sokaku Takeda. Aí me interessei pelo aiki-jujutsu e acabei chegando no professor Maikawa, que ficou meu amigo. Posteriormente eu e meus filhos fomos treinar com ele em Kyoto. Com isso acabei desenvolvendo essa necessidade de buscar o aiki no aiki-jujutsu, que é diferente do aikidô moderno, e o que o fundador efetivamente fazia. Só que, diferentemente do aiki-jujutsu, Ueshiba combinou a arte marcial com práticas espirituais xintoístas. ”

Sensei Wagner entende que o aikidô moderno é muito plástico, muito bonito, faz muito bem para a saúde, mas não prima pelo budô e a defesa pessoal e, principalmente, deixou a religiosidade em terceiro plano. Busca mais a união, a cooperação e o equilíbrio. Já o aiki-jujutsu cultiva muito o aiki, aquele aikidô de desenvolver a sensibilidade, o terceiro olho – e por isto Ueshiba percebeu que poderia também funcionar com uma forma de contatar Deus. Ueshiba chamou seu Aiki, então, de Takemussu Aiki.

Grupo de alunos do professor Hideo Hirosawa © Arquivo

“Encontrei a parte técnica do aikidô do qual eu gosto naqueles professores de aiki-jujutsu. É muito difícil encontrar as mesmas características no aikidô moderno, que depende muito do uke para que o praticante execute a técnica. No aiki-jujutsu, ao contrário, o uke (aquele que é arremessado) luta e resiste. Ou seja, é um aiki-jujutsu feito para se usar em uma luta, é mais prático. Então, foi o que pude constatar estudando centenas de livros e contatando pessoalmente dezenas de ex-alunos efetivos do fundador. Há muitos que fizeram aulas com Ueshiba e se rotulam “alunos de O-sensei”. O estilo do O-sensei era esse, que estava bem dentro daquilo que enquadrei.”

Após essa experiência e sucesso, Wagner Büll viveu momentos muito difíceis ao enfrentar um problema médico raro chamado Iquitios Atrial, que o obrigou a fazer uma cirurgia no coração para evitar que seu sangue pudesse provoca-lhe um derrame cerebral. Teve de ser operado por uma junta médica e foi obrigado a interromper sua carreira, ficando vários anos inativo, buscando recuperação física e psicológica. O dojô ficou nas mãos dos seus dois filhos e alunos. “O Alexandre é médico cirurgião, tem 40 anos e é um aikidoísta conhecido principalmente na America Latina; tem nível de 6º dan (roku-dan), treina desde os 4 anos ininterruptamente. Edgar é empresário, engenheiro e advogado; possui o 5º dan (go-dan), fazendo parte da escola do professor Maikawa, da Aiki-jujutsu Aikidô de Kyoto.

Professor Wagner na entrada do dojô do sensei e Yoshinobu Takeda © Arquivo

O lado positivo dessa parada forçada é que sensei Büll pôde estudar muitos livros sobre Budô e artes correlatas e sua biblioteca possui mais de 800 volumes, com quase todas as obras principais sobre as artes marciais publicados no Ocidente. Poliglota, traduziu para o português muitas obras, tanto de Jigoro Kano quanto de Funakoshi e outros mestres, visando sempre a ampliar seus estudos sobre marcialidade, budô, aikidô e espiritualidade e religião. “Minha biblioteca é gigantesca, mas é claro que não estudei tudo. Entretanto, todas as obras me serviram e ainda servem de consulta. Priorizei os guias e matérias que mais me interessavam. O professor Tamura nos visitou quando eu ainda não possuía nem 40% do que tenho hoje e disse: a única pessoa do mundo que tem tanto material assim é o professor Arikawa, do Japão, que colecionava muita coisa do O-sensei.”

Busca incessante do Dô

A partir daquele período Shihan Wagner Büll fez muitas experiências, estudou muito, desenvolveu muita prática e chegou a determinadas conclusões a respeito de tudo isso. Voltando à prática do aikidô nos dias atuais, ele observa que é preciso avaliar todo o ambiente com cuidado.

“Existem muitos bons professores, mas também existem os maus. Muita gente dá aula, mas deveria é estar estudando, subordinada a um professor. Muita gente começa cedo a praticar o aikidô, aprende a fazer movimentos, a aplicar chaves e acha que isso é tudo. Na verdade, é o curso primário. Qualquer bailarino aprende esses movimentos e essas formas. O aikidô não é assim. É algo muito mais profundo e isso passa por um tratamento do espírito, do desenvolvimento da espiritualidade. Aikidô é um caminho espiritual; os praticantes têm de tomar consciência desse fato, ou vão perder tempo. Quem quer aprender somente defesa pessoal deve buscar algo específico. Eu sugiro associar psiquiatria, filosofia e tiro ao alvo. Não existe melhor forma de se defender atualmente do que com armas de fogo. O próprio fundador, quando serviu seu mestre na Mongólia, como guarda-costas, usava uma pistola Mauser, e o fez com sucesso contra bandidos. Budô é algo em que a pessoa mais fraca tem de ser realmente capaz de enfrentar o mais forte e, no mínimo, não ser dominado, mas isto não se tange à luta corpo a corpo. Aikidô do fundador, não o moderno, foi criado para a pessoa se defender na vida, em uma luta real, e para isto, antes de enfrentar alguém, o indivíduo deve perceber o poder do inimigo e estudar uma estratégia vencedora. Se eu tiver de enfrentar o Mike Tyson num ringue para defender minha vida, é claro que irei armado e levarei uns guarda-costas igualmente. Enfrentar alguém tão forte como Tyson, confinado num elevador, é ser derrotado na certa. Por isso o verdadeiro aikidoísta não perde nunca. O Budô verdadeiro usa a marcialidade para parar a agressão, mas não se limita a socos e chutes. Se alguém tem medo de apanhar dos outros ou de perder uma luta, é porque não sabe o verdadeiro aikidô do fundador.”

Mestres da Italia e Brasil, convidados a dar uma aula e fazer demonstrações no famoso dojô em Yokohama: Angelo Armano (6º dan), Alexandre Büll (6º dan), Yoshinobu Takeda (8º dan), Wagner Büll (7º dan) e sensei Rodrigo © Arquivo

Büll avalia que, quando o Japão atacou Pearl Harbor, os militares não sabiam budô corretamente, pois não perceberam o poder latente que havia nos EUA. “Não fizeram aikidô. Quando os norte-americanos lançaram a bomba atômica sobre o Japão, trouxeram a paz e o progresso ao Japão e o povo japonês sobreviveu. Os militares queriam que todos se suicidassem. O fundador do aikidô, em 1940, rebelou-se contra os militares depois de os ter ajudado, quando percebeu seus espíritos egocêntricos, presunçosos e prepotentes. Então, se refugiou no interior, em Iwama, e ficou por lá até o final dos anos 50.”

Em outras palavras, se alguém é atacado por uma pessoa mais forte e não consegue defender-se, não entendeu nem aprendeu nada. Quando realmente se aprende aikidô, com pouca força é possível controlar qualquer adversário. “Ninguém se torna invencível, é claro, mas geralmente o atacado consegue impor o limite que desejar. Quem aprendeu verdadeiramente o judô, karatê, aikidô, wing chun ou o budô, por exemplo, é suficientemente bom para enfrentar qualquer adversário.”

A convite do Shihan Takeda, mestre Wagner Büll comandou um treino no dojô e depois fez uma demonstração. Para sua surpresa Shihan Takeda disse que há poucos mestres no mundo que fazem o aikidô usando o poder do hara como O-sensei fazia e o Shihan Büll é um deles. Isto é uma grande honra para todo o aikidô do Brasil, mostra a nossa evolução ao longo dos tempos © Arquivo

Büll revelou que a ausência de disputas foi o ponto de partida do seu envolvimento com o aikidô. “Sob o ponto de vista do budô ou da marcialidade, isso é algo determinante, porque a competição em si é um inferno. Quando alguém compete, quer ser campeão – e querer ser campeão o faz enaltecer o ego. Quando isso acontece, o competidor está reforçando a sua condição de afastar-se do mundo divino e da natureza, e aí vem o sofrimento. Não devemos exaltar nosso ego, que deve ser compatível com a nossa real necessidade. Evidentemente, cada um tem de cuidar do seu ego, tem de cuidar de si. Mas não pode exacerbar esse ego, porque viver por conta dele, da vontade de ser campeão, é pura ilusão. Felizmente o aikidô está fora do mundo dos esportes de rendimento e de todo o movimento olímpico e suas vertentes midiáticas.”

“Quero fazer um aikidô eficiente como defesa pessoal, mas que ofereça elevação espiritual, promova harmonia entre corpo e mente, como a essência de qualquer religião.”

O professor shichi-dan (7º Dan) lembrou uma das principais frases do O-sensei, fundador do aikidô: “A verdadeira vitória é contra você mesmo, agora, nesse momento, através da verdade”. Isso significa que é preciso ser realista, ver o mundo sem ilusão, sem fantasia e agora, não pensando no amanhã nem no depois. “Temos de ter capacidade de perceber a mudança, sintonizarmos com essa mudança e ser verdadeiros. Isso é aikidô: tornar-se verdadeiramente um homem. Quem ainda não unificou o seu corpo com o seu espírito não é um homem, é apenas um projeto de homem.”

Lance de treino no dojô de Yoshinobu Takeda © Arquivo

Há poucas semanas o professor Hideo Hirosawa, que foi o último aluno interno do fundador por mais de 20 anos – viveu e ensinou em Iwama, onde morava vizinho do templo Aiki jinja –, sugeriu e permitiu que a escola do Shihan Wagner passe a ser a escola que divulgue o aikidô dele no Brasil, à qual entregou o kakejijku, uma espécie de bandeira símbolo de sua representação aqui no País. Assim como O-sensei dava para seus alunos afins. “Não existe nenhuma ligação política ou financeira entre minha entidade e a de Hirosawa sensei”, explica Büll. “Somente admiração mútua, claro que tendo ele como senpai. Após ter conhecido meu aikidô, ele pediu que eu siga aqui a mesma filosofia que ele propaga no Japão em seu dojô em Hatori. Nossa experiência com sensei Yoshinobu Takeda, o principal discípulo do grande Seigo Yamaguchi, foi ainda mais surpreendente, porque os alunos de lá fazem treinamento igual ao meu, de espiritualidade praticando também o non touch.”

É interessante também conhecer, ou avaliar, a distinção que Wagner Büll faz entre o aikidô tradicional e o moderno. Segundo ele, o aikidô moderno não ensina a procurar se relacionar kamis, embora os líderes frequentarem o xintoísmo, que seria a espiritualidade em nível profundo. Já o aikidô do O-sensei é praticamente uma religião, que busca a conexão com o espírito. O aikidô moderno busca harmonia, mas não está muito focado na defesa pessoal, enquanto o aikidô do O-sensei é budô, é shin-ken (luta de vida ou morte), ou seja, prepara o homem para a luta do dia a dia e, como já foi explicado, se preciso for, para uma luta de vida ou morte, de sobrevivência. É algo mais profundo em termos espirituais.

Yoshinobu Takeda, seus alunos, Wagner e Alexandre Büll, posam para foto histórica © Arquivo

“Entretanto”, observa, “não dá para estereotipar qual é bom ou ruim. Isso depende do gosto e da busca de cada um. Mas o moderno está mais voltado para a área física, movimentação, fala muito em harmonia, paz, enquanto o tradicional foca o shin budô, um budô mais espiritual e eficiente como defesa pessoal, fala mais em se unir com as forças da natureza e aprende a controlar adversidades, em harmonia com elas.  Quem não consegue vencer uma pessoa mais forte não está fazendo o aikidô do O-sensei. Já no aikidô moderno isso não é tão importante, e sim desenvolver harmonia e equilíbrio. Em vez de lutar, pede-se que o parceiro coopere.

Transmissão de conhecimento

O primeiro objetivo do Shihan Wagner é atingir a plenitude da conexão do corpo com o espírito. O segundo é que seus alunos recebam ensinamento condizente para não perder tempo, para que cheguem muito mais rapidamente ao ponto que ele demorou quase 50 anos para alcançar. “E quando falo meus alunos”, ressalva, “não estou falando dos que treinam no meu dojô. Não é essa a minha preocupação. Claro que tenho compromisso com eles, mas o que me preocupa é o aikidô do Brasil, pois poucos podem aprender o que aprendi.”

Vinda do doshu Moriteru Ueshiba ao Brasil em 2006 ao evento que reuniu 2.100 praticantes © Arquivo

O terceiro objetivo de Wagner Büll é, dentro do possível, transmitir seu conhecimento para o maior número de pessoas. Mas adverte: “Não dou, nem daria, asas a cobras e não quero acolher indivíduos de má índole. Quero ensinar pessoas boas, gente generosa, compassiva, que tem coração; gente solidária, companheira e amorosa. Não me interesso por praticante materialista, que só quer mostrar que é bom, que é o melhor, que é um campeão. Aikidô não é um esporte, é um caminho de vida, de felicidade”.

Ou seja, as portas estão abertas para todos que procurarem o Shihan Wagner, sejam ou não da sua organização. “Quem acreditar em mim pode me procurar, que eu tenho o maior prazer de ajudá-lo. Essa é a minha maior vontade: não ficar restrito aos meus alunos e ao meu universo, mas expandir meu conhecimento para outros. Daqui a pouco eu morro, e levo tudo comigo.”

Uma vez detentor de todo conhecimento, reconhecido internacionalmente o objetivo atual do Shihan Wagner Büll é passar todo este conhecimento a outros mestres do Brasil, para que o nível geral aumente para quem quiser aprender o aikidô tradicional de O-sensei. Ele está disposto a ensinar a todo faixa preta, tudo que aprendeu sem exigir vinculação a sua organização. Exige entretanto que o interessado no curso temporário seja promovido pelo Aikikai de Tokyo, e possuidor da carteira oficial desta organização ou de diploma assinado pelo doshu e sendo pessoa de boa índole e reputação ilibada, independente da organização que pertença e continuará pertencendo após o curso © Global Sports

Wagner Büll lamenta que, hoje, só ele faça esse tipo de aikidô no Brasil. “Tivemos o professor Ono, que também trabalhava nisso, mas infelizmente já faleceu. No passado tive muitas disputas, lamentavelmente fui forçado a isso, mas no fundo, no fundo, meu objetivo era um só: que o Brasil tivesse um aikidô efetivamente digno das nossas expectativas. Felizmente hoje não tenho mágoa de ninguém e percebo excelentes professores pelo País.”

Ao encerrar este breve relato de sua trajetória nos tatamis e no Dô, sensei Büll citou uma frase memorável de Morihei Ueshiba, que, segundo ele, sintetiza a existência humana: “Toda a vida é uma manifestação do espírito e a manifestação do amor”.

X – X – X – X

Ai no Bujutsu – Aiki e o Bujutsu do Amor

(tradução de Christopher Li)

Muko (Takeo) Nishikido

Muko (Takeo) Nishikido (錦戸無光/武夫) nasceu em 1940 em Tinian, nas Ilhas Marianas do Norte, perto de Saipan. Depois da escola em Kumamoto, mudou-se para Osaka, onde começou a treinar em Daito-ryu Aiki-jujutsu em 1959 e mais tarde estabeleceu um dojo em Tóquio. Em 1973 ele conheceu Daito-ryu Aiki-jujutsu Kodokai, fundado por Kodo Horikawa, na cidade de Kitami em Hokkaido após ser apresentado por um amigo. Ao sentir seu Aiki pela primeira vez, ele decidiu descartar seu estudo anterior de jujutsu e se concentrar na abordagem de Horikawa Sensei ao Aiki.

Muko Nishida com o Sr. e a Sra. Horikawa em Hokkaido, 1973

Depois de viajar para Kitami por dois anos, ele decidiu se mudar com sua família para Hokkaido, a fim de continuar seu treinamento e recebeu severa instrução individual, além do treinamento regular no dojo de Horikawa Sensei.

Mais tarde, ele estabeleceu sua própria organização para espalhar os ensinamentos de Kodo Horikawa chamada Hikarido (O Caminho da Luz / 光道).

O artigo a seguir contém trechos de “A Altura do Aiki” (合気の極み), escrito por Nishikido Sensei e publicado em japonês em 2017 pela editora BAB Japan (BABジャパン出版局), que também publica a popular revista de artes marciais Gekkan Hiden (月刊秘伝 / “Secret Teachings Monthly”).

Parte de sua ênfase em Ki, amor e harmonia no Daito-ryu Aiki-jujutsu pode parecer estar em desacordo com as percepções comuns de Daito-ryu, mas pode ser útil considerar suas declarações no contexto de declarações semelhantes de outras figuras proeminentes no mundo Daito-ryu.

  • Tokimune Takeda, filho do professor de Morihei Ueshiba, Sokaku Takeda, e do Soke de Daito-ryu Aiki Budo:

“Os princípios essenciais do Daito-ryu são o Amor e a Harmonia”

“O objetivo de difundir o Daito-ryu é ‘Harmonia e Amor’, manter esse espírito é o que preserva e realiza a justiça social. Este era o desejo moribundo de Sokaku Sensei”

“Não há primeiro ataque no Aiki-jujutsu. Persevere tanto quanto você deve suportar. Mesmo quando for necessário, neutralize o oponente sem causar lesões através do Aiki.”

  • Yukiyoshi Sagawa, um dos alunos seniores de Sokaku Takeda e ex-sucessor como Soke da arte:

“Aiki Budo é o Caminho do Desenvolvimento Humano”

“Aiki é o encaixe conjunto de Ki. Através desta reconciliação harmoniosa todas as coisas sob o céu e a terra no universo se movem pacificamente sem perturbação.
Essa harmonização é o Aiki.”

  • Masao Hayashima (早島正雄), que treinou com Sokaku Takeda e o aluno de Sokaku Takeda, Toshimi Matsuda (da primeira página de seu livro – “Aiki-jutsu taoísta – o volume do Poder Interno”):

“Diz-se que o Aiki-jutsu é o Budo da Harmonia.”

  • Katsuyuki Kondo, Menkyo Kaiden em Daito-ryu Aiki-budo de Tokimune Takeda e sucessor da linha principal de Daito-ryu, em uma entrevista com Stanley Pranin do Aikido Journal:

Quais são as principais diferenças entre o Daito-ryu e o aikido?

Acho que não há diferença. No Daito-ryu, também, a prática começa e termina com cortesia (rei). E seu objetivo final é o espírito de amor e harmonia.

Daito-ryu Aiki-jujutsu Kodokai e seu Fundador Kodo Horikawa
aplicando Aiki em Muko Nishikido

Daito-ryu Aiki-jujutsu é o bujutsu da “harmonia” (和), como foi afirmado por Kodo Horikawa, que estabeleceu o Daito-ryu Aiki-jujutsu Kodokai, em Showa ano 25 (1950) na cidade de Kitami, Hokkaido – “Nem corte nem seja cortado. Nem bata nem seja atingido. Nem chute nem seja chutado.” É um bujutsu que lida com o oponente sem causar-lhe dano.

No caso do Daito-ryu Aiki-jujutsu Hikari-do, o nível de harmonia é gradualmente aprimorado à medida que o treinamento progride das técnicas básicas em Shoden para Chuden e Okuden.

Harmonia, isto é, amor.

Porquê? Porque impede a contenda. Quando se usa “Aiki”, até mesmo o próprio impulso de contra-atacar deixa de surgir.

Sem harmonia não se pode ser levado ao amor. Quanto maior a harmonia, mais profundo se torna o amor. Em Hikari-do nós compreendemos isso em nosso treinamento através das técnicas.

A princípio, não há nenhum sentimento real quando as técnicas do Aiki-jujutsu são aplicadas a você. Isso ocorre porque a pessoa não pode entender como ou o que está sendo feito com você.

Quando o Aiki foi aplicado pela primeira vez a mim, eu pensei: “O que é isso?”. A vontade de lutar desaparece. O desejo de atacar o adversário desaparece.

O Aiki tira completamente o sentimento do oponente de lutar e sua força. Isso pode ser retirado não apenas para uma única pessoa, mas mesmo quando há duas, três, quatro, cinco ou seis pessoas.

Templo Kannon Bosatsu
Fujiidera sentado de mil braços, Osaka – século 8

Trabalha-se para criar um corpo que possa gerenciar situações como essa em um instante. Trabalha-se para criar um corpo como o Kannon das Mil Armas (千手観音), por assim dizer.

Quando se diz “mil”, no passado isso significava um número sem limite. Isso significa que não importa onde a pessoa é agarrada em seu corpo, eles se tornam capazes de usar o Aiki.

De certa forma, isso significa que mais harmonia pode ser alcançada por duas pessoas em vez de uma, três pessoas em vez de duas, quatro pessoas, cinco pessoas, seis pessoas. É o mundo da harmonia. Por essa razão, a contenção desaparece.

Eu acho que isso é amor real. Uma pessoa, duas pessoas, três pessoas, quatro pessoas, cinco pessoas, seis pessoas – o amor se torna cada vez mais profundo.

Daito-ryu Aiki-jujutsu é o bujutsu do amor.

E então, à medida que a pessoa se aproxima do treinamento real no funcionamento interno do Aiki, mesmo a menor parte do ego se torna incapaz de entrar. A pessoa entra em um mundo altruísta sem ego.

Isto é o que eu entendi até este ponto.

Ao expressar o Aiki como um gráfico, obtemos algo como o diagrama acima.

Do lado direito está o mundo do poder, a força física mundial. Em termos de espírito, é o mundo do ego. Do lado esquerdo está o mundo do Ki, o mundo do Aiki. Em termos de espírito, é o mundo da ausência de ego.

No centro está o ponto zero, em outras palavras, o nada (“Mu” / 無). Aquele que se tornou iluminado para o nada chega a este ponto. “Ah, é nada” é um tipo de iluminação.

No entanto, mesmo que a pessoa se torne iluminada para um estado de nada, não pode fazer nada. Até mesmo um mestre oleiro dirá: “Nada pode ser feito a partir do nada”. Este ainda é o ponto zero. Apenas vindo aqui ainda se pode ir para o lado direito do mundo da força, o mundo do ego, ou também se pode ir para o lado esquerdo do mundo de Ki, o mundo do Aiki.

O lado direito do mundo da força, o mundo do ego, é confortável. A força e o ego podem ser usados imediatamente.

Por outro lado, os mundos de Ki e Aiki são severos. Não se pode compreender a coisa real se eles se comprometerem. Se alguém pensa em compreender a coisa real, deve passar por este mundo de severidade.

Mesmo quando a pessoa atinge a iluminação através do treinamento Zen, ela chega a este ponto do nada, o ponto zero. Mas se você estiver satisfeito lá, então você chegará a um beco sem saída. Há um mundo muito mais profundo. Onde quer que você vá, por mais longe que vá, há um mundo sem limites.

Quanto mais se usa o Aiki, mais seu Ki aumenta, sua harmonia aumenta, seu espírito entra no mundo sem limites.

Quando aquelas pessoas que habitaram o mundo da força física, o mundo do poder, o mundo do ego até este momento treinarem em Aiki-jujutsu, elas se aproximarão do ponto zero. Ou seja, o nada. O mundo da iluminação. Volte à origem. A partir daí começa a determinação de se alguém retornará ao mundo da força física, poder, o mundo do ego novamente, ou partirá para o mundo de Ki, o mundo do Aiki.

Em Hikari-do existem muitos tipos de treinamento feitos para retornar ao ponto do nada. Isso pode ser chamado de iluminação do corpo físico – uma vez que o corpo tenha ido tão longe, então o próximo é capaz de entrar no mundo de Ki, o mundo do Aiki.

Demonstração na sede da polícia em novembro de 1973
Seigo Okamoto – Kodo Horikawa – Muko Nishikido

Construindo o Corpo Ki

Daito-ryu Aiki-jujutsu primeiro constrói o “Corpo Ki” através do treinamento no kihon (“básico”) e depois entra em treinamento no Aiki. Ao construir o Corpo Ki, a força física (poder) não é usada. Quando o uso da força física cessa completamente, lá pela primeira vez está o Corpo Ki.

Houve um momento durante o meu terceiro ano de receber instruções de Kodo Horikawa Sensei em Kitami, Hokkaido, que eu percebi que todo o meu corpo era o Corpo Ki. “Ah, todo o meu corpo é o Corpo Ki”, percebi. Quando eu realmente parei de precisar de força física, esse foi o meu primeiro vislumbre de Ki.

Em outras palavras, eu tinha feito o meu caminho até o ponto do nada. No entanto, eu ainda não entendia Aiki. Se eu não tivesse sido capaz de compreender o Aiki, pode ser que eu tivesse retornado ao mundo da força física.

Quando alguém treina em Aiki, eles experimentam uma libertação (moksha) do corpo físico. Em moksha há uma liberação do corpo físico e uma liberação do espírito, Aiki é uma liberação do corpo físico. Entende-se – “Ah, este é o Corpo Ki!”. O corpo de força física torna-se o Corpo Ki.

Quando comparado com os sessenta anos de Aiki de Horikawa Sensei, meu Aiki ainda é metade disso aos trinta anos. Mesmo se você apenas olhar para a forma de seu corpo, Horikawa Sensei é duas vezes mais afiado do que eu. Ainda sou inexperiente.

Aquele Horikawa Sensei – mesmo depois dos oitenta anos de idade, ele dizia: “Bem, Sokaku Takeda Sensei era muito maior. Só não cheguei lá ainda…”.

Existem esses tipos de passos neste mundo. É o mundo do shugyo (“treinamento intenso”), por isso não pode ser ajudado. É preciso construir o corpo. Apenas um ano, ou dois anos de shugyo não podem esperar construir o corpo e saltar para além de sessenta anos de treinamento.

Na esperança de chegar um pouco mais perto de Horikawa Sensei, pensei no meu próprio método de treinamento. Peguei uma pesada espada de madeira e a balancei cinco ou seis mil vezes todas as manhãs e noites. Eu fiz isso por cinco, seis horas, sete ou oito horas todos os dias, e continuei por cerca de meio ano.

Então, um dia, quando eu a balancei dez mil vezes, a pesada espada de madeira voou para longe de mim. Eu pensei “Ah, voou para longe!”.

Então eu comecei a balançar uma barra de ferro várias vezes mais pesada do que a espada de madeira. Da mesma forma, eu o balançava por algumas horas de manhã e à noite cerca de 2.500 vezes cada, 5.000 vezes por dia. E finalmente a barra de ferro ficou sem peso e voou para fora das minhas mãos.

Normalmente eu não seria capaz de balançar com a minha força. Mesmo com Ki eu não conseguia balançar. Eu balancei uma barra de ferro com Ki, mas não consegui balançar mais de cem vezes. Minhas mãos não conseguiam segurá-lo. Em vez disso, eu era mais capaz de segurá-lo ao balançar com força física.

Então eu pensei: “OK, eu vou balançar com Aiki!”. e eu o balancei com Aiki – duzentas, trezentas, quinhentas, seiscentas, mil, duas mil vezes eu balancei. Essa foi a primeira vez que pensei “Ahh, no final a gente tem que treinar…”. Se eu não tivesse balançado usando Aiki eu provavelmente teria voltado para o meu corpo original de força física.

Daito-ryu Aiki-jujutsu Kodokai e o seu Fundador Kodo Horikawa

Técnicas Básicas e o Corpo Ki

Daito-ryu Aiki-jujutsu não requer nem mesmo o menor pedaço de força.

Dito isto, não é “relaxamento” (脱力). Não estou dizendo que o relaxamento é ruim, mas quando alguém relaxa se torna incapaz de se forjar.

Em Hikari-do, treinamos desde os primeiros passos das técnicas básicas até o treinamento para construir um físico verdadeiramente resiliente fisicamente. O que estou ensinando são métodos de treinamento para a construção do Corpo Ki.

Eu compreendi esse método de treinamento depois de conhecer Horikawa Sensei. Se eu ensiná-lo a alguém por um ano, seu corpo mudará de repente. Ele naturalmente se tornará um Corpo Ki fisicamente resiliente. Temos essa metodologia. Em outros bujutsus eles treinam aprendendo técnicas, não Ki. Por essa razão, eles são incapazes de desenvolver o Corpo Ki.

A fim de construir o corpo físico, normalmente se levantaria barras, ou outras coisas, mas se você pode compreender o Aiki, então coisas assim podem ser feitas de forma simples. A força muscular é desnecessária. Por outro lado, se alguém usa até mesmo um pouco de força física, então eles serão incapazes de usar o Aiki.

É preciso ter uma compreensão firme das técnicas básicas. Isso é importante.

Se a pessoa não pode compreender as técnicas básicas corretamente, então eles não vão alcançar o Corpo Ki. Eles se tornarão incapazes de alcançar a coisa real. Eles se desenvolverão em um corpo que é simplesmente composto de técnicas.

Contanto que se compreenda as técnicas básicas, elas progredirão rapidamente para o próximo nível.

Um dia, perguntei a Horikawa Sensei: “Sensei, quantos anos serão necessários para chegar ao Aiki?”. Quando fiz isso, ele disse: “Se você entender o básico com firmeza, então dois ou três anos serão suficientes”.

Isso porque, se alguém entender o básico, formará naturalmente o Corpo Ki. Não há muitas pessoas que pensam em entender propositalmente o básico. Aqueles que compreendem o básico progridem firmemente rapidamente.

Mas todos, especialmente aqueles que vieram para aprender bujutsu, inevitavelmente tentam lançar o oponente ou aplicar uma técnica e seus sentimentos são atraídos nessa direção. Quando isso acontece, aqueles que poderiam ver ficam cegos.

Entre meus alunos estavam alguns que disseram: “Nishikido não pode usar Ki”. Mas também houve aqueles que, quando finalmente chegaram ao treinamento nas técnicas Hiden Ogi, disseram: “Ahh, então há Ki, há Aiki!”. Além disso, houve aqueles que, mesmo quando mostrados “Isto é Ki. Isso é Aiki.”, pensaria “Isso é apenas mais uma técnica”.

O treinamento em Ki não pode progredir bem sem um espírito claro de nada e concentração. Esse progresso pode ser feito é porque o espírito dessa pessoa está em um estado de clareza.

O estado de nada não é “indiferença” (無関心), é ser capaz de ver claramente o que não é visível. O “Ki” que era invisível até aquele ponto torna-se visível. A pessoa vem a vê-lo com seu espírito. Eles vêm para vê-lo claramente.

Quando alguém se torna capaz disso, torna-se capaz de ver Ki o tempo todo. Compreender isso uma vez é simples, se alguém não pode compreendê-lo, então, é claro, é difícil. Aqueles com pensamentos ociosos têm dificuldade em entender isso.

Mesmo que eu ensine “Se você fizer isso então você verá!”, há aqueles que são impacientes e pensam “Não é isso, não é aquilo”.

As técnicas básicas são as mesmas, se você fizer isso, então você não será capaz de vê-lo. É rápido se você se concentrar no que estou ensinando, mas as pessoas não conseguem se concentrar.

O Corpo de Aiki Resiliente

Está escrito “Aiki”, mas lê-se “Ki wo gassuru”. Isso é o que Kodo Horikawa Sensei disse. 

Para usar o Aiki, o corpo deve se tornar o Corpo Ki. O corpo inteiro se torna o Corpo Ki, e é usado através da unificação de Ki.

Tornar-se o Corpo Ki significa não usar a força física. Quando alguém faz o treinamento básico correto em Aiki, eles naturalmente se tornarão o Corpo Ki.

Se alguém não usar a força física, sua força degenerará. Quando a força física degenera, os músculos também se tornam mais fracos. É difícil manter a força física. A fim de triplicar a força física, eles devem realmente participar de uma grande quantidade de treinamento físico. Mas, a fim de desenvolver o Corpo Ki, é aceitável jogar fora essa força física. Normalmente, a fim de alcançar o Corpo Ki, uma pessoa normal levaria de vinte a trinta anos, no mínimo. Quando se usa isso com o ki unificado, o Ki preenche o corpo. À medida que a pessoa unifica e usa esse Ki, ela se torna cada vez mais cheia de Ki. Isso é ainda mais unificado e utilizado.

Este é o treinamento de Aiki. Este é o condicionamento Aiki. Por essa razão, não há fim para o condicionamento do Aiki. E assim, constrói um Corpo Ki resiliente.

Quando alguém se torna capaz de usar o Aiki, o Corpo Ki se torna ainda mais desenvolvido. Mesmo quando o treinamento nas técnicas básicas de Aiki o Corpo Ki se torna mais desenvolvido.

Não há outro bujutsu como este. De técnicas básicas a um método de treinamento que constrói o Corpo Aiki com Ki.

Os corpos de Aiki de Sokaku Takeda e Kodo Horikawa

Uma vez que a pessoa se torna capaz de usar o Aiki, então ela se torna capaz de construir o Corpo de Aiki com o Aiki. Não o Corpo Ki, criando o Corpo Aiki.

As técnicas de Horikawa Sensei eram incríveis, mas seu corpo também era incrível. Seu corpo estava cheio de Ki. Não é um Ki, macio e fofo. Ele estava cheio de um Ki, afiado e intenso.

Desde que Sensei era um professor de escola, ele nunca tinha feito qualquer tipo de trabalho físico. Eu sempre me perguntei: “Como ele desenvolveu um corpo tão incrível?”. Ele não tinha a forma de um Corpo Ki, seu corpo estava na forma de um Corpo Aiki.

Sokaku Takeda e Takuma Hisa
Recebendo Menkyo Kaiden em Daito-ryu Aiki-jujutsu, 1939

O corpo de Sokaku Takeda também era firme e afiado. Há fotos deles juntos, mas quando comparado ao corpo de Sokaku Takeda, Takuma Hisa ainda se parece com uma criança.

Eu acho que Takeda Sensei deve ter lidado com Takuma Hisa Sensei como uma criança. O corpo de Horikawa Sensei era incrível, mas o de Takeda Sensei estava muito acima disso.

Desenvolvimento dos Tendões e Ligamentos

Todas as escolas de bujutsu constroem um corpo resiliente através de treinamento severo. É através disso que se pode tornar-se capaz de usar técnicas como as chamadas “técnicas divinas”.

O Aiki também nasceu no final das lutas de nossos ancestrais, dedicando todo o seu corpo e alma ao seu treinamento.

Existem várias centenas de escolas de bujutsu no Japão, mas o nome “Aiki-jujutsu” existe apenas no Daito-ryu Aiki-jujutsu.

Não importa o quão fraco seja o corpo, se eles realmente entenderem o Aiki e treinarem corretamente, eles desenvolverão um Corpo de Aiki resiliente.

No Daito-ryu primeiro se desenvolve o Corpo Ki através do treinamento em técnicas básicas, e então começa a usar o Aiki. Ao usar o Ki, os tendões e ligamentos do corpo não funcionam muito. No entanto, quando se começa a usar Aiki após o desenvolvimento do Corpo Ki, os tendões e ligamentos começam a funcionar.

Houve um tempo em que Horikawa Sensei foi internado no hospital depois de cortar o tendão de Aquiles dois terços do caminho. Naquela época, um dos médicos do hospital disse maravilhado: “O tendão de Aquiles dessa pessoa é três vezes mais espesso que o de uma pessoa normal!”.

Os dedos dos pés e dedos de Horikawa Sensei também eram incríveis.

Mesmo normalmente, quando nada estava acontecendo, todos eles estavam esticados. Assim como eu, quando estou esticando o dedo e os dedos dos pés até as pontas.

Os tendões no tendão de Aquiles de Horikawa Sensei e seus dedos dos pés foram o resultado de sessenta anos de condicionamento de Aiki. Em outras palavras, os tendões e ligamentos em todo o corpo de Horikawa Sensei estavam fortemente desenvolvidos.

Quando os tendões e ligamentos em todo o corpo são trabalhados através do treinamento (condicionamento) de Aiki, os tendões e ligamentos começam a se desenvolver e pode-se construir o corpo de Aiki resiliente.

Os músculos, quando se faz uma pequena pausa do treinamento muscular, logo se tornam fracos. Quando alguém se torna de uma idade avançada, sua deterioração se torna visível. No entanto, uma vez que os tendões e ligamentos são desenvolvidos, eles não se deterioram. Mesmo quando se atinge uma idade avançada, esse corpo resiliente é preservado, e pode-se permanecer com uma aparência jovem indefinidamente.

Horikawa Sensei me disse: “Mesmo que você esteja doente na cama por uma semana ou dez dias, não é nenhum obstáculo para usar o Aiki”. Mesmo que você esteja doente na cama por uma semana ou dez dias, o corpo condicionado não se deteriora.

Gassuru Aiki

Isso aconteceu um dia no terceiro ano de receber instruções de Horikawa Sensei, o primeiro ano de receber instrução individual em Kitami.

Eu perguntei a Horikawa Sensei em voz alta “Sensei, Aiki é kokyu-ho (um método de respiração)?”. Horikawa Sensei era muito difícil de ouvir.

Sensei disse: “O quê? Kokyu-ho? Hahaha…” – ele apenas riu e esse foi o fim disso.

Então, depois de alguns dias, eu estava tomando chá na casa de Sensei após a prática matinal e uma demonstração de Aikido estava sendo transmitida.

Depois que a demonstração acabou, Sensei disse o seguinte: “Eles o chamam de Aikido, mas eles não estão usando o mínimo de Aiki!”. Como seria de esperar, naquela época eu perguntei “Sensei, o que é Aiki?”.

Quando eu fiz isso, Sensei parou por um momento, respirou fundo e disse “Aiki é…”. Segurei a respiração e observei o rosto de Sensei. E então isso é o que ele disse a seguir.

Sensei me disse: “Aiki é escrito Aiki, mas o significado é Ki wo gassuru, lê-se Ki wo gassuru.”.

“Sensei! Aiki é Ki wo gassuru?”, eu disse sem pensar. Sensei disse, acenando com a cabeça: “Sim, isso mesmo.”. Eu disse “Obrigado!” do fundo do meu coração.

Até aquele momento eu tinha lido uma série de livros sobre Aikido, mas a maioria deles escreveu sobre Aiki como algo como “Ki wo awaseru”.

Nota do tradutor: Horikawa Sensei parece estar distinguindo entre “awaseru” (合わせる) e “gassuru” (合する). “Awaseru” é comumente usado no Aikido moderno no sentido de “combinar” ou “harmonizar” com o oponente. “Gassuru” neste contexto é usado no sentido de “unificação” dentro do corpo, sem relação com o oponente.

Morihei Ueshiba também usou esta leitura do kanji para “Ai”, tanto em seu manual técnico de 1933 Aikijujutsu Densho quanto em seu manual técnico de 1954 Aikido Maki-no-Ichi, mas um pouco mais explicitamente, como quando ele usou o termo “Inyo-gacchi” (陰陽合致) – “a unificação do Yin e Yang”.

Mais tarde (1963, a partir de um discurso em uma demonstração no Hibiya Kokkaido) enfatizou que este processo ocorre dentro do próprio corpo quando afirmou que “No Aikido Izanagi no Mikoto Izanami no Mikoto entra e se move através do corpo deste velho” (「合気道は、イザナギの尊 イザナミの尊が爺の体内に入り行っているのだ」) – Izanagi e Izanami substituindo Yin e Yang.

Ele também apresentou isso em seu uso da frase “Ten-chi-jin Aiki”, o modelo chinês clássico que “unifica as forças” (“Aiki”) do “céu e da terra” (“Yin e Yang”) no homem (‘jin”).

“O Aikido é o caminho e o princípio de harmonizar o Céu, a Terra e o Homem
(Morihei Ueshiba – de “Takemusu Aiki”, editado por Hideo Takahashi).

Isso também empresta alguma elucidação a um dos princípios fundamentais do Daito-ryu – Aiki-inyo-ho, o “Método Aiki Yin-Yang”, ou sob esta luz, um “método para unificar as forças do Yin e Yang”, a união chinesa clássica de opostos também citada por Morihei Ueshiba acima.

Um último ponto – Nishikido Sensei intitulou seu livro 合気の極み, “A Altura do Aiki”. Mas o caractere usado para “altura”, 極み, também é o caractere usado para “polaridade” em Taiji – 太極 – “polaridade suprema”, a união das forças opostas de Yin e Yang. No modelo chinês clássico, Wuji – “nada” (無極) torna-se Taiji (太極), a manifestação do Yin e Yang. Este processo também foi descrito por Morihei Ueshiba em termos do Kototama.

Por isso quando ouvi a explicação de Horikawa Sensei, pensei: “como eu suspeitava, é diferente.” Quando entendi que era “Ki wo gassuru” ficou claro para mim.

Naquela época eu já tinha entendido o básico do Aiki. Eu já havia percebido o conceito do Corpo de Ki. Por isso, consegui entender, “Ah, então é isso!”

Se eu não tivesse ouvido essas palavras de Horikawa Sensei, pode ser que eu não fosse capaz de entender o Aiki. Fiquei extremamente grato por essa única frase. Mesmo agora, não consigo esquecer a alegria que senti naquela época. “Sensei arigatou gozaimazu!” – agradeci ao Sensei do fundo do meu coração.

E assim, foi assim que eu fui capaz de compreender o princípio do Aiki.

Houve também outro evento. Um dia eu estava assistindo a demonstração do fundador do Aikido, Morihei Ueshiba, na casa de Horikawa Sensei. Eu assisti, pensando “Ah, incrível!”.

Eu era capaz de ver claramente como Ueshiba Sensei estava se movendo. “Ah, eu posso ver como Ueshiba Sensei está se movendo!”, Eu senti.

Anteriormente, eu não me sentia assim. Eu só pensava: “Ueshiba é incrível. O Aikido é incrível.”.

Mas eu pude vê-lo. Eu vi claramente o que Ueshiba Sensei estava fazendo e como ele estava fazendo isso.

Deve ser que, quando alguém chega a esse nível, coisas que não tinha sido capaz de ver antes se tornam visíveis, não é?

Hokkaido, 1974 – Idade do Aiki com Kodo Horikawa

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47 Ronins

Asano Naganori, Daimyo de Ako, mestre dos 47 Ronin, atacou Lord Kira dentro dos limites do Castelo de Edo e foi ordenado a cometer Seppuku no dia, 21 de abril de 1701.

Asano Naganori nasceu em Edo, filho de Asano Nagatomo, Senhor do Domínio de Ako. Naganori tinha apenas 9 anos quando sucedeu seu falecido pai em março de 1675, tornando-se o 3º Senhor de Ako.

Como parte de suas funções oficiais, ele foi nomeado chefe dos detalhes de Carpintaria na Corte Imperial, um título nominal como a maioria era naqueles dias. Em 1683, ele conheceu Lord Kira Yoshinaka, o Mestre do Protocolo no Castelo de Edo, quando foi nomeado um dos dois daimyo encarregados de receber delegados e convidados da Corte Imperial ao Shogun. Lord Kira instruiu o daimyo mais jovem, mas surgiram tensões entre os dois.

Nagamori havia sofrido uma doença grave por volta de 1694 e, como não tinha filhos, adotou seu irmão mais novo, Nagahiro, para manter a linhagem e o domínio da família caso algo desagradável acontecesse com ele.

Lord Asano foi novamente chamado para hospedar emissários de Kyoto em 1701, e mais uma vez ele ficou sob a tutela de Lord Kira. Em 21 de abril de 1701, por razões desconhecidas, os ânimos se inflamaram e Lord Asano sacou sua espada curta e atacou Lord Kira no Matsu no O-roka, um corredor conhecido como Corredor de Pinheiros. Este corredor tinha 4m de largura e 50m de comprimento, pavimentado com tatames.

Dois samurais, chamados Kurisaki e Kajikawa, testemunharam o ataque e cujos relatos escritos sobre o incidente existem até hoje. De acordo com o relatório de Kurisaki, os dois passaram no corredor com breves cumprimentos de reconhecimento, antes de Asano parar, se virar e atacar sem provocação.

O relatório menciona que quando Kurisaki e Kajikawa detiveram Asano, ele se recusou a dizer por que atacou Kira, mas não foi uma discussão. Separadamente, Kira também disse que não houve discussão antes do ataque e que ele não se lembrava muito do ataque ou sabia os motivos.

Os dois homens alegaram que não houve discussão e não sabiam o motivo do ataque. No entanto, um manuscrito mantido em um antigo depósito de livros na província de Aichi mostra que muitos dos investigadores acreditavam que Asano era mentalmente instável.

Kurisaki levou Lord Kira, de 60 anos, para a enfermaria do castelo, onde teve um corte de 13 cm na parte de trás do ombro e um corte de 6 cm na testa, que exigiu 6 pontos. Lord Kira ficou apenas ferido e, segundo relatos, teve um bom apetite nos dias seguintes ao incidente. No entanto, como sacar uma espada dentro dos limites do castelo de Edo era uma ofensa capital, o senhor Asano foi ordenado a se eviscerar.

Asano Naganori escreveu seu poema de despedida antes de seguir suas ordens e cometer seppuku às 18h da noite de 21 de abril de 1701. Ele tinha 36 anos.

Seu corpo foi sepultado no terreno do Templo Sengaku-ji. Cinco dias depois, a notícia de sua morte chegou à província de Ako. Suas terras foram confiscadas e seus 300 samurais expulsos para se tornarem Ronin, samurais sem mestre.

Sob a liderança do lacaio-chefe, Oishi Kuranosuke, que havia sido o castelão do Castelo de Ako na ausência de seu mestre, os homens de Ako receberam dinheiro dos cofres dos armazéns do castelo e se dispersaram, tornando-se fazendeiros, artesãos, professores e comerciantes, permitindo as autoridades a acreditarem que o incidente havia acabado.

47 dos homens leais de Ako se reformaram na noite de 30 de janeiro de 1703 e atacaram a mansão Edo do Senhor Kira, arrancando sua cabeça em vingança pela vida de seu mestre. A cabeça foi carregada por 10 km pela cidade até o Templo Sengaku-ji e colocada diante do túmulo do Senhor Asano, antes que os homens se entregassem às autoridades.

Os próprios homens leais foram posteriormente enterrados ao lado de seu mestre no Sengakuji.

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SOJI

SOJI

Sōji é hoje uma palavra já bem conhecida dentro dos dōjō de aikidō, e de outras artes japonesas ligadas ao bushidō. Quem frequenta ou já frequentou por algum tempo uma escola de artes marciais provavelmente está familiarizado com esta expressão e sabe que a palavra japonesa “sōji” é a denominação para a tarefa diariamente praticada de se limpar o espaço de treinamento, o dōjō. 

Porém, apesar de já ser um costume tão conhecido no ocidente e até praticado em algumas academias, será que compreendemos de fato o que significa esse hábito japonês e os seus porquês?

Para entender este hábito japonês, o primeiro passo é sabermos o que significa a palavra sōji por si só: 

SOJI (掃除) , quer dizer literalmente “limpeza”. 

No japonês, ela pode ser usada como um verbo, sōji suru, que significa “limpar” (ou ainda, “varrer”, “polir”, “retirar poeira” etc). 

Hoje, esta palavra é usada comumente dentro da expressão sōji no jikan (掃除の時間), que pode ser traduzida ao pé da letra como “hora da limpeza”.

No Japão, o sōji no jikan é um hábito presente nos mais diversos lugares, de escolas a templos, passando por ginásios esportivos e até mesmo por companhias corporativas. A ideia dessa “hora da limpeza” é a de, basicamente, se pausarem momentaneamente as tarefas para que os que utilizaram um espaço limparem o mesmo, no intuito não só de conservá-lo limpo e organizado para si mesmos, mas também de mantê-lo assim para as demais

 O hábito da faxina é algo muito enraizado na cultura japonesa, tanto que é difícil precisar de onde ele surgiu, mas muitos imaginam que ele seja um produto da cultura budista já que, nos mais diversos países, não só no Japão, o ato da limpeza é visto como de grande valor entre os monges e monjas, e é um costume que precede a muitas centenas de anos. Deve-se, no entanto, dar também o devido mérito à religião tradicional japonesa, o Shintō, no que se diz respeito ao cultivo do hábito da limpeza: para os praticantes do xintoísmo, não só a pureza espiritual mas também a pureza física é vista como uma qualidade muito valiosa, e por isso rituais de limpeza são ostensivamente realizados entre os xintoístas, o que ao longo dos séculos pode ter se transformado gradualmente na base do pensamento japonês quanto à importância de se estar limpo e de se manter o ambiente de convívio . Midogibé um ponto cardial no Aikido . O sensei disse : “AIKIDO é MISSOGI”.

Assim o fazendo limpeza durante o ato de limpar podemos perceber a nossa atuação no meio em que vivemos, quando conseguimos ver claramente que temos a capacidade de modificar tanto positivamente quanto negativamente o ambiente ao nosso redor, e, com isso, ao se almejar uma conduta positiva, podemos criar um vínculo de responsabilidade para com esse meio.

 Além disso no SOJI  aprendemos na pratica que durante o ato de uma simples faxina conseguimos enxergar a nossa ligação constante com o espaço e com todas as demais coisas e os demais seres ao nosso redor, e, logo, é neste momento que conseguimos perceber que nosso ego é somente uma pequenina parte deste meio – a limpeza torna-se, portanto, uma forma de meditar sobre os nossos atos, um exercício de humildade e de responsabilidade para com o espaço que habitamos e para com os seres com os quais dividimos esse espaço.

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A ESSÊNCIA TÉCNICA DO AIKIDO – por Wagner Büll SHIHAN.

O TAO representando pelo YIN-YANG.

O Aikido tem origem técnica especialmente em  uma arte marcial milenar chinesa que usa como símbolo o Yin Yang. Quando Henry Kono perguntou a O-Sensei como ele fazia aquelas técnicas maravilhosas ele disse : “Estude Yin e Yang”. Eu creio que entendi o porque ele disse isto, por isto fiz questão de colocar o Taichi Tu nas paredes de nosso dojo. 

Muitas pessoas, erroneamente, dizem que o significado de Yin Yang é simplesmente o bem e o mal, branco e preto, duro e mole .

Porém seu significado não é tão simples assim e não tem relação entre ser inteiramente do bem ou inteiramente do mal. E é exatamente sobre isso, para desfazer este mito divulgado entre as pessoas que resolvi escrever estas linhas. 

Em uma linguagem bem simplista , o símbolo Yin Yang é um círculo dividido em duas partes nas quais uma é preta com um ponto branco e a outra é branca com um ponto preto.

A parte preta com ponto branco é o Yin que simboliza a negatividade, a feminilidade, a passividade, a gentileza, a lua e a escuridão.

A parte branca com ponto preto é o Yang, que simboliza a positividade, a masculinidade, a atividade, a firmeza, o Sol e a luminosidade.

Se bem observamos o significado das duas partes que formam o símbolo, perceberemos que um não é oposto ao outro, mas sim complementar.

Veja só: Yin representa negatividade, enquanto Yang representa positividade; Yin feminilidade, Yang Masculinidade; Yin passividade, Yang atividade; Yin gentileza, Yang firmeza; Yin Lua, Yang Sol e, por fim, Yin escuridão, Yang luminosidade.

As duas existências coexistindo interdependentemente  e simultaneamente formam o Ki que com a ação de uma terceira vontade ativa gera o movimento , o espaço etc!

Sendo assim, quem realmente conhece o significado da simbologia, sabe que ela representa a completude e não a oposição e aí pode entender o Aiki e consequentemente espiritualmente o “ Do” .

Esta completude promove o equilíbrio que os pontos de cor opostas representam em cada uma das partes, gerando o a alavancagem , o torque helíptico, além de confirmar um aspecto importante de que um não existe sem o outro.

Quem entender isto, a meu ver, começa a iluminar-se como creio que vem acontecendo comigo! 

Em movimento, quando Yin Yang chegam aos seus extremos é iniciada uma reação, sendo que Yin se transforma em Yang e vice-versa gerando o Kokyu , no fundo a técnica única do Aikido . 

É por este motivo que os xintoístas adotaram o símbolo do Mitsu Tomoe que ornamenta as calçadas do bairro da Liberdade e em todos seus templos. Este, também, designa o mais importante na prática do Aikido de O-Sensei, que é o equilíbrio entre corpo e alma. Além disso, no dia a dia do tatame trabalha-se com harmonia e não com oposição, por exemplo: em um ataque do oponente você deve contra-atacar apenas se preservando, com movimentos que seguem o movimento do oponente, sem esforço, utilizando uma reação comum, apenas para conter os ataques que são disparados contra você.

MITSU TOMOE

Infelizmente, ainda existem muitos praticantes pensando que estão treinando Aikido, mas estes estão iludidos. Na verdade estão treinando apenas uma coreografia e visando torná-la mais marcial, começam a dar socos e pontapés no parceiro ou simplesmente bailam !!!!

O Mitsu Tomoe reflete a tripla divisão da cosmologia xintoísta, e diz-se que representa a terra, os céus e a humanidade; e se uniu, especificamente, a Hachiman, Kami da Guerra. Foi também um símbolo usado pelos samurais. Observe com atenção que ele é composto por três “magatama”, que estão gravados no símbolo Taichi Tu.

A mitologia japonesa diz que o Deus Ninigi no Mikoto, neto de Amaterasu, deu a Jimnu um magatama para governar o Japão junto com a espada e o espelho. Isto significa que sem esta terceira opção, mesmo com um julgamento correto sobre si mesmo e sobre os outros, não se pode governar nem a si mesmo nem aos outros.

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OS TRÊS TIPOS DE AIKI – por Mitsugi Saotome SHIHAN.

Mitsugi Saotome SHIHAN.

Guy Hagen Sensei, um estudante de Mitsugi Saotome Sensei e Fundador e Instrutor Principal do Aikido Chuseikan, em Tampa Bay, Florida, contribuiu com o seguinte texto.

Durante a primeira parte da visita de Saotome Sensei ao Japão em 2023, vários de nós estávamos alojados em Tóquio, no distrito de Ueno, entre vários hotéis próximos. De manhã, antes de partirmos para qualquer atividade que tivéssemos planeado para o dia, coordenávamo-nos frequentemente encontrando-nos na estação de metro de Ueno em frente ao Hard Rock Cafe. Era um local central e agradável, onde se podia observar as pessoas, enquanto os turistas e os habitantes locais se movimentavam das saídas para os portões. Ficava a cinco minutos a pé dos hotéis e, mais importante ainda, ficava perto de um Starbucks.

Por volta do segundo dia da nossa viagem, alguns de nós estavam à espera que os outros chegassem. O Sensei segurava a sua bengala e o Jim segurava uma chávena de café enquanto partilhava as direções com o resto do nosso grupo por telefone. Eugene estava a regressar da pastelaria e eu tinha acabado de chegar e estava tendo uma conversa circunstancial. Naquela noite, estava agendada uma visita a um dos primeiros dojos que Sensei fundou e, aproveitei a oportunidade para perguntar ao Sensei o que pensava sobre os dojos e, sobre os alunos, que deixou no Japão para vir para a América. Ele surpreendeu-me ao compartilhar alguns pensamentos sinceros e articulados sobre “aiki” que tinham estado claramente na sua mente e relacionou-os com os seus pensamentos sobre as relações aluno-professor.

“Guy, há três tipos de aiki e este pode ser de boa ou má qualidade”, disse ele. “O primeiro tipo é o aiki do corpo, o físico. Há, também, o aiki da mente (toca no centro da testa) e o aiki do coração. Repito-lhe: “tai, shin, kokoro.” (as palavras japonesas para cada um), e ele acena com a cabeça. Para ser totalmente honesto, a sua afirmação não foi tanto uma confirmação de que eu tinha escolhido as palavras japonesas certas, mas sim que ele estava contente por eu estar a prestar toda a minha atenção.

De seguida, pousou a bengala e agarrou o meu braço com ambas as mãos, lutando grosseiramente com o meu braço para trás e para a frente. “O mau aiki, físico, é apenas força, manipulação. É empurrar. É mau aiki porque não é comunicação. O bom aiki tem comunicação e muda as duas pessoas. Uma pedra que cai pode ser aiki, mas é aiki “mau” porque a pedra não é realmente alterada. A dança, a massagem curativa (ele faz movimentos lentos, intencionais e amassados com as mãos), uma mãe a segurar um bebé, estes são “bons” aiki porque há comunicação, há feedback e ambos são alterados pela interação. O aiki corporal é a mistura de energia física”.

Pensando nestas palavras, considero que talvez o auge do “aiki corporal” no treino marcial possa ser experimentado como uma técnica sem falhas, onde através de um “timing” suave e preciso, o oponente fornece uma resposta corporal, parecendo quase colaborar com a técnica. Por exemplo, seria uma combinação de jiu-jitsu onde todas as reações do uke apenas contribuem para um inevitável bloqueio ou submissão.

Saotome Sensei apontou de seguida para a sua têmpora e depois para os seus olhos e disse: “O segundo aiki é o aiki da mente, o aiki da “intenção”. Antes do ataque, o Nage liga-se ao ser, à energia do atacante. O Nage move-se ou muda. de modo a que a idéia do atacante mude ou este não possa atacar. Se este for um bom aiki, também existe aqui comunicação, perceção, feedback, mas está no interior.  Não o consegues ver se a tua própria intenção, os teus olhos não estiverem abertos e prontos para mudar”.

Sensei não descreveu explicitamente o que seria um mau “aiki mental”, mas com base em outras conversas que tive com ele, sinto que um exemplo pode ser as respostas instintivas de “luta ou fuga”. “Fuga” sendo a rendição sem ter um impacto no atacante, ou “luta” resultando numa competição cega de intenção versus intenção (reflexo de oposição). Na minha experiência de ataque a Saotome Sensei, o melhor “aiki mental” não parecia ser nada – em que eu via o meu corpo continuar teimosamente a atacar depois de o Sensei já se ter movido, ou os meus movimentos entrarem em curto-circuito quando o “timing” perfeito e a presença marcial projetada do Sensei interrompiam completamente a minha decisão de atacar.

“Rapaz, há três tipos de aiki e o aiki pode ser de boa ou má qualidade… O primeiro tipo é o ‘aiki do corpo’, ‘físico’; há também o aiki da ‘mente’…, e o aiki do ‘coração’.” 

Finalmente, o Sensei bateu no seu peito e disse: “O terceiro aiki é o aiki do “coração”, o aiki dos professores e da liderança. Os alunos são atraídos e seguem um professor por causa da sua “essência”, as qualidades que têm no seu interior. O mau aiki do coração exige ou comanda. É o líder que espera ser obedecido sem pensar no valor dos seus seguidores ou o professor que apenas quer adquirir alunos para o seu ego pessoal. Os alunos que são atraídos por este tipo de professor ou líder não serão inspirados, não crescerão. No entanto, eu preocupo-me com os meus alunos. Os meus alunos são os meus verdadeiros amigos para a minha vida inteira”. Neste momento, ele aponta para mim e diz: “Tu, Jim, Eugene, os meus outros deshi (discípulos), os meus primeiros alunos, todos os meus alunos – cada um deles mudou-me, ensinou-me”. Sensei dá palmadinhas no seu coração e diz: “Para  ter sucesso, tenho de mudar o meu ensino para cada um de vós. Tenho de mudar o meu aikido para cada um de vocês. Desta forma, estou sempre a crescer e também aprendo cada vez mais sobre o meu professor”.

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CHIN KON KI SHIN – OS ELEMENTOS SHINTO NO AIKIDO

Chin Kon Ki Shin:

“É uma prática cuja intenção é auxiliar uma pessoa a unir-se com o espírito universal. Ajudá-la a entender sua missão divina, sua meta de vida a ser cumprida.”

– Do glossário The Principles of Aikido por Mitsugi Saotome.

Se define chinkon como “o sossegar e o acalmar do espírito” e Kishin como “o retorno ao divino ou ao kami”. Ambos referem-se à condição em que se atinge um estado contemplativo profundo, de se encontrar ancorado ao universo divino. Chinkon e kishin são geralmente praticados juntos, onde a primeira parte, o chinkon, envolve a revitalização dos sentidos e a unificação do espírito. A segunda parte, o kishin, envolve um estado de alerta meditativo. Diz-se que, juntos, o chinkon e o kishin, formam um método para se atingir a unidade com o divino, embora cada qual tenha sua própria função. Alguns dizem que o chinkon reúne no tanden (centro abdominal) os espíritos ou almas que vagueiam pelo éter, enquanto o kishin ativa esses espíritos.

O chinkonkishin possui raízes muito antigas, com referências em velhos textos Shinto como o Kojiki. A prática xamânica da respiração mística e da meditação para unir os espíritos divinos e humanos, era com freqüência utilizada, nos tempos remotos, na preparação para o misogi na cachoeira. O misogi é uma prática ascética, em que se permanece sob uma cachoeira gelada por longos períodos de meditação com o objetivo de limpar a mente, o corpo e o espírito.

O-Sensei praticava com freqüência esse tipo de misogi (limpeza espiritual), contudo, para ele, era o aikido a sua prática diária de misogi. Foi por essa razão que o fundador elaborou o misogi no seu aquecimento para o treinamento de aikido com a execução de técnicas de chinkonkishin.

Historicamente, a antiga tradição do chinkonkishin , havia caído em desuso na maior parte da tradição Shinto, até que Onisaburo Deguchi resgatou a prática na seita religiosa Shinto, Omoto-kyo, no início dos anos 1900. Quando O-Sensei encontrou Deguchi e abraçou a religião Omoto, também adotou a prática do chinkonkishin tal como ela era ensinada e praticada pelos sacerdotes xamã da seita. Desde sua infância, O-Sensei já se encontrava envolvido com a rica cultura tradicional Shinto e sua mitologia. Omoto-kyo, era uma nova forma da antiga religião e seu carismático líder, Onisaburo Deguchi, exercia um profundo impacto sobre o caminho espiritual de O-Sensei.


O fundador e outro seguidor da Oomoto praticando a meditação Kishin. As mãos unidas em um mudra esotérico ou Kuji-in.

De acordo com Yasuaki Deguchi, neto do líder da Omoto, Onisaburo Deguchi, Onisaburo recebeu os conhecimentos sobre o chinkonkishin através de uma revelação que teve quando realizava práticas ascéticas no Monte Takakuma. Ele também se referia a um método de kishin mencionado na sessão de Kojiki (Registro de Assuntos Ancestrais) a respeito do Imperador Chuai e o Nihon Shoki (Crônicas do Japão) no registro sobre a Imperatriz Jinko. O chinkonkishin foi praticado por muitos anos na Omoto-kyo, que atraía um grande número de novos seguidores que tinham ouvido os relatos sobre os benefícios do chinkonkishin para cultivar e canalizar a energia. Contudo, nos últimos anos a prática do chinkonkishin foi abandonada pela Omoto-kyo devido aos profundos e muitas vezes supreendentes efeitos que tinha sobre seus praticantes. A prática nunca foi abandonada por O-Sensei, e hoje em dojos de toda parte ela encontra-se combinada ao aquecimento do aikido.

Existem várias formas de chinkonkishin que O-Sensei integrou ao aquecimento para o treinamento de aikido. Esses exercícios, apesar de geralmente não serem bem compreendidos (nem mesmo por muitos dos uchidechi de O-Sensei) ainda são praticados em muitos dojos ao redor do mundo. São praticados devido aos óbvios benefícios físicos, como também pela sua importância histórica. Mas geralmente os exercícios são praticados por serem considerados parte integrante e inseparável do aikido. Em geral, os alunos do fundador que mantiveram a prática divergem significativamente tanto nos detalhes como no nível de importância que deram a essa prática e muitos declaram que não a entendem. Um aluno de O-Sensei disse: “Nós as praticamos porque é muito importante. Sensei disse que descobriríamos o significado dessas técnicas por nós mesmos.

Furitama: “balanço da alma”, ou “estabilização do ki”, ou “vibração do espírito”.

O Furitama é praticado de pé com as pernas separadas na largura dos ombros. As mãos ficam posicionadas juntas, com a mão esquerda sobre a direita. Um pequeno espaço é mantido entre as mãos. As mãos são posicionadas em frente ao abdômen e balançadas vigorosamente para cima e para baixo. Inale levantando naturalmente o topo da cabeça. Exale como se direcionasse para a sola dos seus pés enquanto continua balançando suas mãos para cima e para baixo. O exercício termina num silencioso e calmo kishin meditativo.

Esse exercício chinkon tem por fim reunir os espíritos do divino no centro da pessoa, acalmar o espírito e vibrar a alma. É uma forma eficaz para unificar seus pensamentos, centrar sua mente e focar em sua intenção.

Um movimento relacionado que se denominava Otakebi era uma variação da “vibração do espírito“. No Otakebi o praticante levanta suas mãos acima da cabeça, balança as vigorosamente com os dedos esticados e termina lançando as mãos na direção do chão. Na prática original deviam gritar:“eee-aaaay!” enquanto exalavam e lançavam as mãos para baixo. Daí o nome otakebi, que significa grito de guerra ou rugido. Hoje na maioria das vezes a exalação é silenciosa. O fundador quando se referia a esse exercício para soltar os punhos falava em sacudir a poeira das juntas. Para Ueshiba, esse era um movimento revigorante que sacudia as impurezas do corpo, uma forma de misogi para se preparar para a prática do aikido.

Torifune: “remar o barco” ou “vôo do pássaro”.

Torifune, também conhecido no aikido como kogi-fune ou funakogi é mais conhecido como Exercício do Remo. Envolve o movimento dos braços e do corpo como se estivesse a remar um barco. De acordo com um importante texto do Shintoísmo cujo título é Kami no Michi, os punhos ficam cerrados com os polegares por dentro e o movimento das mãos é bastante linear. Fotos de O-Sensei mostram as mãos dele cerradas de forma tradicional, com os polegares para fora. Nas filmagens de antigos vídeos ele pode ser visto praticando o torifune com movimentos de remar tanto de forma linear como em varredura. Contudo, hoje, o torifune que aparece como o mais praticado é executado com as mãos abertas, os dedos apontando para baixo, os punhos impulsionados para frente e em seguida recuados para os quadris.

Deve se ficar bem apoiado no chão quando praticar o torifune. O objetivo é movimentar-se a partir dos quadris, deslocando o peso do corpo, do pé dianteiro para o pé traseiro e novamente para o dianteiro. As mãos atuam como se fossem cordas ou hastes conduzidas pelo movimento dos quadris.

Ao praticar, primeiro posiciona-se o pé esquerdo na frente. Enquanto as mãos ou punhos são lançados para frente você vocaliza o som “eh“. Ao recuar as mãos para trás você vocaliza “ho“. Esse empurra e puxa é executado ritmadamente em torno de 20 vezes. Em seguida, o pé direito é colocado a frente e agora enquanto se impulsiona para frente você vocaliza “ee” e enquanto recua você vocaliza “sa“. Em algumas escolas, novamente uma 3ª série é executada sobre o pé esquerdo. O “eh” é entoado tanto ao empurrar como ao puxar. Essas vocalizações têm suas raízes no Kotodama, uma prática mística antiga que combina o espírito e o som e que se repopularizou com a Omoto-kyo.

Ibuki Kokyu: “respiração profunda”.

Ten-no-kokyu: Respiração do céu”.

A respiração do céu consiste em uma profunda inalação, as duas mãos ficam juntas a nossa frente e são levantadas na postura ten-no-kokyu (respiração do céu), mãos unidas e sobre a cabeça. Depois prosseguimos com a respiração da terra

Chi-no-kokyu: Respiração da terra”
A respiração da terra consiste em uma lenta exalação trazendo as mãos para baixo na postura chi-no-kokyu (respiração da terra). As mãos abaixam para as laterais do nosso corpo como se empurrassem para baixo o universo até retornarem juntas para frente de nosso abdômen para completar o ciclo.

Geralmente, o ciclo ten-no-kokyu e chi-no-kokyu é repetido 3 vezes sucessivamente. Quando somente esse exercício é praticado, usualmente há uma quieta pausa de kishin ao final do ciclo da respiração. Quando combinado com os outros exercícios as transições mudam e o kishin pode passar para o final das combinações.

Furitama, torifune, e ibuki são frequentemente praticados juntos em várias combinações. Algumas vezes o furitama é intercalado com o ibuki. Outras vezes o furitama é intercalado com o torifune. Essas práticas variam bastante de uma associação de aikido a outra assim como de um dojo a outro dentro de uma mesma associação.

Raramente a origem e os motivos dessas técnicas são ensinadas ou discutidas num dojo, devido a isso, os alunos muitas vezes ficam a se perguntar o que estão a fazer ou como conduzir corretamente os movimentos que seguem fazendo. O entendimento básico da fonte e da história desses misteriosos movimentos ajuda a formar uma base, com a qual nossa própria prática pode ser desenvolvida e enriquecida. Que sua prática seja bem embasada e frutífera.

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A ORIGEM DO TAI CHI CHUAN

Muitos pensam que o tai chi chuan (taijiquan) foi desenvolvido por monges taoistas. Esses monges tinham como objetivos principais a busca da tranquilidade da mente e da ação em harmonia com a natureza. 

A tradição oral atribui ao monge taoista Zhang San-Feng (1127-1279) a criação do taijiquan. Zhang San-Feng, que vivia no monte Wudang, ao observar a luta entre uma garça e uma serpente, inspirou-se nos gestos suaves, curvilíneos e harmoniosos dos combatentes, para formar a base dos movimentos do taijiquan.

A documentação escrita só apareceu no fim do século XIX e atesta que a escola da família Chen (século XVII) foi, se não a criadora, pelo menos a que deu ao taijiquan a forma como modernamente ele se tornou conhecido.

Os historiadores franceses Thomas Dufresne e Jacques Nguyên, apoiados entre outros na pesquisa de campo do famoso historiador chinês Tang Hao (1897-1959), propõem a hipótese de que o estilo criado por Chen Wangting descende dos estilos marciais dos Generais Yu Dayou (1503-1579) e Qi Jiguang (1528-1588).

No séc. XVI o General Qi Jiguang foi enviado para salvar a situação numa batalha contra os Wo kou (piratas japoneses), onde haviam fracassado muitos outros, inclusive monges Shaolin. O General Qi Jiguang obteve sucesso na batalha e seu estilo marcial ganhou grande prestígio. Qi Jiguang é autor do Jixiao Xinshu, um tratado que contém 32 técnicas ilustradas e a síntese de 16 estilos marciais do fim da dinastia Ming.

General Qi Jiguang

Os tratados marciais de Qi Jiguang e Yu Dayou têm diversas técnicas em comum, e acredita-se que Yu Dayou ensinou seu estilo de bastão à Qi Jiguang. É provável que praticassem estilos marciais parecidos, ao menos.

Vejam, das 32 técnicas descritas por Qi Jiguang, o nome de 29 está presente dentre as técnicas antigas do taijiquan (tai chi chuan). Vale ressaltar que embora hoje o acesso aos nomes e descrições das técnicas seja aberto, naquela época era preciso conhecer o estilo a fundo para ter acesso a estes.

No entanto a arte marcial criada por Chen Wangting, o Taijiquan (tai chi chuan), é original em vários aspectos que não se encontram em nenhum dos seus antecessores, e que dão testemunho da genialidade de Chen Wangting. Este fundou um estilo único, que foi sendo aprimorado pelas sucessivas gerações de seus descendentes, os quais se dedicaram integralmente à arte sendo treinados para tal desde poucos anos de idade, ainda na infância.

Chen Wangting

Chen Wangting, responsável pela criação, desenvolvimento e transmissão do taijiquan, nasceu no fim da Dinastia Ming. Serviu à corte imperial como militar a partir de 1618, nas províncias de Shandong, Zheli e Liaodong. Após a queda da Dinastia Ming, em 1644, Cheng Wan-ting, já idoso, retirou-se para Chenjiagou, distrito de Wen, província de Henam, ao norte do Rio Amarelo. Aí teria criado o taijiquan.

Um descendente de Wangting, chamado Chen Chang-Xing (1771-1853) desempenhou um papel importante na tradição do taijiquan porque teve muitos discípulos e porque foi a partir dele que a arte se expandiu além da família Chen.

Se a família Chen foi a criadora, a família Yang foi a principal propagadora do taijiquan, graças a Yang Lu-Chan, discípulo de Chen Chang-Xing. Yang Lu-Chan (1789-1872), nasceu no distrito de Yangnian, na província de Hebei. Após a morte de seu pai, viu-se obrigado a ingressar nas milícias da aldeia para sobreviver.

A conselho de seu primeiro mestre, Yang Lu-Chan dirigiu-se à cidade de Chen Jia-Gou para aprender o tai chi chuan na família de Chen Chang-Xing. Após trabalhar vários anos como serviçal da casa, finalmente conseguiu que Chen Chang-Xing lhe ensinasse a arte. Quando voltou para sua aldeia em Hebei, começou a ensinar.

Mais tarde, Yang Lu-Chan mudou-se para Beijing (Pequim), onde fundou uma escola. Ensinou no exército dos Manchus e consagrou-se como mestre de taijiquan, juntamente com seus três filhos: Yang Ban-Hou, que se especializou no estilo pequeno, de movimentos curtos; Yang Feng-Hou, que desenvolveu o estilo grande, de movimentos longos; e Yang Jian-Hou, que aprimorou o estilo médio.

Yang Cheng-Fu (1883-1936), filho de Yang Jian-Hou, foi o propagador do taijiquan em toda a China. O grande mestre percorreu a China de norte a sul divulgando esta prática não apenas como uma arte marcial, mas também como uma terapia para manter a saúde. Esta forma suave e ritmada, enfatizada por Cheng Fu, e as muitas ramificações que se originaram de seu estilo, tornaram-se desde então o padrão do estilo Yang, conquistando a imaginação do público como uma referência no que diz respeito ao Tai Chi Chuan em geral.

Os descendentes diretos de Yang Cheng Fu são os muitos alunos que ensinou e os estudantes destes disseminaram esta arte por todo o mundo.

Seus filhos continuaram a ensinar a forma de Tai Chi Chuan de 103 movimentos divulgada por seu pai. O primeiro filho, Yang Shouchung (1910-1985) (ou Yang Zhenming, ou Yang Shaozhong, ou Yeung Shaochung), levou o estilo da família para Hong Kong. O segundo filho, Yang Zhenji (nascido em 1921), é o atual líder da família. Yang Zhenduo ( nascido em 1926), o terceiro filho, vive na Província de Shanxi e é considerado o mais destacado instrutor de Tai Chi Chuan estilo Yang vivo.

Entre os mais famosos discípulos de Yang Cheng Fu estão Chen Weiming (Ch’en Wei-ming), Dong Yingjie (Tung Ying-chieh), Fu Zhongwen (Fu Chung-wen) e Cheng Man Ching (Cheng Man Ching). Cada um deles desenvolveu um trabalho de ensino intensivo, fundando grupos que continuam a transmitir seus ensinamentos até hoje.

Cheng Man Ching é reconhecido como o primeiro a ensinar Tai Chi Chuan no Ocidente, após o falecimento de seu mestre encurtou e simplificou significativamente a forma Yang tradicional (modificação infelizmente não reconhecida pela família Yang), supostamente para torná-la mais acessível para um número maior de alunos.

Liu Pai Lin, também discípulo de Yang Cheng Fu, foi um dos grandes divulgadores desta arte no Brasil, contribuindo entre os anos de 1980 e 2000 para torná-la conhecida por todo o país. Temos também o Grão Mestre Chiu Ping Lok que aprendeu a forma Yang Curto com o Mestre Cheng Man Ching e fez algumas adaptações que foram padronizadas (sem perda da essência) em sua Escola Fei Hok Phai e por muito tempo vem sendo difundida na famosa Academia Tai Chi em Santo André (primeira academia de Kung Fu registrada no Brasil). 

Em 1999, os Mestres Yang Zhenduo e Yang Jun realizaram seu primeiro Seminário de Tai Chi Chuan no Brasil. Criaram em seguida um núcleo de representação da Associação Internacional de Tai Chi Chuan estilo Yang, o “Yang Chengfu Tai Chi Chuan Center – Brasil”, que realiza cursos de formação e exames de qualificação de instrutor.

Referência bibiliográfica:

– Livro: Tai Chi Chuan Arte Marcial Técnica da Longa Vida de Catherine Despeux, Editora Pensamento.

– Artigo: A Origem Histórica do Taijiquan – Chen Taijiquan Rio de Janeiro – taijiquan.pro.br/estilo-chen/origem-historica

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Um comentário em “ARTIGOS & ENTREVISTAS”

  1. Parabéns Diego Sensei, maravilhosa seleção de artigos, mostra que sabe bem o que é Aikido e por isto está crescendo a cada dia mais na Senda do TAKEMUSSU AIKI, cuja estratégia, era usada pelo antigos guerreiros nobres do Japão medieval , usando a arte marcial não para destruir e matar, mas para “Dar Vida” e tazer a paz, certamente seu dojo é um verdadeiro lugar para se treinar o Aikido do Fundador em Brasilia e região.

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